Rodrigo Oliveira, chef do Mocotó, e Alex Gomes, do Morro Paulicéia, começaram o périplo pelo sertão em tom épico. Um vídeo em que imagens de recantos brasileiros rodavam ao som de um poema de Elcio Fonseca, publicitário e sogro de Rodrigo, entrelaçou sertanejo e caipira - as duas faces da cultura do interior. Uma cultura rica e por vezes escondida por trás da estridência dos neurastênicos do litoral, mas que é a expressão de um homem que é, antes de tudo, um forte.
Euclides da Cunha, Guimarães Rosa: são vários os prosadores que traduziram essa história em palavras. Rodrigo Oliveira, ajudado por Alex Gomes, se inscreve nessa tradição, mas suas histórias são contadas em pratos.
Primeiro, da lavra de Alex, saiu um feijão guandu cozido com linguiça artesanal. Que, por suposto, carregavam histórias: o feijão guandu é produzido no Vale do Paraíba por Patrick, que assumiu o microfone para contar que a espécie, trazida ao Brasil pelas mãos dos escravos, está nas hortas de qualquer família do interior. A linguiça é produzida em Bragança Paulista por Patrícia, que também tomou a palavra para falar de como sua cidade deve a história ao produto, desde o tempo em que Fernão Dias, no rumo das bandeiras, pousava em Bragança e aprovisionava suas tropas com um alimento que resistisse às intempéries - a linguiça.
Depois, pelas mãos de Rodrigo, um feijão de corda do Alagoas, com manteiga de garrafa, jirimum, chuchu e quiabo contou a história do próprio Rodrigo, filho de pais criados no sertão nordestino, onde "o valor das coisas está mais ligado à qualidade que ao custo. O custo é igual para tudo: o suor do rosto." O toque de invenção, que traduz a geração do chef que triunfou na cidade, coube ao mastruz seco salpicado por cima - uma erva medicinal tradicional do sertão, que Rodrigo transmutou em ingrediente aromático.
Ana Rita Suassuna, a decana estudiosa da comida sertaneja, então contou histórias do mastruz, ou mantruz, em pratos de outros tempos, lá do fundo da plateia, comprovando que, de fato, o sertão está em toda parte.
Teve espaço ainda para uma galinha desfiada com miniarroz, feita por Alex, e uma "nhoca", nhoque de mandioca criado por Rodrigo.
Ao fim, era nítida a cara e a voz dos produtos e produtores brasileiros, sertanejos, caipiras. E sua relevância provava-se indiscutível. Pois como provocou Alex: "Um sertanejo vai precisar de um advogado, um médico, uma vez na vida. Agora, quantas vezes essas pessoas vão precisar do sertanejo? Todo dia, o dia todo: no café da manhã, no almoço e no jantar."