1982
Se as derrotas para Uruguai no jogo decisivo da Copa de 1950 e para a Alemanha nas semifinais de 2014, em torneios realizados no País, provocaram traumas eternos para a seleção, o Mundial de 1982 também deixou um legado de dor ao torcedor do Brasil. Em Barcelona, a até então invicta e encantadora equipe dirigida por Telê Santana perdeu por 3 a 2 para a Itália, em partida que ficou conhecida como “Tragédia do Sarriá”. E o confronto que culminou na classificação dos italianos às semifinais da Copa os embalou para a conquista do terceiro título mundial na Espanha, país-sede do torneio e que ainda estava em período de redemocratização após a ditadura do general Francisco Franco.
Em 5 de julho de 1982, o futebol-arte que a seleção brasileira vinha exibindo até então não foi suficiente para barrar a Itália – um empate levaria a equipe nacional a passar de fase. Mas a eficiência e a organização tática dos rivais e, principalmente, o oportunismo de Paolo Rossi, autor dos três gols da sua seleção naquela tarde, acabaram com o sonho do tetracampeonato do Brasil, que chegou ao torneio na Espanha com a sua melhor equipe desde o tri em 1970 no México.
Para acalentar essa expectativa, o Brasil contava com um meio-campo considerado o melhor do mundo, formado por Toninho Cerezo, Falcão, Sócrates e Zico, e outros craques do futebol nacional, como Júnior e Éder Aleixo. E com o talento deles e um futebol vistoso, o Brasil venceu seus três jogos na fase de grupos, contra União Soviética (2 a 1), Escócia (4 a 1) e Nova Zelândia (4 a 0).
Na fase de quartas de final, o Brasil venceu a Argentina (3 a 1) com mais uma grande atuação. A Itália, que havia se arrastado na sua chave para avançar – foram três empates, contra Polônia, Peru e Camarões -, também havia passado pelos argentinos (2 a 1) dias antes do confronto sul-americano. E os italianos se deram melhor diante do Brasil, impondo uma das derrotas mais dolorosas da história da seleção, após Sócrates e Falcão empatarem duas vezes o placar, com belos gols.
Embalada pela vitória sobre o favorito Brasil, a Itália encarou nas semifinais e venceu a Polônia por 2 a 0, com mais dois gols marcados por Rossi, que até o duelo com a equipe de Telê não havia feito nenhum na Espanha. Na grande decisão, apitada pelo brasileiro Arnaldo Cézar Coelho, o título foi conquistado no clássico entre dois gigantes europeus que eram bicampeões.
Após Cabrini desperdiçar pênalti na etapa inicial, o título italiano foi garantido no segundo tempo do duelo disputado no Santiago Bernabéu, em Madri. Rossi, Tardelli e Altobelli abriram 3 a 0. O gol de Breitner para a Alemanha, que havia eliminado nas semifinais outra favorita, a França de Platini, não impediu o tricampeonato italiano, se igualando ao Brasil como únicas equipes com três títulos mundiais até então.
Além de ter ficado marcada pela conquista da Itália e pela derrota do futebol-arte brasileiro, a Copa de 1982 também registrou uma expansão do evento organizado pela Fifa, que passou das 16 seleções participantes para 24, que foram divididas em seis grupos de quatro, com os dois primeiros avançando de fase. E houve uma “marmelada” no duelo em que a Alemanha Ocidental venceu a Áustria por 1 a 0 – ambos passaram de fase e a Argélia acabou sendo eliminada no saldo de gols.
CAMPANHA DO CAMPEÃO
Primeira fase – Grupo A
14/06 – Itália 0 x 0 Polônia
18/06 – Itália 1 x 1 Peru
23/06 – Itália 1 x 1 Camarões
Quartas de final – Grupo 3
29/06 – Itália 2 x 1 Argentina
05/07 – Brasil 2 x 3 Itália
Semifinal
08/07 – Itália 2 x 0 Polônia
Final
11/07 – Itália 3 x 1 Alemanha Ocidental
NÚMEROS DA COPA
Jogos – 52
Gols – 146
Cartões vermelhos – 5
Público – 2.109.723 espectadores (média de 40.572 por jogo)
Cidades-sede – 14
Estádios – 17
FICHA DA FINAL
ITÁLIA 3 x 1 ALEMANHA OCIDENTAL
ITÁLIA – Zoff; Collovati, Gentile, Scirea e Cabrini; Bergomi, Oriali e Tardelli; Conti, Graziani (Altobeli, depois Causio) e Paolo Rossi. Técnico: Enzo Bearzot.
ALEMANHA OCIDENTAL – Schumacher; Briegel, Kaltz, Karl Forster e Bernd Forster; Stielike, Dremmler (Hrubesch) e Breitner; Littbarski, Fischer e Rummenigge (Hansi Müller). Técnico: Jupp Derwall.
GOLS – Paolo Rossi, aos 12, Tardelli, aos 24, Altobelli, aos 36, e Breitner, aos 38 minutos do segundo tempo.
ÁRBITRO – Arnaldo Cézar Coelho (Brasil).
CARTÕES AMARELOS – Conti e Oriali (Itália); Dremmler, Stielike e Littbarski (Alemanha Ocidental).
PÚBLICO – 90 mil espectadores.
LOCAL – Estádio Santiago Bernabéu, em Madri (Espanha).
DESTAQUE
05/07 – Brasil 2 x 3 Itália – Paolo Rossi
Até então apagados na Copa, a seleção italiana e Paolo Rossi fizeram história em um dos jogos mais emblemáticos de todos os tempos. Diante do favoritismo brasileiro, que vinha embalado por quatro vitórias exibindo futebol vistoso e só precisava empatar para avançar às semifinais, a Itália fez a pressão mudar de lado ao abrir o placar logo aos quatro minutos, com um gol do atacante da Juventus, o seu primeiro no torneio na Espanha.
O primeiro gol e os outros dois de Rossi, aos 25 minutos do primeiro tempo e aos 29 da etapa final, foram construídos pela eficiência italiana para aproveitar as falhas do sistema defensivo brasileiro, tanto que a equipe finalizou três vezes a menos do que a seleção de Telê Santana – 27 a 9.
O Brasil ainda teve dificuldades com a defesa italiana, com Zico sendo duramente marcado por Gentile. Ainda assim, a equipe conseguiu arrancar o empate duas vezes, com Sócrates, aos 12 minutos do primeiro tempo, concluindo linda jogada do craque do Flamengo, e Falcão, aos 27 da etapa final. Mas a terceira igualdade parou nas mãos de Zoff, que fez grande defesa após cabeceio de Oscar nos minutos finais do duelo.
A vitória italiana estava sacramentada e com o impulso para Rossi, que ficou livre de suspensão por envolvimento em um escândalo de manipulação de resultados faltando pouco tempo para a Copa, se tornar o herói improvável do terceiro título mundial da sua seleção, com mais dois gols marcados nas semifinais e outro na decisão.
GRANDES JOGOS
25/06 – Alemanha Ocidental 1 x 0 Áustria
Um jogo que entrou para a história das Copas negativamente e que durou, de fato, apenas dez minutos. Foi o tempo necessário para os alemães marcarem o seu único gol, com Hrubesch. Como o placar de 1 a 0 classificava ambas as seleções à segunda fase, seus jogadores passaram a apenas trocar passes. A armação escancarada não foi paralisada nem após a conversa do árbitro escocês Robert Valentine com os capitães das equipes.
08/07 – Alemanha Ocidental 3 x 3 França (5 x 4 nos pênaltis)
Após empate por 1 a 1 nos 90 minutos, com gols marcados por Littbarski e Platini no primeiro tempo, a definição da semifinal da Copa foi para a prorrogação. Os franceses abriram dois gols de vantagem em oito minutos, com Trésar e Girese, mas os alemães tiraram Rummenigge, contundido, do banco de reservas e reagiram. O próprio craque descontou e Fischer igualou o placar, levando a definição do finalista para os pênaltis, algo inédito, até então na história das Copas. Novamente a Alemanha esteve atrás no placar, mas Schumacher defendeu duas cobranças e assegurou a classificação da sua equipe.
11/07 – Itália 3 x 1 Alemanha Ocidental
O duelo que decidiu a Copa de 1982 valia ao campeão a entrada no, até então, exclusivo grupo dos tricampeões mundiais, que até então só contava com o Brasil. E ainda contava com um duelo entre Paolo Rossi e Rummenigge, até então empatados na artilharia, com cinco gols cada. E os italianos sobraram diante dos desgastados alemães, que haviam se classificado à decisão após uma batalha contra a França nas semifinais, definida nos pênaltis. Cabrini ainda perdeu um pênalti assinalado por Arnaldo Cezar Coelho no primeiro tempo, mas Rossi, Tardelli e Altobelli garantiram o título no segundo tempo. O gol no fim de Breitner não diminuiu a festa da Itália, “asa-negra” histórica da Alemanha.
GRANDES SELEÇÕES
ITÁLIA – O cenário era dos piores. Brigada com a imprensa nacional e ainda sob a sombra de um escândalo de manipulação de resultados no futebol local na loteria esportiva, a Itália passou da primeira fase da Copa com três empates. Mas embalou na hora decisiva. Com uma campanha em que passou pela então campeã Argentina, pelo futebol-arte do Brasil e pela rival Alemanha, faturou o seu terceiro título mundial pelos pés do oportunista Paolo Rossi, a forte marcação de Gentile e as defesas de Dino Zoff.
BRASIL – Apontada até hoje por muitos como a mais encantadora seleção brasileira desde a Copa de 1970, a equipe dirigida por Telê Santana apostou no jogo bonito para vencer na Espanha, apoiada no melhor meio-campo do mundo, formado por Cerezo, Falcão, Sócrates e Zico, além do talento de Júnior na lateral esquerda. Parou na eficiência italiana, mas marcou seu nome na história com uma impressionante produção ofensiva – foram 15 gols em cinco jogos.
FRANÇA – Com Platini, Girese e Tiganá, a seleção francesa era vista como representante do jogo bonito da Europa. Teve dificuldades na fase de grupos, avançando com uma vitória, um empate e uma derrota, mas depois passou às semifinais ao triunfar diante de Áustria e Irlanda do Norte. Caiu na disputa de pênaltis para a Alemanha em um jogo de arbitragem questionável e em que esteve em vantagem de dois gols na prorrogação. Desiludida, perdeu também a disputa do terceiro lugar para a Polônia.