Criticada pela área médica e pelo próprio ministro da Saúde, Ricardo Barros, que disse ao Estado que “a Anvisa precisa diminuir a burocracia para tudo”, o presidente da instituição, Jarbas Barbosa, garante que a agência está alinhada com o que há de mais avançado no mundo.
À frente da Anvisa desde 2015, ele reconhece que a instituição precisa ser mais eficiente e teme um estrangulamento por falta de profissionais nos próximos anos. Nesta entrevista, Barbosa fala sobre o consumo excessivo de remédios, a divisão nebulosa da fiscalização e os desafios.
A área médica reclama que a Anvisa é muito burocrática para validar remédios importantes. Por que tanta demora?
As pessoas confundem o papel da Anvisa com o do Ministério da Saúde. O que fazemos é analisar a qualidade da fabricação, verificar se os testes exigidos para comprovar segurança e eficácia foram realizados. Isso não é um procedimento burocrático, não é carimbar papel. A Anvisa decide se um medicamento pode ser utilizado e o ministério, se vai incorporar ao SUS. A Anvisa também não escolhe o que será licenciado, é o produtor quem pede o registro. Quando sai uma inovação radical, a maioria registra primeiro nos Estados Unidos.
Qual sua avaliação da legislação do setor farmacêutico?
O ambiente legal do Brasil hoje é alinhado com o que temos de mais avançado no mundo. Isso propiciou um desenvolvimento importante da própria Anvisa, que é considerada pelos seus pares como uma das grandes agências do mundo, com padrão de qualidade semelhante ao das demais.
Como ficou a situação financeira da Anvisa com a crise?
Temos um orçamento enxuto de R$ 800 milhões, mas não tivemos restrição orçamentária. A Anvisa é praticamente autossuficiente. Nossa maior necessidade é continuar o processo de recomposição da força de trabalho. É uma instituição nova, de 16 anos, e uma parcela do nosso quadro foi herdada do Ministério da Saúde. Grande parte dessas pessoas – 450 servidores de um total de 2.800 – pode se aposentar nos próximos dois anos. Chega um determinado ponto em que esbarramos na nossa capacidade física. Podemos ter problemas de um certo estrangulamento e aumento de tempo em filas pela insuficiência de recursos humanos.
O que falta para avançar?
Para começar, a busca de maior eficiência, que tem de ser um mantra permanente. A constante revisão dos processos, no sentido de ter mais agilidade, sem perder a garantia de qualidade e segurança. Outra questão importante é definir melhor os papéis dentro do sistema nacional de vigilância sanitária, estabelecendo o que o município, o Estado e a Anvisa fazem. Em alguns setores, essas responsabilidades estão em uma área cinzenta que cria imprevisibilidade e pode não nos colocar em uma situação melhor em relação ao cenário internacional.
Cada brasileiro toma, em média, duas doses de remédio por dia. Estamos consumindo muito?
Isso acontece no mundo todo. Temos o fenômeno da transição demográfica. Anualmente, 1 milhão de pessoas ultrapassa a barreira dos 60 anos, aumentando a ocorrência de doenças crônicas e o uso de remédios. Por outro lado, há uma oferta muito maior, não só de medicamentos, mas de vitaminas e suplementos.
Deve ter pessoas consumindo acima disso e outras com muita dificuldade de obter os remédios. Dados mostram que no Brasil e na América Latina os medicamentos que mitigam a dor severa têm consumo per capita muito menor que o padrão mundial. E há remédios importantes para controle de diabetes, hipertensão e algumas infecções em que há dificuldade de acesso, em especial para a população mais pobre.