Produto de exportação

Kombi mais antigas atraem clientes estrangeiros

Alexandre Rizzo e um de seus produtos: uma Kombi com para-brisa safáriNilton Fukuda/Estadão
Roberto Bascchera /
do Estadão.com

Há pouco mais de uma década, o negócio de compra e venda de automóveis usados de Alexandre Rizzo estava em crise. E ele, desanimado. Proprietário de três Kombis dos anos 60 à época, o comerciante resolveu anunciar as peruas para ver o que acontecia. "Um alemão entrou em contato comigo e comprou as três. Disse que ia enviá-las à Europa e que se tivesse mais, levaria. Vi naquilo uma oportunidade de negócio e estou nele até hoje", diz.

O que começou por acaso se tornou uma empresa especializada em restauração e exportação. Suíça, Alemanha, França, Espanha, Itália, Estados Unidos, Holanda, Austrália, Emirados Árabes, Áustria e Portugal estão na lista de países que já receberam as peruas nacionais pelas maãos de Rizzo, mas ele não é o único. "Recentemente vendi algumas Kombis seminovas a um porto-riquenho que as levou para seu país, fez a transformação para motor-home e as enviou para os Estados Unidos", diz o comerciante Edson Castro, da Brasil Kombis e Vans, empresa especializada em veículos utilitários da zona leste paulistana.

A preferência dos estrangeiros, no entanto, ainda é pelas "Corujinhas", como são conhecidos no meio os exemplares mais antigos, com para-brisa bipartido, fabricados aqui até 1975. Chamada na Alemanha de VW Bus T1 - Transporter da primeira geração -, onde foi montada de 1950 a 1967, essa versão teve 426.715 unidades fabricadas no Brasil. Por serem cada vez mais raras tanto aqui como fora, elas estão supervalorizadas. Mas ainda se vê muitas nas ruas, trabalhando, ou guardadas nos galpões de restauradores, como Rizzo, que tem cerca de 80 unidades em estoque, incluindo as não menos cobiçadas versões furgão e picape, esta apelidada no meio de "cabrita".

Em meio aos conteineres, aguardando o embarque em Santos MACFEL
Vinte e três janelas, uma das configurações mais apreciadas pelos europeus MACFEL
Devidamente 'embaladas', à espera da viagem MACFEL
Um exemplar Vermelho Cereja e Branco Lotus. Ao fundo, Kombis ainda sem restauração MACFEL
As Kombis modelo 'Clipper', mais modernas, também já são exportadas MACFEL
Uma característica em comum: modelos "Corujinha" e pintura saia-e-blusa MACFEL
Alexandre Rizzo em seu galpão na Grande São Paulo Nilton Fukuda/Estadão
O interior de uma Kombi para exportação: qualidade e requinte Nilton Fukuda/Estadão
Funcionário trabalha em uma restauração Nilton Fukuda/Estadão
Oficina de restauração Nilton Fukuda/Estadão
Kombis nas versões Standard e Luxo aguardam a vez no estoque Nilton Fukuda/Estadão

"Aqui, realizamos sonhos", afirma o empresário de 41 anos."O cliente escolhe o carro, pede o que deseja e nós fazemos. Às vezes, ele chega apenas com uma miniatura nas mãos e diz: 'Quero uma igual a essa'", conta o comerciante. Com o conhecimento acumulado em quase uma década de atividades, a empresa se sofisticou e domina todas as etapas do negócio, da localização de um carro para ser adquirido até o despacho, após a restauração, para o destino, seja no Brasil ou no exterior, com documentação em ordem. A fila de espera para a realização de um projeto com a Rizzo, no entanto, é grande. "Temos trabalhos agendados até dezembro de 2018", diz.

Na internet. Em sites de compra e venda de mercadorias no exterior, como o eBay, é comum encontrar Kombis brasileiras sendo oferecidas já em território europeu. Os preços vão de cerca de 9 mil euros, caso de um exemplar 1974 Standard verde, sem restauração e bem "surrado", a 45 mil euros numa Kombi, também Standard, 1970, na cor Azul Diamante, em bom estado de conservação. Não há "tabela" e é difícil estipular preço, mas, em média, vende-se uma boa Kombi no exterior por cerca de 30 mil euros. Tudo depende da raridade, da qualidade da restauração e dos materiais e acessórios instalados no carro. Estofamento em couro, para-brisas safári (basculantes) e janelas nas laterais do teto são itens apreciados no exterior. Também há procura por outros clássicos nacionais com mecânica Volkswagen a ar, como Puma, Karmann-Ghia TC, SP2, TL e Brasília, carros com DNA brasileiro e "exóticos" aos olhos estrangeiros.

Curiosidades

Como é cada vez mais comum ver carros nacionais chegando em guinchos-plataforma ao Porto de Santos para ser embarcados em conteineres, o assunto gera polêmica entre os antigomobilistas. Há os que defendem que nossa memória automobilística seja preservada e mantida por aqui. Mas também é forte a corrente dos que apoiam a exportação. "Se existe uma portaria do governo federal que permite a importação de veículos com mais de 30 anos, e muitos colecionadores trazem de fora clássicos europeus e americanos, não é razoável impedir a saída de carros nacionais", diz o presidente da Federação Brasileira de Veículos Antigos, Roberto Suga, proprietário de duas Kombis, uma 1965, na cor Branco Lotus, e uma 1970 Azul Diamante. "Outro aspecto que deve ser considerado é que a exportação desses carros, muitos deles restaurados aqui com padrões internacionais, é uma forma de divulgação no exterior da qualidade do produto e da mão-de-obra nacionais."

Mas há também o outro lado da moeda. Como a exportação de Kombis se tornou uma febre, muita gente se aventurou no ramo em busca de bons lucros em curto espaço de tempo e algumas portas se fecharam. Carros com muita ferrugem acumulada e, pior, com defeitos estruturais que põem em risco a segurança foram embarcados para o exterior como se estivessem em bom estado. "O europeu paga um preço alto, mas busca qualidade e não é bobo", diz um restaurador estabelecido na zona leste de São Paulo e que prefere não ser identificado. "Muito veículo podre e com defeitos escondidos foi embarcado. Isso fecha portas e hoje o mercado está muito mais cauteloso ao receber os carros brasileiros."

Para lembrar: a história da Kombi no Brasil