1970

Carlos Alberto Torres ergue a taça Jules Rimet Acervo/Estadão

O vexame em 1966, quando foi eliminado ainda na fase de grupos, mexeu com o brio da seleção brasileira. A equipe conseguiu reunir uma geração talentosa, uma preparação exemplar e um ambiente favorável para não dar chances a ninguém no México. Foram seis vitórias em seis jogos e o título garantido.

A conquista teve como grande significado a posse definitiva da Taça Jules Rimet. Desenhado por um artista belga, o troféu teria como dono o país que vencesse três Copas do Mundo. Para felicidade do Brasil, a equipe voltou do México com o prêmio na bagagem, símbolo da supremacia no futebol.

O Brasil se tornou em 1970 o primeiro tricampeão do mundo. Mais do que isso, chegou a esse status com um futebol exuberante. Foram 19 gols em seis jogos, muitos deles frutos de lances bonitos e históricos de um elenco que contou com cinco craques que eram camisas dez em seus clubes: Jairzinho, Gerson, Tostão, Pelé e Rivellino.

A Copa do Mundo em território mexicano começou a ser vencida pelo Brasil na preparação. O time viajou ao país dia 2 de maio, 40 dias antes da estreia. O período ajudou a equipe a adquirir entrosamento e se adaptar à altitude. O trabalho prévio foi feito na cidade de Guanajuato, a 3 mil metros acima do nível de mar e com ar mais rarefeito até mesmo do que das sedes onde a equipe atuaria.

Aquele Mundial foi marcado também por novidades. As principais foram a possibilidade de cada equipe fazer duas substituições por jogo. Até então, os times precisavam terminar os jogos com os mesmos 11 que haviam iniciado. A outra foi a adoção do cartões amarelos e vermelhos, para facilitar a comunicação e dispensar gestos ou anotações para registrar as advertências.

A confiança da torcida brasileira na seleção era enorme. Apesar de João Saldanha ter saído do cargo e dado lugar para Zagallo a apenas três meses da Copa, a geração talentosa resolvia qualquer temor. Inclusive, na estreia, a Checoslováquia até abriu o placar, mas foi goleada de virada por 4 a 1. Um belo cartão de visitas.

O segundo jogo da seleção foi essencial. A atual campeã, Inglaterra, foi quem deu mais trabalho. Uma partida nervosa, com lances violentos e a histórica defesa de Banks após cabeçada de Pelé. Quem decidiu e fez o gol no 1 a 0 foi Jairzinho. Conhecido como o Furacão da Copa, ele marcou em todos os jogos da campanha.

A Copa do Mundo também ficou marcada não só pelo triunfo brasileiro, como também pela globalização. A África pela primeira vez passou a ter vaga direta na competição e teve o Marrocos como representante, o estreante Israel conquistou presença pelas Eliminatórias da Ásia e El Salvador, nação praticamente vizinha ao México, também fez parte do torneio.

Após a primeira fase, as quartas de final tiveram como destaque a revanche entre Alemanha e Inglaterra. A final do ano anterior novamente terminou na prorrogação, mas desta vez com triunfo dos alemães, por 3 a 2. O resultado deixou nas semifinais apenas campeões mundiais, dos quais três deles (Uruguai, Itália e Brasil) podiam ser campeões e levar a taça para casa.

A semifinal foi a vez do Brasil vencer um grande fantasma, o do Maracanazo. O Uruguai era novamente o adversário, 20 anos depois da fatídica derrota no Rio, e para piorar saiu na frente. Para a felicidade do Brasil, Clodoaldo empatou e no segundo tempo Jairzinho e Rivellino. O temor havia sido derrotado e a final viria.

Do outro lado, estava a Itália. A equipe conseguiu uma classificação espetacular na semifinal, ao bater a Alemanha por 4 a 3, em uma partida de cinco gols marcados na prorrogação. A equipe dava ao Brasil a chance de outra revanche na sequência, pois em 1938, os europeus ganharam na semifinal.

A decisão em 21 de junho no estádio Azteca lotado por mais de cem mil torcedores foi o desfecho apoteótico de uma jornada gloriosa do Brasil. O primeiro tempo até terminou empatado em 1 a 1, com gols de Pelé e Boninsegna, mas na etapa final os gols de Gérson, Jairzinho e Carlos Alberto confirmaram a vitória por 4 a 1.

A Jules Rimet seria definitivamente do Brasil, de forma merecida e para delírio da torcida. O estilo técnico, o chamado futebol arte, marcou aquela campanha e fez o Mundial do México ser um dos mais marcantes já realizados.

CAMPANHA DO CAMPEÃO
Primeira fase
Brasil 4×1 Checoslováquia – 3/6 – Guadalajara
Brasil 1×0 Inglaterra – 7/6 – Guadalajara
Brasil 3×2 Romênia – 10/6 – Guadalajara

Quartas de final
Brasil 4×2 Peru – 14/6 – Guadalajara

Semifinal
Brasil 3×1 Uruguai – 17/6 – Guadalajara

Final
Brasil 4×1 Itália – 21/6 – Cidade do México

NÚMEROS DA COPA
Jogos: 32
Gols: 95
Amarelos: 51
Vermelhos: 0
Público total: 1,6 milhão de pessoas
Cidades-sede: 5
Estádios: 5

FICHA DA FINAL

BRASIL 4 x 1 ITÁLIA

BRASIL: Félix; Carlos Alberto, Brito, Piazza e Everaldo; Clodoaldo e Gérson; Jairzinho, Tostão, Pelé e Rivellino. Técnico: Zagallo.

ITÁLIA: Albertosi; Burgnich, Ceca, Rosato e Facchetti; Bertini (Giuliano), Mazzola e De Sisti; Domenghini, Boninsegna (Rivera) e Riva. Técnico: Ferruccio Valcareggi.

Gols: Pelé, aos 18, e Boninsegna, aos 37 minutos do primeiro tempo. Gérson, aos 21, Jairzinho, aos 26, e Carlos Alberto, aos 42 minutos do segundo tempo.
Amarelos: Rivellino e Burgnich
Público: 107.412 pessoas
Local: Estádio Azteca, na Cidade do México.

DESTAQUE

JOGO DA COPA:
Brasil 1×0 Inglaterra

Era só um jogo da fase de grupos, mas o tempo provou o quanto o encontro em Guadalajara teria um significado histórico pesado. O então atual campeão, Inglaterra, enfrentaria o futuro dono do posto, o Brasil, em uma partida marcada pela maior defesa da história das Copas.

Aos 11 minutos do primeiro tempo, o destaque da partida, Jairzinho, cruzou e Pelé cabeceou firme, no canto. O goleiro Banks saltou e com um tapa de baixo para cima, jogou a bola para escanteio. O lance ficou marcado para a história, assim como o jogo, que foi a batalha mais difícil da seleção brasileira na campanha do título.

Persistente, Jairzinho continuou empenho em furar a resistência inglesa e conseguiu. Em um chute forte, no segundo tempo, o atacante brasileiro definiu o confronto, que foi um dos mais equilibrados e emocionantes daquele Mundial.

GRANDES JOGOS

Com preparação feita antecipadamente, o Brasil venceria a Copa de 1970 com seis jogos e seis vitórias Acervo/Estadão

México 0 x 0 União Soviética
A partida de abertura da Copa não tem gol, mas ficou para a história. O empate inaugurou duas novas regras marcantes. A primeira delas foi a de cartões, que foi criada para facilitar a comunicação do árbitro com os jogadores. A outra foi a de substituição. No time europeu, Puzach entrou no segundo tempo e inaugurou a novidade.

Itália 4 x 3 Alemanha
Após o empate em 1 a 1 no tempo normal, as duas seleções foram decidir a vaga na decisão no tempo extra. A prorrogação foi eletrizante, com cinco gols, reviravoltas e vitória italiana. O jogo foi tão épico que Franz Beckenbauer atuou com o braço amarrado ao corpo após deslocar o ombro direito.

Brasil 4 x 1 Itália
A supremacia brasileira ficou clara em plena decisão de Copa do Mundo. O quarto gol, por exemplo, teve o passeio da bola pelos pés de vários jogadores até a conclusão certeira do lateral Carlos Alberto. Antes disso o time campeão já havia demonstrado talento e grande domínio sobre o adversário.

GRANDES SELEÇÕES

Brasil
Um time com cinco camisas dez, talento e seis vitórias em seis jogos. A seleção brasileira na Copa de 1970 era o ápice do futebol arte, por ter jogadores com técnica apurada, entrosamento e lances bonitos. A equipe apresentou ao mundo do futebol como se conquistar uma Copa com um show de técnica.

Itália
Após o vexame de 1966, quando caiu na primeira fase e perdeu para a Coreia do Norte, a Itália se reestruturou com um time forte e experiente. A base foi da Inter de Milão, campeã europeia na década de 1970, e responsável por ceder titulares como o lateral Facchetti e o atacante Boninsengna. A campanha contou com vitórias sobre México e Alemanha. O título só escapou diante do Brasil.

Alemanha Ocidental
Maier, Vogts, Beckenbauer e Muller. A Alemanha Ocidental começaria a armar o time campeão mundial, quatro anos depois, neste Mundial de 1970. O terceiro lugar veio em uma campanha honrosa, com direito à vingança de ter vencido a Inglaterra, algoz na final da Copa anterior, em 1966.

JAIRZINHO

Jairzinho chora ao abraçar Dadá Maravilha Acervo/Estadão

Se Zagallo tem um mérito na formação da excepcional seleção brasileira da Copa de 1970, no México, foi ter encontrado espaço para cinco camisas 10: Jairzinho, Gerson, Tosão, Pelé e Rivellino. Com esta formação, o Brasil ganhou o tricampeonato colecionando grande atuações.

Se Pelé se doou para ser o grande nome de sua última Copa, foi Jairzinho que eletrizou os gramados mexicanos, ao superar todas as barreiras adversárias, ao demonstrar um preparo físico fora do comum para a época. Em seis jogos, o astro do Botafogo marcou sete gols. Jamais um jogador conseguiu repetir o feito de fazer gols em todos os jogos de um Mundial.

Logo na estreia, dois gols diante da Checoslováquia. O primeiro com direito a um lindo chapéu sobre o goleiro e o segundo em jogada individual e chute cruzado. Vitória brasileira por 4 a 1, de virada.

Diante da então campeã mundial Inglaterra, o confronto mais esperado daquele Mundial, Jairzinho se posicionou de forma correta para receber lindo passe de Pelé, após jogada cerebral de Tostão e disparar uma bomba no único gol do duelo.

Frente à Romênia, no fechamento da primeira fase, foi até o meio da área para desviar um cruzamento de Paulo Cesar Caju no triunfo por 3 a 2.

Nas quartas, jogo duro com o Peru. O gol final na vitória por 4 a 2 veio com Jairzinho, pela meia esquerda, onde ele jogava pelo Botafogo, ao receber grande lançamento de Rivellino.

A semifinal com o Uruguai era a chance de uma revanche do Maracanazo de 1950. Os uruguaios saíram na frente, mas a virada, por 3 a 1, veio com um gol, o segundo, mais uma vez de Jairzinho. Após incrível lançamento de Tostão, o “Furacão da Copa” ganhou na corrida do zagueiro e bateu mais uma vez cruzado.

Veio a final com a Itália. E o camisa 7 não poderia ficar de fora da festa. O terceiro gol na vitória inesquecível por 4 a 1 foi de Jairzinho depois de milimétrico lançamento de Gerson, passe de cabeça de Pelé para a entrada fulminante de Jairzinho no meio da zaga italiana.

Pelé foi incomparável na Copa de 70. Gerson, o motor da equipe. Tostão, o cérebro. Rivellino, a classe. Mas Jairzinho foi a alma do time tricampeão mundial.