Por Guilherme Simão, Ítalo Rômany, Jéssica Alves, Luiza Facchina e Rafael Aloi
Se você está lendo este texto, já deve ter sucumbido à tentação do cartão de crédito em algum momento. Você compra uma coisa aqui, faz uma parcelinha ali, financia uma passagem aérea, paga o ingresso e a pipoca do cinema, tudo sem ter a sensação do dinheiro saindo do bolso.
Sair do shopping com várias sacolas já não é a realidade do brasileiro Foto: Tiago Queiroz / Estadão
E foram muitos os que caíram nessa armadilha. Até porque o número de cartões cresceu 18% nos anos de bonança econômica. Eram 136,9 milhões em 2008. No fim de 2014, já somavam 162 milhões, segundo o Banco Central. Os gastos saltaram nada menos que 169% no mesmo período.
Mas o cartão de crédito também é a salvação na hora de comprar um bem mais caro e, muitas vezes, imprescindível, como um eletrodoméstico, um móvel ou aquele computador para estudar. O desafio é usá-lo de forma controlada. Atrasos no pagamento da fatura são punidos com as taxas de juros mais elevadas do mercado.
Pagar o valor mínimo, o conhecido rotativo, é outro tiro no pé: dados do BC mostram que os juros da modalidade chegaram a 372% ao ano em junho. Mesmo assim, esse tipo de crédito cresceu bastante. Foi de R$ 20 bilhões para R$ 26 bilhões entre junho de 2011 e junho de 2015, com um pico de R$ 29 bilhões em janeiro deste ano.
Tudo isso se traduz em maior inadimplência. Em junho de 2015, 7,7% dos gastos com cartões não foram pagos, a maior taxa desde fevereiro de 2013. Essa escalada vem chamando atenção. No último mês, o governo editou uma medida provisória ampliando o limite do crédito consignado (descontado na folha de pagamento do trabalhador, aposentado ou pensionista) de 30% para 35% da renda do tomador, destinando o aumento no limite para pagar dívidas com cartão. A medida divide economistas. Há quem tema um estímulo adicional ao consumo, aumentando o endividamento. Mas outros avaliam que o uso do consignado pode ajudar quem sofre com o rotativo.
Com os juros em alta e o emprego em queda, a nova realidade para consumidores e lojistas é de compras seletivas e parcelamentos mais escassos. Uma televisão nova é uma compra que pode ser adiada para priorizar despesas com alimentação e medicamentos.
Essa mudança teve um impacto forte nos segmentos do varejo mais dependentes de crédito e de produtos de maior valor agregado, como geladeiras, lavadoras e TVs. A queda nas vendas desse segmento de móveis e eletrodomésticos foi de 6,1% nos últimos 12 meses até maio. Nem mesmo a data mais animadora para a venda de bens de consumo ajudou: maio, geralmente impulsionado pelo Dia das Mães, teve o pior desempenho desde 2001, segundo dados do IBGE.
Saiba como renegociar a dívida do cartão de crédito
Perdeu o controle dos gastos no cartão de crédito? As altas taxas de juros fizeram você entrar numa bola de neve de dívidas? A saída é levantar a bandeira branca e tentar uma negociação. Nem sempre é um processo fácil, mas costuma ser bom para os dois lados: você limpa seu nome e a operadora do cartão tem mais chance de receber.
A planejadora financeira e professora da FGV-Rio Myrian Lund explica que a dívida com cartão de crédito é uma das piores que o consumidor pode fazer. “São taxas muito altas e a pessoa tem de se livrar logo delas, mas será preciso sair da zona de conforto.” O professor de gestão de risco e finanças da FEA-USP, Luiz Jurandir Simões, concorda que esse não é um processo indolor. “Haverá sofrimento, muito aperto, mas é necessário.”
Confira as dicas dos especialistas para zerar as dívidas com cartão:
É preciso voltar a ter domínio sobre as finanças. Para isso, cancele o cartão de crédito e o cheque especial, e não faça mais empréstimos. Se for possível, trabalhe apenas com dinheiro. Quer usar cartão? Use o de débito.
A velha e boa planilha de gastos ainda é a melhor forma de identificar despesas desnecessárias e fazer caixa para quitar dívidas. Não é essencial? Elimine. Renegocie tarifas e planos com prestadoras de TV a cabo, internet e telefone. Isso sempre traz alívio às finanças mensais.
A melhor opção é substituir a dívida do cartão de crédito por outra com juros menores. Tente empréstimo com parentes ou fique de olho nos feirões do Serasa, que também tem um portal de apoio à renegociação.
Com taxas de juros bem menores e desconto direto no salário, o consignado é uma boa alternativa. O governo aumentou o limite para esse tipo de crédito de 30% para 35% da renda de uma pessoa, desde que o valor seja usado para pagar pendências com o cartão de crédito. Se o seu orçamento não estiver comprometido com outros consignados, pode ser uma solução.
Pesquise as condições oferecidas em cada banco e veja se vale a pena levar sua dívida para outra instituição. Se você também fizer a portabilidade de salário, o novo banco pode dar desconto adicional na renegociação. Na hora da conversa, seja sincero: o banco só pode ajudar se souber sua real situação.
Na hora de renegociar, pense qual é o valor máximo que cabe no seu bolso por mês. E tente se comprometer com o menor número de prestações possível, reduzindo a carga de juros. Uma boa alternativa é escolher o Sistema de Amortização Constante (SAC), em que o valor das parcelas diminui com o tempo.
Antecipar o décimo terceiro no banco é tentador, mas nem sempre é uma boa ideia. Os juros geralmente não valem a pena e ainda há incidência do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Além disso, nem sempre se consegue antecipar 100% do salário. Se o valor pode ser insuficiente para quitar sua dívida, a melhor opção é esperar pelo décimo terceiro integral.
Fonte: Myrian Lund (FGV-Rio) e Luiz Jurandir Simões (FEA-USP)
Como comprar um equipamento de informática usado
Nem sempre dá para adiar a compra de um equipamento de informática para trabalhar ou estudar. Uma alternativa para driblar a crise é a compra de usados pela internet. Essa prática vem crescendo e é vista como uma tendência. Porém, comprar pela rede exige cuidado, principalmente quando se trata de um produto cobiçado e com alto valor agregado.
O fundador do Ziggo, site de compra e venda de eletrônicos usados, Guilherme Macedo, conta que apesar do crescimento desse mercado, ele ainda é tido como informal. “Já teve caso de tentarem vender equipamento roubado, então sabemos que ainda é um pouco marginalizado”, reconhece. De acordo com Bruno Fuschi, responsável pelo site Brused, de venda, compra e troca de produtos da Apple, é importante tomar cuidado com a venda de aparelhos bloqueados. “É preciso checar no momento da compra se existe algum bloqueio ou outros mecanismos. Se deixar para depois, o comprador pode ser vítima de um golpe”, explica.
O presidente da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico, Maurício Salvador, lembra que é preciso verificar a reputação do vendedor nas redes sociais e em sites de busca. “Uma coisa é vender produtos seminovos, outra coisa é vender produtos quebrados. No segundo caso, haverá muitas reclamações de consumidores.”
Algumas dicas pra você que vai sair em busca do seu computador usado na internet:
1Checar a procedência e reputação do produto. Além de confirmar se o vendedor é confiável, é importante avaliar se o modelo e a marca do produto têm muitas reclamações e se atenderão às necessidades para não se arrepender depois. Muitos sites oferecem um sistema de avaliação dos vendedores, baseado na experiência de negociações anteriores, é sempre bom checar esses dados.
2Comparar o preço com modelos novos. É importante pesquisar se o preço do produto usado não está próximo do novo, com funções mais modernas, pois a diferença pode ser pequena em alguns casos.
3Desconfie de preços milagrosos Apesar de tentadores, preços muito baixos podem sair ainda mais caros, pois podem ter problemas técnicos ou se tratar de um golpe. É sempre bom ficar atento com um produto cujo preço de um seminovo é exageradamente mais barato que o preço do novo. Nesse caso, é bom novamente conferir a reputação do vendedor.
4Dê preferência a quem oferece garantias Escolha formas de pagamento que não tenham risco, e peça garantias. Há lojas que cobram um pequeno valor adicional pela garantia, mas pode ser mais seguro.
Fonte: Associação Brasileira de Comércio Eletrônico
Você sabe qual é a taxa de juro do crédito rotativo? Quer aprender a equilibrar o salário e os gastos com o cartão? Esta é sua chance de aprender. A economista Denise Hills, responsável pela Educação Financeira do Banco Itaú, esclarece as principais dúvidas dos consumidores sobre o uso do cartão de crédito. O MC Bó do Catarina, representante do funk ostentação, comenta as mudanças do gênero que cresceu com a festa do consumo e agora sofre com a crise econômica. "O sonho agora é pagar as contas", diz o funqueiro.
Dados
Inadimplência total no cartão de crédito, em %Fonte: Banco Central
Dados
Taxa de juros do cartão de crédito no rotativo (pessoa física), em %Fonte: Banco Central