Assim que descobriram o Truvada, Bruno, Felipe e Antônio* se entusiasmaram com a possibilidade de se prevenir contra o HIV tomando um comprimido por dia. Fabricado nos EUA, o remédio evita que a pessoa se infecte caso seja exposta ao vírus. A questão é que, no Brasil, o medicamento ainda não é reconhecido como prevenção, apenas como tratamento.
Mesmo assim, há quem não poupe esforços para consegui-lo, como o administrador público Antônio* que, junto com o marido, já chegou a gastar R$ 1,2 mil por mês para comprar o Truvada em uma farmácia de importação. Ou o empresário Bruno, que deu um ‘jeitinho’ de conseguir a droga sem pagar nada. Enquanto isso, Felipe aguarda com ansiedade a chegada oficial do remédio ao SUS, anunciada pelo Ministério da Saúde para o primeiro semestre de 2017.
O Truvada é um comprimido que combina dois antirretrovirais (tenofovir e emtricitabine) que, no Brasil, já são tomados por quem recebe a profilaxia pós-exposição (PEP) para não ser contaminado, após se expor ao HIV. Além desse grupo, há ainda os participantes do PrEP Brasil, programa conduzido pela Universidade de São Paulo (USP) e pela Fiocruz que desde 2014 avalia o comportamento do brasileiro com a profilaxia pré-exposição (PrEP), quando o Truvada é administrado como prevenção.
A participação de Bruno Chagas, de 29 anos, no PrEP foi concluída em novembro. Para continuar o tratamento preventivo, ele conseguiu a receita de dois antirretrovirais semelhantes aos do Truvada com um médico particular. Mas garantir o medicamento no sistema público não foi uma tarefa simples. “Tive de insistir bastante”, conta. “Dei um depoimento contando que já participei da PrEP e acabaram liberando.” Chagas diz que só pratica sexo seguro, hábito adquirido durante o PreP Brasil, mas se sente mais tranquilo com o Truvada.
De acordo com o coordenador do programa, o infectologista Rico Vasconcelos, não é necessário tomar a PrEP quando o paciente não tem comportamento de risco. “O Truvada é uma estratégia de redução de danos, ou seja, é indicado para pessoas que têm comportamentos de risco”, explica o médico, que costuma recomendar terapia aos pacientes que o procuram querendo tomar o remédio pelo simples medo de contrair o HIV. “O Truvada é como distribuir seringas descartáveis para quem usa drogas injetáveis. Você não vai fazer com que a pessoa deixe de se expor ao risco, mas vai prevenir o pior”, diz Vasconcelos.
Rede Pública
Desde 2012, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda o Truvada como política pública de prevenção ao HIV para homens que fazem sexo com homens, profissionais do sexo e mulheres transsexuais. No entanto, isso ainda não ocorre no Brasil porque, na Anvisa, o medicamento é reconhecido como tratamento - e não como prevenção.
A alteração do registro do remédio está pendente no órgão regulador, que tem até 7 de janeiro de 2017 para se manifestar. O presidente da agência, Jarbas Barbosa, negou que haja atraso na aprovação do pedido. “Está em análise, que está sendo concluída.”
No último Dia Mundial de Luta contra a aids, em 1º de dezembro, o Ministério da Saúde declarou que vai implementar o uso de antirretrovirais no primeiro semestre do ano, deixando a droga disponível para 100 mil pacientes. Atualmente, 827 mil pessoas vivem com HIV e outros 112 mil convivem com o vírus, mas não sabem o diagnóstico. Apenas 260 mil realizam tratamento.
O social media Felipe Casas, de 30, espera a liberação para usar o Truvada, algo que quis desde que descobriu a existência da pílula. Casas, no entanto, foi recusado no PreP Brasil, por não ter comportamento de risco. “Se existe outra forma de prevenção, sem contra-indicações, por quê não?”, indaga.
COMO AGE O TRUVADA
Um comprimido por dia é o suficiente para barrar a infecção pelo HIV