1958

Bellini, capitão do Brasil levanta a Taça Jules Rimet AP

Se tivesse se limitado apenas a apresentar ao mundo do futebol Pelé, o seu futuro rei e que então era um menino de apenas 17 anos, a Copa de 1958 já teria cumprido seu papel histórico. No entanto,a sexta edição do Mundial marcou por vários outros motivos. Entre eles, pelo primeiro título da seleção brasileira e por ter um artilheiro que fez um número de gols, 13, jamais superado em uma única edição,o francês Just Fontaine.

Quando as seleções chegaram à Suécia, porém, havia uma grande favorita, a Alemanha Ocidental. França e Argentina poderiam surpreender e o Brasil era uma incógnita. O futebol brasileiro já começava a ser admirado, pela qualidade técnica de seus jogadores. Mas depois da derrota em casa oito anos antes e da eliminação precoce no Mundial da Suíça, nem mesmo no País se acreditava muito na seleção.

Em campo, porém, a Copa foi bem diferente dos prognósticos. A Argentina não passou da primeira fase e chegou a levar 6 a 1 da Checoslováquia. A Alemanha, que defendia o título, em nenhum momento empolgou e caiu para a anfitriã Suécia nas semifinais. E a Hungria, sensação de 1954, estava enfraquecida, pois perdera os craques Puskas, Kocsis e Czibor, que fugiram do país na revolução de 1956.

A França, por outro lado, mostrou-se uma máquina de fazer gols. Foram 23 em seis jogos, entre eles um 6 a 3 sobre a Alemanha na disputa do terceiro lugar – o Brasil havia parado os franceses, com um contundente 5 a 2, nas semifinais.

A Suécia aproveitou o fator casa para caminhar até o vice-campeonato, seu melhor resultado em Mundiais.

Mas a Copa foi do Brasil. Com um futebol irretocável e que foi crescendo a cada jogo, sabendo se impor contra adversários difíceis como União Soviética e Pais de Gales, chegou arrasador nas partidas contra Suécia e França e arrebatou a Jules Rimet.

Conquistou, assim, a primeira das cinco taças que tornariam o Brasil o maior ganhador de Copas.

CAMPANHA DO BRASIL
Brasil 3 x 0 Áustria
Brasil 0 x 0 Inglaterra
Brasil 2 x 0 União Soviética
Brasil 1 x 0 País de Gales
Brasil 5 x 2 França
Brasil 5 x 2 Suécia
JOGOS: 6
VITÓRIAS: 5
EMPATE: 1
DERROTA 0
GOLS PRÓ: 16
GOLS CONTRA 4
ARTILHEIRO: Pelé (6 gols)

NÚMEROS DA COPA
16 seleções participaram da Copa
126 gols foram marcados, em 35 partidas
3,6 foi a média de gols por jogo
23 gols fez a França em seis jogos, o melhor ataque
13 gols marcou o artilheiro Just Fontaine
919.580 pessoas foi o público pagante
Checoslováquia 6 x 1 Argentina foi o placar com maior diferença
França 7 x 3 Paraguai foi o jogo com mais gols
Brasil 0 x 0 Inglaterra, foi o primeiro jogo sem gols da história das Copas

FICHA DA FINAL

Data: 29 de junho de 1958

Suécia 2 x 5 Brasil

Gols: Liedholm, aos 4, Vavá, aos 9, e aos 32 minutos do 1º tempo. Pelé, aos 10, Zagallo, aos 23, Simonsson, aos 35, e Pelé, aos 45 minutos do 2º tempo.

SUÉCIA: Svensson; Bergmark, Axborn; Gren, Liedholm, Gustavsson, Parling, Borjesson; Simonsson, Hamrin e Skoglund.
TÉCNICO: George Raynor.

BRASIL: Gylmar; Djalma Santos, Bellini, Orlando e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo.
TÉCNICO: Vicente Feola.

JUIZ: Maurice Guigue (FRA).
PÚBLICO: 49.737 torcedores.
LOCAL: Estádio Rasunda, em Estocolmo.

DESTAQUE

Numa Copa em que Just Fontaine fez 13 gols, que Didi jogou o fino, que Garrincha causou espanto com seus dribles, que Yashin fez defesas incríveis, o maior destaque foi Pelé. Garoto de tudo, tímido fora de campo, transformava-se dentro dele.

Pelé começou na reserva, até porque convalecia de uma contusão no tornozelo, consequência de uma entrada violenta do corintiano Ari Clemente em um jogo-treino pré-Copa. Só estreou na terceira partida, a pedido dos líderes do time – Nilton Santos, Didi, Bellini. O Brasil empatara com a Inglaterra sem jogar um bom futebol e o menino foi um dos que ganharam uma chance contra a União Soviética.

A estreia de Pelé foi discreta, mas Vavá resolveu na vitória por 2 a 0. Contra o País de Gales, já nas quartas, porém, ele decidiu. O jogo estava complicado quando, aos 21 minutos da etapa final, Pelé recebeu na área, aplicou dois chapéus e concluiu para o gol.

Pelé se apresentava ao mundo. Aos 17 anos e 239 dias, tornava-se o mais jovem jogador a fazer um gol em Copa do Mundo.

Depois disso, a história é conhecida. Três gols e atuação de gala na semifinal contra a França, dois gols na decisão contra a Suécia. O mundo do futebol estava conhecendo seu rei.

GRANDES JOGOS

Seleção brasileira de futebol na Copa da Suécia AP

Brasil 5 x 2 França
A vitória sobre os franceses que levou a seleção brasileira à final da Copa foi um jogo memorável. Em campo, duas equipes que preferiam o futebol ofensivo, ainda que corressem risco. A diferença de três gols pode dar a impressão de que o jogo foi fácil para o Brasil. No primeiro tempo não foi. A França também criou várias chances e só não complicou porque o goleiro Gylmar e os zagueiros Orlando e Bellini estavam inspirados.
Além disso, o Brasil tinha Pelé e Garrincha em grande tarde. Vavá foi o matador de sempre. Didi minava a confiança dos adversários com dribles desconcertantes. Isso fez a diferença.

Vavá marcou logo aos 2 minutos, aproveitando passe de Didi após saída errada dos franceses. Mas aos 8, Fontaine entrou por trás da zaga e empatou- foi o primeiro gol que o Brasil tomou na Copa. O primeiro tempo se manteve equiibrado até Didi acertar uma bomba no ângulo aos 39 minutos.

Na etapa final,o Brasil deslanchou diante de uma atônita França. Pelé, aos 7, aos 19 e aos 29, marcando com o pé direito e com o esquerdo, construiu a goleada e a passagem à decisão. Piantoni até dminiu aos 39, mas naquela altura as 27 mil pessoas que estavam no estádio Rasunda só viam, e aplaudiam, uma equipe em campo: o Brasil.

Suécia 2 x 5 Brasil
Após eliminar a Alemanha na semifinal e contando com o apoio incondicional da torcida, a Suécia passou a acreditar que poderia ser campeã mundial. Respeitava o Brasil de Pelé, Garrincha, Didi e cia., mas tinha fé de que o fator casa faria diferença.

O problema é que era praticamente impossível parar o Brasil. As grandes atuações da seleção a partir das quartas começaram a chutar para longe o “complexo de vira-latas” e time entrou confiante para a decisão.

Nem mesmo o gol de Liedholm aos 4 minutos abalou a equipe. Didi, então, foi ao fundo do gol pegar a bola e caminhou tranquilo e confiante com ela até o meio de campo. Foi a senha para o time reagir. Logo Vavá empataria (9 minutos). Pouco depois, aos 32, ele viraria.

A torcida sueca se rendeu. Em campo, o time anfitrião também. Aí, no segundo tempo só deu Brasil. Pelé marcou um golaço com direito a chapéu no goleiro para fazer o terceiro. Zagallo enfim fez seu gol na Copa. O segundo gol sueco, marcando em posição de impedimento por Simonsson, apenas serviu de consolo para os donos da casa. Pelé ainda usaria a cabeça para fazer o quinto. E finalmente a taça, levantada por sobre os ombros por Bellini num gesto que se tornaria eterno, era do país do futebol.

GRANDES SELEÇÕES

ALEMANHA
Campeã mundial quatro anos antes na Suíça, a Alemanha chegou à Copa de 1958 com status de favorita. Isso mesmo a fase pré-Mundial não sendo boa – de dez amistosos, perdeu sete. Mas o time era praticamente o mesmo que vencera a Hungria por 3 a 2 na final em 1954 e ainda contava com dois jovens talentosos: o atacante Seeler e o zagueiro Schnellinger.

A força da seleção era o entrosamento e a experiência dos jogadores. Graças a isso, a Alemanha conseguiu bons resultados, até chegar à semifinal contra os donos da casa. Então, não suportou a pressão e a contusão de seu melhor jogador, Fritz Walker, e caiu. Mas aquela equipe, onde se destavam também o goleiro Herkenrath, o zagueiro Juskowiak e o meia Eckel está entre os melhores do Mundial.

FRANÇA
A seleção francesa chegou à Suécia pouco notada. Não tinha grande tradição e era encarada como coadjuvante. Mas, quando a Copa começou, a França surpreendeu. Liderada por Kopa, um meio-campista inteligente e habilidoso, e por Just Fontaine, um atacante com raro faro de gol, só não foi mais longe porque encontrou o Brasil pelo caminho.

Mas a seleção francesa tinha muito mais do que os dois jogadores. Praticava um futebol bastante técnico e ofensivo. A base da equipe era o forte Reims, vice-campeão da Copa dos Campeões das temporadas 1955/56 e 1958/59.

Máquina de fazer gols – 23 em apenas seis partidas – a equipe que foi à Copa de 1958 foi a primeira grande seleção francesa da história.

SUÉCIA
Em 1956, a seleção da Suécia conquistou a medalha de bronze na Olimpíada de Helsinque, Finlândia. Naquele mesmo ano, a federação de futebol do país passou a permitir que jogadores profissionais atuassem pela seleção. Esses dois fatores permitiram a montagem de um grupo forte para disputar a Copa de 1958, que o país iria sediar.

Além da boa equipe, a Suécia contou com o apoio total dos torcedores. Em algumas partidas, eles levaram megafones, usados ao mesmo tempo para incentivar seus atletas e deixar “tontos” os adversários.

O fato é que a Suécia tinha bons jogadores como Liedholm, Skoglund, Hamrin, Green e Simonsson.
Com um futebol envolvente, a Suécia passou por Hungria e México e empatou com País de Gales na primeira fase, encabeçando seu grupo. A seguir, eliminou a forte equipe da União Soviética e, na semifinal, despachou a então campeã Alemanha. Para azar dos suecos, porém, o adversário na decisão foi o Brasil…

VAVÁ

Em campos suecos, o centroavante Vavá deixou sua marca cinco vezes Reprodução

Para muitos especialistas, a seleção brasileira de 1958 foi a melhor de todos os tempos. A equipe reunia monstros sagrados como o goleiro Gylmar, os laterais Djalma Santos e Nilton Santos, o ríspido Bellini, o clássico Orlando, o líder Zito, o cerebral Didi, o genial Garrincho, o esforçado Zagallo e um garoto promissor de nome Pelé.

Mas o centroavante roubou a cena, com sua coragem, determinação e ímpeto para surgir em momentos decisivos do primeiro título mundial brasileiro. O pernambucano Edivaldo Izidio Netto, mais conhecido como Vavá “Peito de Aço”, artilheiro do Vasco, e que ganhou o apelido de “Leão da Copa”.

Oportunista, raçudo, valente, não tinha bola perdida para Vavá. Todo lance poderia virar gol. Bola dividida era sempre dele. Se sobrava na grande área, era recebida com um chute forte, seco, indefensável para o goleiro adversário. Foi desta forma que ele saiu do banco de reservas para ficar com a vaga no ataque do também goleador Mazzola.

Vavá foi o autor dos gols contra a temida União Soviética no último jogo da primeira fase. No primeiro, aproveitou um espetacular lançamento de Didi para ganhar do zagueiro na corrida e finalizar sem chance de defesa para o goleiro. O segundo foi digno d suas características. Tabelou com Pelé e dividiu com o zagueiro para fazer o gol. Saiu pulando de alegria de dor no pé por causa da pancada que recebeu no momento da finalização.

Na semifinal duríssima contra os franceses, uma espécie de final antecipada da competição, Vavá deixou também a sua marca, em um dia em que Pelé fez três gols na goleada por 5 a 2 que garantiu a seleção na final.

O “Leão da Copa” aproveitou uma falha da zaga francesa para surgir livre e estufar as redes.

Na final, Vavá fez os dois primeiros gols na goleada por 5 a 2. E eles foram muito importantes, pois os suecos haviam saído na frente do placar. Em ambas as jogadas, “Peito de Aço” aproveitou o cruzamento característico de Garrincha da linha de fundo. O atarracado atacante surgiu com determinação para empurrar a bola para o fundo do gol.

Vavá também foi titular no bicampeonato do Chile, em 1962. Ele morreu em 2002, aos 67 anos.