MÃO NA MASSA: Como preparar um café profissional em casa


Isabela Raposeiras


Cafeolotras anônimos

texto: Juliana Araújo, especial para o Estado
foto: JF Diorio/Estadão
A aula da barista Isabela Raposeiras começou como uma reunião de, digamos, ‘cafeólatras anônimos’, na manhã desse domingo. Sentados em volta de uma longa e estreita mesa cheia de xícaras grandes e garrafas de água, os doze alunos que estiveram no encontro Como Preparar um Café Profissional em Casa disseram, um por um, nome, idade, profissão e qual a relação que têm com a bebida. Em seguida, experimentaram às cegas os três tipos de café – todos coados - que Isabela preparou pouco antes do início da aula e guardou em garrafas térmicas profissionais.

“Vou falar uma coisa importante: meu café é frio e fraco. Vocês querem desistir agora?”, provocou Isabela, que logo tranquilizou seus alunos explicando que, quando o café resfria, características de avaliação como acidez e doçura se realçam. Ela também ensinou que “o melhor café é o mais diluído”, para o desespero daqueles que não engolem o café de estilo americano.

Ela disse que os americanos usam, em seu mal-afamado ‘chafé’, uma média de 40g a 50g de café por litro de água, enquanto os brasileiros preferem de 100g a 120 g do pó para a mesma quantidade de água. “Eles diluem demais. Mas, tecnicamente, estão mais próximos da concentração ideal, que é de 70g, quando o grão é de qualidade. Os brasileiros diluem pouco e muitos sólidos ficam retidos na borra, por isso o café fica mais amargo e mais pobre”, explicou.

“Café amargo é sinônimo de café ruim”, decretou a barista. Para sentir a “doçura natural” do café, ela pediu que na degustação ninguém adoçasse a bebida. “Mas não fiquem constrangidos se quiserem adoçar o café no dia a dia. Temos que beber do jeito como nos sentimos melhor”, relativizou.

Isabela só começou a degustação depois fazer algumas considerações sobre as principais características do café: a acidez, “uma qualidade da bebida que não tem nada a ver com amargor”; o corpo, “que confere ao café estrutura e viscosidade e está diretamente relacionado a acidez”; e o retrogosto, “sabor residual que tem que ser prolongado e agradável”.

Todos os cafés servidos foram diluídos na mesma proporção: 70 g por litro de água. O primeiro lembrava frutas vermelhas, segundo a barista, enquanto o segundo tinha gosto de cural. Já o terceiro e último, para a infelicidade dos degustadores, cheirava a “borracha de pneu de caminhão”. Alguns concordaram com ela, outros sentiram apenas o gosto de café – mas o grupo foi unânime em relação ao cheiro de borracha. Só então ela contou que os três são da espécie arábica, mas o primeiro é o grão Catuaí Vermelho, da Fazenda Portal, de Minas Gerais; o segundo veio de uma fazenda nas montanhas do Espírito Santo e, segundo ela, tem características de café africano – para ela entre os melhores do mundo -, enquanto o terceiro foi o café Pilão: “a rebarba da rebarba da rebarba das sementes”, nas palavras da barista.

Diante do choque geral, Isabela contou que a mãe dela toma esse mesmo tipo de café. “Não consigo convencê-la a comprar outro, haja terapia para lidar com isso. É muita sabotagem”, brincou.

Isabela falou sobre a data de validade dos grãos, que na legislação é de um ano, mas para ela o consumo deve ser feito em um mês. “Depois de moídos, então, a validade é de dez minutos.” Para solucionar o problema, a dica dela é que todos tenham em casa um moedor que custa aproximadamente R$ 80 em sua loja. “Mas nas americanas.com você encontra por R$ 60.” E no fim da aula moeu o café Catuaí Vermelho para coar na hora – com coador de papel, que segundo ela é melhor que o de pano.

Mesmo depois dos aplausos da aula mais longa deste 7º Paladar Cozinha do Brasil, com duas horas e vinte minutos de duração, ela não desistiu: “Se vocês não comprarem um moedor, não me aplaudam”, disse, com sua firmeza habitual de convicções.