1970
O vexame em 1966, quando foi eliminado ainda na fase de grupos, mexeu com o brio da seleção brasileira. A equipe conseguiu reunir uma geração talentosa, uma preparação exemplar e um ambiente favorável para não dar chances a ninguém no México. Foram seis vitórias em seis jogos e o título garantido.
A conquista teve como grande significado a posse definitiva da Taça Jules Rimet. Desenhado por um artista belga, o troféu teria como dono o país que vencesse três Copas do Mundo. Para felicidade do Brasil, a equipe voltou do México com o prêmio na bagagem, símbolo da supremacia no futebol.
O Brasil se tornou em 1970 o primeiro tricampeão do mundo. Mais do que isso, chegou a esse status com um futebol exuberante. Foram 19 gols em seis jogos, muitos deles frutos de lances bonitos e históricos de um elenco que contou com cinco craques que eram camisas dez em seus clubes: Jairzinho, Gerson, Tostão, Pelé e Rivellino.
A Copa do Mundo em território mexicano começou a ser vencida pelo Brasil na preparação. O time viajou ao país dia 2 de maio, 40 dias antes da estreia. O período ajudou a equipe a adquirir entrosamento e se adaptar à altitude. O trabalho prévio foi feito na cidade de Guanajuato, a 3 mil metros acima do nível de mar e com ar mais rarefeito até mesmo do que das sedes onde a equipe atuaria.
Aquele Mundial foi marcado também por novidades. As principais foram a possibilidade de cada equipe fazer duas substituições por jogo. Até então, os times precisavam terminar os jogos com os mesmos 11 que haviam iniciado. A outra foi a adoção do cartões amarelos e vermelhos, para facilitar a comunicação e dispensar gestos ou anotações para registrar as advertências.
A confiança da torcida brasileira na seleção era enorme. Apesar de João Saldanha ter saído do cargo e dado lugar para Zagallo a apenas três meses da Copa, a geração talentosa resolvia qualquer temor. Inclusive, na estreia, a Checoslováquia até abriu o placar, mas foi goleada de virada por 4 a 1. Um belo cartão de visitas.
O segundo jogo da seleção foi essencial. A atual campeã, Inglaterra, foi quem deu mais trabalho. Uma partida nervosa, com lances violentos e a histórica defesa de Banks após cabeçada de Pelé. Quem decidiu e fez o gol no 1 a 0 foi Jairzinho. Conhecido como o Furacão da Copa, ele marcou em todos os jogos da campanha.
A Copa do Mundo também ficou marcada não só pelo triunfo brasileiro, como também pela globalização. A África pela primeira vez passou a ter vaga direta na competição e teve o Marrocos como representante, o estreante Israel conquistou presença pelas Eliminatórias da Ásia e El Salvador, nação praticamente vizinha ao México, também fez parte do torneio.
Após a primeira fase, as quartas de final tiveram como destaque a revanche entre Alemanha e Inglaterra. A final do ano anterior novamente terminou na prorrogação, mas desta vez com triunfo dos alemães, por 3 a 2. O resultado deixou nas semifinais apenas campeões mundiais, dos quais três deles (Uruguai, Itália e Brasil) podiam ser campeões e levar a taça para casa.
A semifinal foi a vez do Brasil vencer um grande fantasma, o do Maracanazo. O Uruguai era novamente o adversário, 20 anos depois da fatídica derrota no Rio, e para piorar saiu na frente. Para a felicidade do Brasil, Clodoaldo empatou e no segundo tempo Jairzinho e Rivellino. O temor havia sido derrotado e a final viria.
Do outro lado, estava a Itália. A equipe conseguiu uma classificação espetacular na semifinal, ao bater a Alemanha por 4 a 3, em uma partida de cinco gols marcados na prorrogação. A equipe dava ao Brasil a chance de outra revanche na sequência, pois em 1938, os europeus ganharam na semifinal.
A decisão em 21 de junho no estádio Azteca lotado por mais de cem mil torcedores foi o desfecho apoteótico de uma jornada gloriosa do Brasil. O primeiro tempo até terminou empatado em 1 a 1, com gols de Pelé e Boninsegna, mas na etapa final os gols de Gérson, Jairzinho e Carlos Alberto confirmaram a vitória por 4 a 1.
A Jules Rimet seria definitivamente do Brasil, de forma merecida e para delírio da torcida. O estilo técnico, o chamado futebol arte, marcou aquela campanha e fez o Mundial do México ser um dos mais marcantes já realizados.
CAMPANHA DO CAMPEÃO
Primeira fase
Brasil 4×1 Checoslováquia – 3/6 – Guadalajara
Brasil 1×0 Inglaterra – 7/6 – Guadalajara
Brasil 3×2 Romênia – 10/6 – Guadalajara
Quartas de final
Brasil 4×2 Peru – 14/6 – Guadalajara
Semifinal
Brasil 3×1 Uruguai – 17/6 – Guadalajara
Final
Brasil 4×1 Itália – 21/6 – Cidade do México
NÚMEROS DA COPA
Jogos: 32
Gols: 95
Amarelos: 51
Vermelhos: 0
Público total: 1,6 milhão de pessoas
Cidades-sede: 5
Estádios: 5
FICHA DA FINAL
BRASIL 4 x 1 ITÁLIA
BRASIL: Félix; Carlos Alberto, Brito, Piazza e Everaldo; Clodoaldo e Gérson; Jairzinho, Tostão, Pelé e Rivellino. Técnico: Zagallo.
ITÁLIA: Albertosi; Burgnich, Ceca, Rosato e Facchetti; Bertini (Giuliano), Mazzola e De Sisti; Domenghini, Boninsegna (Rivera) e Riva. Técnico: Ferruccio Valcareggi.
Gols: Pelé, aos 18, e Boninsegna, aos 37 minutos do primeiro tempo. Gérson, aos 21, Jairzinho, aos 26, e Carlos Alberto, aos 42 minutos do segundo tempo.
Amarelos: Rivellino e Burgnich
Público: 107.412 pessoas
Local: Estádio Azteca, na Cidade do México.
DESTAQUE
JOGO DA COPA:
Brasil 1×0 Inglaterra
Era só um jogo da fase de grupos, mas o tempo provou o quanto o encontro em Guadalajara teria um significado histórico pesado. O então atual campeão, Inglaterra, enfrentaria o futuro dono do posto, o Brasil, em uma partida marcada pela maior defesa da história das Copas.
Aos 11 minutos do primeiro tempo, o destaque da partida, Jairzinho, cruzou e Pelé cabeceou firme, no canto. O goleiro Banks saltou e com um tapa de baixo para cima, jogou a bola para escanteio. O lance ficou marcado para a história, assim como o jogo, que foi a batalha mais difícil da seleção brasileira na campanha do título.
Persistente, Jairzinho continuou empenho em furar a resistência inglesa e conseguiu. Em um chute forte, no segundo tempo, o atacante brasileiro definiu o confronto, que foi um dos mais equilibrados e emocionantes daquele Mundial.
GRANDES JOGOS
México 0 x 0 União Soviética
A partida de abertura da Copa não tem gol, mas ficou para a história. O empate inaugurou duas novas regras marcantes. A primeira delas foi a de cartões, que foi criada para facilitar a comunicação do árbitro com os jogadores. A outra foi a de substituição. No time europeu, Puzach entrou no segundo tempo e inaugurou a novidade.
Itália 4 x 3 Alemanha
Após o empate em 1 a 1 no tempo normal, as duas seleções foram decidir a vaga na decisão no tempo extra. A prorrogação foi eletrizante, com cinco gols, reviravoltas e vitória italiana. O jogo foi tão épico que Franz Beckenbauer atuou com o braço amarrado ao corpo após deslocar o ombro direito.
Brasil 4 x 1 Itália
A supremacia brasileira ficou clara em plena decisão de Copa do Mundo. O quarto gol, por exemplo, teve o passeio da bola pelos pés de vários jogadores até a conclusão certeira do lateral Carlos Alberto. Antes disso o time campeão já havia demonstrado talento e grande domínio sobre o adversário.
GRANDES SELEÇÕES
Brasil
Um time com cinco camisas dez, talento e seis vitórias em seis jogos. A seleção brasileira na Copa de 1970 era o ápice do futebol arte, por ter jogadores com técnica apurada, entrosamento e lances bonitos. A equipe apresentou ao mundo do futebol como se conquistar uma Copa com um show de técnica.
Itália
Após o vexame de 1966, quando caiu na primeira fase e perdeu para a Coreia do Norte, a Itália se reestruturou com um time forte e experiente. A base foi da Inter de Milão, campeã europeia na década de 1970, e responsável por ceder titulares como o lateral Facchetti e o atacante Boninsengna. A campanha contou com vitórias sobre México e Alemanha. O título só escapou diante do Brasil.
Alemanha Ocidental
Maier, Vogts, Beckenbauer e Muller. A Alemanha Ocidental começaria a armar o time campeão mundial, quatro anos depois, neste Mundial de 1970. O terceiro lugar veio em uma campanha honrosa, com direito à vingança de ter vencido a Inglaterra, algoz na final da Copa anterior, em 1966.
JAIRZINHO
Se Zagallo tem um mérito na formação da excepcional seleção brasileira da Copa de 1970, no México, foi ter encontrado espaço para cinco camisas 10: Jairzinho, Gerson, Tosão, Pelé e Rivellino. Com esta formação, o Brasil ganhou o tricampeonato colecionando grande atuações.
Se Pelé se doou para ser o grande nome de sua última Copa, foi Jairzinho que eletrizou os gramados mexicanos, ao superar todas as barreiras adversárias, ao demonstrar um preparo físico fora do comum para a época. Em seis jogos, o astro do Botafogo marcou sete gols. Jamais um jogador conseguiu repetir o feito de fazer gols em todos os jogos de um Mundial.
Logo na estreia, dois gols diante da Checoslováquia. O primeiro com direito a um lindo chapéu sobre o goleiro e o segundo em jogada individual e chute cruzado. Vitória brasileira por 4 a 1, de virada.
Diante da então campeã mundial Inglaterra, o confronto mais esperado daquele Mundial, Jairzinho se posicionou de forma correta para receber lindo passe de Pelé, após jogada cerebral de Tostão e disparar uma bomba no único gol do duelo.
Frente à Romênia, no fechamento da primeira fase, foi até o meio da área para desviar um cruzamento de Paulo Cesar Caju no triunfo por 3 a 2.
Nas quartas, jogo duro com o Peru. O gol final na vitória por 4 a 2 veio com Jairzinho, pela meia esquerda, onde ele jogava pelo Botafogo, ao receber grande lançamento de Rivellino.
A semifinal com o Uruguai era a chance de uma revanche do Maracanazo de 1950. Os uruguaios saíram na frente, mas a virada, por 3 a 1, veio com um gol, o segundo, mais uma vez de Jairzinho. Após incrível lançamento de Tostão, o “Furacão da Copa” ganhou na corrida do zagueiro e bateu mais uma vez cruzado.
Veio a final com a Itália. E o camisa 7 não poderia ficar de fora da festa. O terceiro gol na vitória inesquecível por 4 a 1 foi de Jairzinho depois de milimétrico lançamento de Gerson, passe de cabeça de Pelé para a entrada fulminante de Jairzinho no meio da zaga italiana.
Pelé foi incomparável na Copa de 70. Gerson, o motor da equipe. Tostão, o cérebro. Rivellino, a classe. Mas Jairzinho foi a alma do time tricampeão mundial.