SUMMIT MOBILIDADE URBANA LATAM 2018

Contra assédio, mulher faz rota mais longa

Estudo mostra impacto da diferença de gênero no uso do transporte público; campanha combate abuso

30 de Maio de 2018
Respeito. Tatiane, Haydée, Calliari (mediador) e Ramalho falaram sobre transporte adequado para as mulheres AMANDA PEROBELLI/ESTADÃO
Flora Monteiro, especial para o Estado

A qualidade dos deslocamentos ainda é bem desigual entre mulheres e homens. É o que revela a pesquisa de Haydée Svab, engenheria civil e co-fundadora da PoliGen, grupo de estudos de gênero da Poli-USP, apresentado em um dos painéis do Summit. Segundo o levantamento, as oportunidades de trabalho e lazer de uma mulher que se locomove de transporte público são muito mais limitadas em termo de distância e prejudicadas em termo de tempo do que as de homens que usam o mesmo modal. O grande vilão da história é o assédio sexual. A mulher perde tempo em busca de lugares e meios seguros para se deslocar, tendo muitas vezes que fazer a rota mais longa para garantir um trajeto e paradas confortáveis e sem perigos.

De acordo com a pesquisa, as oportunidades de trabalho para um homem que se desloca de ônibus estão dentro de um raio de 15 km contra 13,7 km para uma mulher de mesma idade, considerando que ambos, por dia, trabalham e dormem 8 horas e têm 2 horas de lazer.

“Precisamos de processos participativos para a formulação de políticas públicas”, defende Haydée. No Brasil, seis mulheres são estupradas por hora e 86% já sofreram assédio público. Os dados foram apontados por Tatiane Moreira Lima, juíza de Direito Auxiliar da capital em exercício no Setor de Violência contra Infante, Idoso, Deficiente e Tráfico Interno de Pessoas (SANCTVS).

O tema fomentou uma importante iniciativa em São Paulo, encabeçada pelo Tribunal de Justiça, que reuniu as empresas de transporte público da cidade, Prefeitura, Governo e as Polícias Militar e Civil para pensarem soluções para melhorar a segurança das mulheres. O resultado foi uma campanha de marketing com placas fixadas em metrôs, trens, ônibus e estações visando estimular a vítima a denunciar, as testemunhas, a não se omitirem, e o agressor, a ser responsabilizado.

Outra medida foi a capacitação de funcionários da linha de frente das empresas de transporte público para acolherem as vítimas e atenderem as denúncias. “Com a campanha, apenas na SPTrans, entre agosto de 2017 e fevereiro deste ano, foram registrados 35 casos de denúncias. Antes disso, a entidade não tinha registros de abusos sexuais dentro dos ônibus. Ou seja, esse era um problema inexistente”, conta Tatiane.

O MetrôRio também está atuando com ações no combate ao assédio sexual durante as viagens. Os trens contam com vagão exclusivo para mulheres nos horários de maior concentração de passageiros – uma solução imediatista, porém controversa.

“Valorizamos as pessoas em suas individualidades e gostaríamos de ter um sistema sem a necessidade de segregação de qualquer público. Estamos trabalhando na educação e fiscalização para promover uma boa integração entre os homens e mulheres”, diz o presidente Guilherme Ramalho.

O Rio de Janeiro tem hoje um dos metrôs mais seguros do mundo, segundo Ramalho. Em 2017, foram reportados 27 casos de roubo e furto, o equivalente a uma média de 1,2 furtos por milhão de passageiros transportados.

A mediação do painel foi feita por Mauro Calliari, autor do blog Caminhadas Urbanas, do portal do Estadão.

As mulheres andam mais de ônibus e usam menos o carro da família do que os homens Haydée Svab, cofundadora da PoliGen

Salvar vidas é sair do modo automático

O caminho para reduzir os acidentes de trânsito é restringir o carro e priorizar quem está a pé, dizem especialistas

Trânsito. Ribeiro (mediador), Silvia, Baumgratz e Cerdeira: a importância de aumentar a segurança AMANDA PEROBELLI/ESTADÃO
MARCO BEZZI, ESPECIAL PARA O ESTADO

Os números são alarmantes: 1,3 milhões de adolescentes (entre 10 e 19 anos) morrem por ano no trânsito no mundo todo. E mais de dois terços desses óbitos acontecem em países em desenvolvimento. A pauta, segundo Pablo Cerdeira, coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro (FGV Direito Rio), diz muito sobre a sobrevivência dos gestores políticos.

“A população tem demandado muito mais com o acesso às redes sociais. Hoje, a queda de popularidade dos políticos têm sido imediata. Temos exemplos como o do presidente da França (Emmanuel Macron) e do ex-prefeito de São Paulo (João Doria). Em um ano viram um revés agudo nas pesquisas.”

O painel que discutiu a tecnologia que protege passageiros, motoristas e pedestres teve como debatedores, além de Cerdeira, Pedro Baumgratz, coordenador executivo da Iniciativa Bloomberg para Segurança Viária, e Silvia Lisboa, coordenadora do Movimento Paulista para Segurança no Trânsito.

Baumgratz defendeu uma política de segurança para pedestre baseada em evidências. Uma das pesquisas que mostrou no debate deixava claro que, após o término do horário de verão, há mais acidentes pela falta de iluminação. “Precisamos incentivar que a segurança esteja em primeiro lugar e que a política pública seja baseada em evidências. A tecnologia pode permitir que a gente enxergue o que não vemos.”

Outro ponto importante debatido no painel foi a necessidade de inverter a pirâmide e olhar mais para o pedestre e menos para o veículo automotivo. “A segurança do pedestre perpassa condições estruturais”, explica.

Baumgartz, usando como exemplo a quantidade grande de mortes embaixo de passarelas, onde o pedestre teria o instinto de atravessar para economizar tempo. “Mas multá-lo não é a solução. Ele não é o agente que mata, e sim que morre. Reduzir a velocidade dos veículos onde os gráficos mostram que há uma maior demografia de pedestres é obrigatório.”

Em São Paulo, a meta é diminuir os óbitos de trânsito em 50% até 2020, segundo Silvia Lisboa. Em março deste ano, foram 445 óbitos contra 473 no mesmo período do ano passado no Estado – redução de 5,9%. E, se os pedestres correspondem ao maior número de óbitos, os motociclistas estão na segunda posição. “São Paulo está à frente de outros Estados na segurança pois tem o uso do capacete obrigatório”, diz Silvia. “Hoje já estamos estudando a qualidade desse capacete. No Nordeste, por exemplo, as pessoas se locomovem de moto muitas vezes de chinelo e sem capacete.”

Tentar não demonizar o motociclista foi um adendo importante de Baumgratz. “Basicamente você incentivou o problema quando reduziu, por exemplo, o IPI das motos.”

Os debatedores foram unânimes: o Brasil precisa aderir aos mais novos protocolos de segurança veicular. O carro mais vendido aqui, o Onix, da GM, levou nota zero no teste mais recente da Latin NCAP de avaliação de carros novos para a América Latina e o Caribe.

A mediação foi do repórter de Metrópole do Estadão Bruno Ribeiro.

1,3 MILHÃO DE ADOLESCENTES, ENTRE 10 E 19 ANOS, MORREM POR ANO NO TRÂNSITO NO MUNDO