Integração entre as unidades de saúde, recuperação dos hospitais, agilidade na marcação de atendimentos, ampliação da rede por meio da instalação de novas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e de três hospitais. A área da saúde na gestão Fernando Haddad (PT) se apresentou de forma promissora para resolver os problemas historicamente marcados por atrasos na execução de metas e queixas de usuários, mas caminha em ritmo lento passados dois anos e meio de governo. No meio dos objetivos não alcançados, está uma população que pede por mais médicos, atendimento rápido e unidades de saúde com estrutura para receber o fluxo de pacientes.
Capítulo 1
Haddad executa só 6,5% de R$ 1,6 bilhão previsto para metas em Saúde
A gestão Fernando Haddad (PT) terá dificuldades para cumprir suas promessas na área da saúde. Os sete compromissos firmados pelo prefeito no Plano de Metas consumiriam, nos quatro anos de mandato, cerca de R$ 1,6 bilhão em verbas. Até agora, no entanto, somente R$ 108,9 milhões, ou 6,5% do total, foram efetivamente gastos, o que mostra o ritmo lento de execução das metas, segundo dados do site do Plano de Metas. O secretário municipal da Saúde, José de Filippi Júnior, afirmou ao Estado, porém, que os índices de execução orçamentária divulgados no site do plano de metas estão desatualizados e a pasta já teria gasto o equivalente a 15,6% do previsto na execução dos compromissos previstos no programa.
Seriam recursos para tornar realidade, além dos três hospitais, a construção e a reforma de Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs), a implementação da Rede Hora Certa, a criação do módulo de prontuário eletrônico do paciente, a recuperação de hospitais municipais e a abertura de Centros de Atenção Psicossocial (CAPs).
Dos 146 equipamentos novos ou reformados prometidos, como UBSs e UPAs, porém, somente 19 foram entregues em dois anos e meio de governo e outros 28 estão em obras, o que indica que 67,8% das unidades planejadas ainda não tiveram sua construção ou reforma iniciada.
Uma das principais bandeiras da campanha de Haddad, a Rede Hora Certa foi criada, mas sua presença ainda está abaixo do previsto na cidade. Das 32 unidades prometidas, oito foram inauguradas, a maioria delas em ambulatórios de especialidades já existentes. Nesses casos, o equipamento foi reformulado para oferecer também pequenas cirurgias, além de consultas e exames de mais especialidades. Quatro unidades móveis foram entregues por Haddad logo nos dois primeiros anos de gestão para tentar diminuir as filas de espera por procedimentos médicos. Sete unidades, segundo a gestão municipal, estão em obras e devem ser entregues neste mês.
A gestão conseguiu diminuir o número de pessoas que esperam por consultas e exames, que passou de 679,5 mil em dezembro de 2012, último mês da gestão Gilberto Kassab (PSD), para 511,8 mil em fevereiro deste ano, último dado disponível. No entanto, a lista de espera de consultas cirúrgicas, que antecedem a operação, cresceu 10% no período, passando de 56,9 mil para 63 mil.
As filas na rede municipal
Outras unidades. No caso das UBSs, UPAs e CAPSs, o ritmo de construção é mais lento do que a Rede Hora Certa. Dados do site do Plano de Metas mostram que apenas quatro das 43 UBSs prometidas saíram do papel. Dois novos CAPs foram entregues e outros dois readequados para ampliação do serviço – a gestão promete 30 até 2016.
Paciente da UBS Jardim Vista Alegre, na Brasilândia, o motorista Genilson Galdino da Paz, de 43 anos, reclama do tempo de espera para conseguir consultas e retornos na unidade. “O atendimento é demorado. Para clínico-geral, às vezes, demora uns dois ou três meses para a gente conseguir a consulta. O retorno também demora.”
Paz diz que os profissionais da UBS e também da Assistência Médica Ambulatorial (AMA) Jardim Elisa Maria se dedicam para dar assistência aos pacientes, mas que nem sempre dão conta da demanda. “Os postos precisam de mais médicos e enfermeiros. Eles se esforçam, mas não dá.”
Segundo a Prefeitura, 15 UBSs já estão licitadas e as obras terão início neste mês. A previsão de entrega é de um ano. A gestão informou ainda que 44 unidades estão sendo adaptadas para o modelo de UBS integral que, além do atendimento médico, tem ações de promoção à saúde, como atividades educativas.
Na área de pronto-atendimento e emergência, a gestão entregou duas UPAs e iniciou a obra de 13. A promessa é ter 25 desses equipamentos na cidade, somadas cinco unidades novas e 20 prontos-socorros que serão readequados nesse modelo. Haddad prometeu ainda melhorar a estrutura de 16 hospitais municipais, dos quais apenas um, na Mooca, zona leste, teve o serviço finalizado. Outros oito tiveram obras iniciais de reestruturação. Mesmo sem readequar completamente a maioria das unidades, a gestão conseguiu reativar 294 leitos que estavam fechados por falta de pessoal.
Atualização. Filippi Júnior diz que já foram executados “R$ 250 milhões, fora outros R$ 70 milhões que a secretaria investiu em ações complementares às metas e igualmente importantes para a saúde”. Ele se refere à verba usada para projetos como a reforma de unidades de saúde para deixá-las acessíveis a portadores de deficiência e a adaptações em postos de saúde para que eles fossem integrados às AMAs.
O secretário afirma também que a execução orçamentária é baixa porque as obras mais caras demoram para ficar prontas. “As obras dos três hospitais, por exemplo, representam quase a metade de toda a verba prevista para os quatro anos, são R$ 750 milhões. Na medida em que a construção for avançando, a execução aumenta consideravelmente”, diz ele. De acordo com o secretário, serão gastos mais R$ 180 milhões no segundo semestre deste ano, o que colocará o índice de execução em quase 27% ao fim de 2015.
O titular da saúde diz que o ritmo de obras foi prejudicado por dois fatores: a ausência de projetos e licitações prévias das obras necessárias para novas unidades e a restrição orçamentária da Prefeitura. “Nos dois primeiros anos de governo, tivemos de focar na elaboração de projetos, definição de terrenos, desapropriações e licitações”, diz Filippi Júnior.
Capítulo 2
Só um dos três hospitais prometidos deverá ser entregue
Com o atual ritmo dos projetos e os prazos médios das obras, o prefeito Fernando Haddad (PT) só deverá conseguir entregar até o fim de seu mandato, em 2016, um dos três hospitais originalmente prometidos na campanha eleitoral de 2012. Uma quarta unidade de saúde, comprada pela gestão, atualmente em reforma, deverá entrar em funcionamento ainda em 2015 e substituir um dos hospitais planejados.
A promessa de Haddad previa hospitais em Parelheiros, na zona sul, Brasilândia, zona norte, e Vila Matilde, zona leste, este último em substituição ao Hospital Municipal Doutor Alexandre Zaio. Até agora, no entanto, passados dois anos e meio de gestão, apenas as obras do Hospital Parelheiros foram iniciadas e ainda estão em estágio inicial. Este deverá ser o único dos três centros médicos que ficará pronto.
A reportagem visitou o canteiro de obras dos dois hospitais com licitações de obras já finalizadas: Parelheiros e Brasilândia. No primeiro caso, máquinas e operários são vistos trabalhando diariamente. O serviço de terraplanagem já foi finalizado, e a estrutura do prédio começou a ser erguida em julho. A obra estava prevista para começar em dezembro de 2014 e ser finalizada em julho de 2016, mas foi iniciada com dois meses de atraso, em fevereiro de 2015, e a entrega está prevista para setembro do próximo ano.
O hospital é reivindicação antiga dos 205 mil moradores da região, a cerca de 40 quilômetros do centro da capital. “A gente espera que agora realmente saia o hospital porque é muito difícil quando precisamos de qualquer atendimento de saúde. Demora 40 minutos de carro ou mais de uma hora de ônibus até o Hospital do Grajaú, que é o mais próximo”, diz a monitora Tamara Paixão, de 20 anos, que mora na frente do futuro hospital, na Rua Euzébio Coghi.
Segundo a Prefeitura, a unidade terá 255 leitos, dos quais 30 serão de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e 41 de obstetrícia. O hospital terá também pronto-socorro e centro de especialidades.
Desânimo. A situação do futuro Hospital da Brasilândia é menos animadora. A licitação da obra já foi concluída, e o prefeito prometeu que os trabalhos seriam iniciados em junho deste ano. Em visita ao local, o Estado verificou que não há nenhum equipamento ou operário no terreno e a Prefeitura afirmou, em nota, que o início das obras está condicionado à “liberação das licenças pelos órgãos responsáveis”. Embora não tenha informado datas, a gestão municipal afirmou que o equipamento deverá ser entregue à população no segundo semestre do próximo ano, meta difícil de ser cumprida, considerando o prazo da obra: 20 meses.
“Toda semana a gente ouve falar que eles vão começar as obras, mas o terreno continua aí abandonado”, diz a autônoma Patrícia Rodrigues, de 30 anos, que trabalha em um comércio ao lado do futuro hospital, na Estrada do Sabão.
Moradora da região, a balconista Marta Niquirilo, de 47 anos, vê com desesperança a inauguração da unidade. “Mesmo quando o hospital ficar pronto, não sei se vai resolver o problema, porque temos outros hospitais aqui na zona norte com uma boa estrutura, mas que não têm médicos. Não adianta fazer um novo hospital se não conserta o que já existe”, diz.
A mesma opinião tem a balconista Celidalia dos Santos Silva, de 29 anos. “Mais do que hospital, é melhor ter médico. Um dia, acho que esse hospital vai ser construído, mas ninguém nunca veio aqui para fazer isso. Até a placa (anunciando a futura unidade) foi colocada um dia desses.”
O pedreiro Edvaldo d’Arezzo, de 42 anos, não acredita que o hospital será construído. “Acho que não. Eles colocam essa placa, mas não sei se um dia vão fazer o hospital. Seria bom se fizessem.” Ele conta que só busca consulta médica quando está muito doente e que, quando precisa, vai ao Hospital Geral de Vila Penteado, que é da rede estadual e também fica na zona norte. “Só vou ao médico quando estou ruim, porque está sempre faltando médico nos hospitais. O (Hospital) Vila Penteado não fica longe daqui. Da minha casa até lá demora meia hora, mas vou sempre andando.”
À espera dos hospitais
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Sem previsão. Se nas zonas sul e norte, as obras dos hospitais já estão iniciadas, ou pelo menos licitadas, na zona leste não há previsão para o início das obras. Até agora, a gestão finalizou apenas o projeto-executivo do centro médico. Internamente, a Secretaria Municipal da Saúde já admite que dificilmente terá recursos para construir a unidade. No próprio site do Plano de Metas, o hospital não aparece no resumo, apenas no detalhamento do compromisso, e sua execução não é usada para o cálculo do cumprimento da meta.
A Prefeitura afirma, em nota, que o Hospital da Vila Matilde será licitado no segundo semestre deste ano e ficará pronto 24 meses após o início das obras. No lugar desta unidade, na página da internet, a gestão Haddad colocou o Hospital Santa Marina, na Vila Santa Catarina, zona sul, comprado da rede privada em 2013, que atualmente está em reforma para se tornar 100% municipal.
Promessa antiga. Os três hospitais eram promessa do ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD), no entanto, ele não conseguiu licitar nenhum. Kassab apostou em uma parceria público-privada (PPP) para a construção das unidades, mas, em diversas tentativas, não conseguiu atrair interessados. Há sete anos a cidade não ganha um novo hospital municipal. O último, inaugurado em 2008, foi o do M’Boi Mirim, na zona sul.
Em nota, a assessoria de imprensa de Kassab informa que identificou as áreas para os três hospitais na Agenda 2012 e que elas estavam em processo de desapropriação. “Foram publicados decretos no Diário Oficial que declararam os três imóveis – todos eles antigos hospitais – como sendo de utilidade pública para desapropriação futura”, diz. A assessoria confirma que as unidades seriam construídas por meio de PPP e que a previsão de investimento para a obra, e também para reformas e abertura de outras unidades de saúde, seria de R$ 1,2 bilhão. A nota não explica, no entanto, por que o projeto não foi adiante.
A antiga gestão diz que, no período em que esteve à frente da Prefeitura, inaugurou os Hospitais Cidade Tiradentes e M’Boi Mirim, municipalizou o Hospital São Luiz Gonzaga e reabriu, em 2012, o Hospital Santo Antônio em parceria com o Hospital Beneficência Portuguesa em São Paulo.
Capítulo 3
Unidades já existentes sofrem com falta de aparelhos e profissionais
Com o baixo número de novos equipamentos inaugurados na gestão Fernando Haddad (PT) e as dificuldades de financiamento e contratação que atingem a saúde pública, as unidades municipais já existentes continuam com os antigos problemas de superlotação, falta de profissionais e falhas na estrutura.
O Hospital Municipal Vereador José Storopolli, conhecido como Vermelhinho, no Parque Novo Mundo, zona norte, não tinha leitos suficientes para os pacientes que buscavam o pronto-socorro e não realizava radiografias e ultrassons no fim de junho. O Estado encontrou macas no corredor e pacientes internados havia dias em poltronas, enquanto esperavam por vagas.
Com forte cólica renal, a auxiliar de produção Graziele Costa Santos, de 26 anos, ficou quatro dias acomodada em uma poltrona à espera de uma vaga de internação. Quando finalmente conseguiu um leito, teve de aguardar outros quatro dias para conseguir fazer o ultrassom do rim na unidade. “Disseram que o médico que faz o exame tinha se demitido. O que revolta é que é muita promessa política e só quem depende do SUS (Sistema Único de Saúde) sabe o que a gente passa”, diz.
Precariedade
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Quem precisava de raio X no hospital também enfrentava dificuldades. Depois de procurar três prontos-socorros municipais na zona norte, o corretor de seguros Luiz Alexandre Alves da Silva, de 57 anos, teve de pagar, na rede particular, por um raio X para a sua mãe, a aposentada Maria do Carmo Alves da Silva, de 82 anos. “Imagina uma idosa que já teve quatro pneumonias procurar o hospital com tosse e falta de ar e não conseguir fazer um exame básico como esse”, reclama o corretor. “Só depois de pagar pelo exame e levar o resultado ao Hospital Vermelhinho, eles aceitaram internar minha mãe porque viram que ela estava com outra pneumonia. Ainda tive de comprar remédio para inalação”, conta.
Na quinta-feira, dia 9 de julho, a situação indignou o ajudante de motorista Ercílio Vieira, de 28 anos, que levou a mulher, que estava com infecção urinária, para a unidade. “Demorou para fazer a consulta e para sair o resultado do exame de urina, o raio X está quebrado, não passam informação nenhuma. Tem muita gente reclamando lá dentro.”
Em outras partes da cidade, a situação não é diferente. Morador da região do Jabaquara, na zona sul, o frentista Gastão de Melo Filho, de 29 anos, reclama da falta de médicos nos hospitais do entorno. “Meu filho de seis meses teve febre e eu não conseguia achar um pediatra. Fui na AMA da Vila Império, no Hospital (Estadual) Pedreira, no Saboya, e só no último consegui, mas demorou mais de três horas para atenderem”, diz.
Sem médicos. A Prefeitura informa que recebeu autorização para a nomeação de 620 médicos e 600 serão encaminhados para a Secretaria Municipal da Saúde. Os demais vão para o Departamento de Saúde do Servidor (DESS). Também diz que, do total, 364 já começaram a atuar nos equipamentos da pasta e 18 no DESS.
A rede
O déficit de profissionais, segundo a gestão, é de 1.100 médicos nas UBSs de administração direta, no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), na Coordenação de Vigilância em Saúde (Covisa) e no Hospital Municipal e Maternidade Doutor Mário de Moraes Altenfelder.
Em setembro do ano passado, a Secretaria Municipal da Saúde anunciou que iniciaria o processo de convocação de 1.263 candidatos aprovados em concursos realizados naquele ano. A fase inicial previa a convocação de 600 médicos. Segundo a pasta, foram abertas cerca de 2.100 vagas para médicos, somando o chamamento público para que os médicos atuem nas Organizações Sociais de Saúde (OSSs) que está sendo realizado desde 2013.
Prefeitura diz que espera por atendimento respeita regra e admite raio X quebrado
A Secretaria Municipal da Saúde informa que o Hospital Municipal José Storopolli, administrado pela Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), tem três aparelhos de raio X, mas apenas um, móvel, estava funcionando no fim de junho. Os outros dois passavam por manutenção e um já está em funcionamento. “No momento, além do aparelho móvel, os pacientes que necessitam de exames também podem usar o aparelho de tomografia computadorizada.” A SPDM nega falhas no equipamento de ultrassonografia e falta de medicamentos para inalação.
Sobre a demora na marcação de consultas na Unidade Básica de Saúde (UBS) Jardim Vista Alegre, a pasta diz que está dentro do prazo preconizado pelo Ministério da Saúde. A secretaria afirma que a falta de médicos é um gargalo em todo o País, mas que “o déficit atual de médicos nos hospitais diminuiu cerca de 60%, resultado obtido por meio da vinda de novos profissionais de concursos públicos e parcerias feitas com entidades médicas”.
A pasta informa também que tem adotado medidas para repor profissionais em UBSs e em unidades da Assistência Médica Ambulatorial (AMA) administradas por Organizações Sociais de Saúde (OSSs). Entre as ações estão pagamentos e descontos por serviço e exigência de uma “equipe mínima de profissionais durante todo o período de atendimento”.