Marcas ampliam investimento para se aproximar de público menos receptivo a anúncios convencionais

Alessandra Azevedo e Thiago Fadini

De montadoras a bancos, grandes empresas vêm aproveitando o apelo do streaming para se aproximar de um novo público, mais conectado à internet e menos aberto aos anúncios tradicionais. A estratégia em canais como YouTube é contar histórias e transmitir conceitos, e não divulgar produtos. Um modelo de publicidade chamado de branded content, que vem recebendo investimentos crescentes, segundo as próprias marcas e os especialistas do setor.

Foi assim que a Nissan apresentou, no ano passado, mais de 60 candidatos a levar a Tocha Olímpica em seu roteiro pelo Brasil. Histórias como a do músico e poeta Celdo Braga, de Manaus, que usa os sons da Floresta Amazônica em suas composições. E da mergulhadora Karoline Meyer, de Florianópolis, recordista mundial de apneia. Na TV, o único anúncio foi de que o conteúdo estaria disponível online.

“Mais importante que mostrar o produto é evidenciar os valores da marca”, explica o coordenador de Marketing digital da empresa, Murilo Costa. “Queremos que as pessoas se identifiquem, compartilhem e lembrem da empresa de forma positiva.” Ele aponta outros benefícios: ter mais tempo para contar histórias, a um custo mais baixo do que na televisão.

O investimento da Nissan nesta forma de publicidade se repetiu em janeiro, quando a empresa lançou, em parceria com o Instituto Ver & Viver, uma websérie de quatro episódios, na qual narra casos de superação de pessoas com deficiência visual. “O branded content funciona melhor dentro da internet do que fora dela”, diz Costa.

Professor de Comunicação na Faap, Rodrigo Arnaut afirma que, na rede, esse modelo perpetua o efeito da propaganda, uma vez que ela é vista enquanto o conteúdo existir. “Isso faz o retorno para o anunciante ser bem maior.”

Finanças. Já a proposta do Itaú era contar histórias de pessoas que queriam se organizar financeiramente para realizar um sonho. “Educação financeira é uma bandeira que temos há quase 15 anos”, diz Thiago Cesar, gerente de Marketing Institucional do banco. “Sentíamos que a forma publicitária não era eficiente para levar isso às pessoas de uma maneira interessante.”

A websérie de quatro episódios do Itaú, com cinco minutos cada, é exclusiva para o YouTube. Vale a pena vender o apartamento para bancar as despesas do filho que acabou de chegar? Como pagar as dívidas e ainda conseguir fazer a primeira viagem internacional? Essas são algumas dúvidas que fazem parte do conteúdo desenvolvido pelo banco.

“Entramos (no mercado de streaming) muito por conta das mídias sociais e o conteúdo das marcas se tornou uma moeda de troca para relacionamento”, afirma Cesar. “Essa estratégia teve um grande momento na Copa do Mundo, quando lançamos o nosso primeiro curta-metragem.” Os investimentos do Itaú com branded content estão sendo ampliados. Em 2014, representavam de 3% a 4% da verba publicitária. Neste ano, o aporte do banco nessa estratégia gira em torno de 15% a 16%.

Para a presidente da Associação de Marketing e Branded Content (BCMA, na sigla em inglês) na América do Sul, Patrícia Weiss, a evolução desse tipo de publicidade no Brasil foi mais lenta do que em outros países. “Mas a cada ano vemos novas iniciativas que apontam uma clara intenção das marcas em investir mais em conteúdo voltado para o streaming.”

Patrícia diz que a mudança é também uma questão de sobrevivência. “É preciso encontrar a audiência, que está hiperconectada, consumindo histórias com significado e valores humanos, e o conteúdo que quer, onde e quantas vezes desejar.”

Próximo passo

Segundo especialistas, a próxima etapa para o mercado brasileiro é seguir a tendência internacional de trabalhar o conteúdo de marcas além do YouTube, em outros serviços de streaming. Isso vem funcionando em dois modelos: as empresas podem comprar espaço nas plataformas ou até vender o conteúdo original que produzem.

Um dos exemplos mais clássicos é o da rede americana Chipotle Mexican Food, que em 2014 lançou o seriado Farmed & Dangerous, sobre processamento de alimentos. A empresa comprou espaço no hulu.com, plataforma de streaming dos Estados Unidos. “Foi um enorme sucesso”, conta Patrícia. De acordo com ela, algumas marcas estão investindo pesado em conteúdos com tanta qualidade que as pessoas queiram até pagar para consumir, nos diversos formatos de dramaturgia.