Pedro Conrade está sorrindo, sentado em frente a uma janela. Veste camiseta polo azul e tem cabelos castanhos escuros.
Pedro Conrade, que fundou a Neon com 23 anos, já passou por desafios de gente grande | Foto: JF Diorio/Estadão - 10/08/2016

Eles viraram donos de fintechs antes de completar 25 anos

Unindo novas tecnologias e boas ideias, jovens criaram instituições financeiras digitais que atraem atenção de investidores

Matéria anterior Próxima matéria

Abrir uma empresa não é exatamente algo simples. Ainda mais quando se é jovem. Aproveitando brechas no atendimento de bancos e corretoras tradicionais, Pedro Conrade, Bernardo Pascowitch e Lucas Borges fundaram suas fintechs, instituições financeiras digitais, antes de completarem 25 anos.

Cada empresa está em um estágio diferente de maturidade. Enquanto a Neon Pagamentos, criada por Pedro, recebeu R$ 100 milhões em investimentos, a Yubb, de Bernardo, ganhou seu primeiro milhão de reais em dezembro do ano passado. Já a Trokadus, idealizada por Lucas, ainda não teve aportes, uma vez que está em fase de aceleração e estudo do modelo de negócios.

Da loja de biquínis a um banco digital

Pedro Conrade estava com 23 anos, no fim do curso de administração de empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), quando resolveu criar um banco alternativo. Em boa parte, por causa de uma experiência pessoal ruim: ele havia passado em R$ 1 o limite do cheque especial – e seu banco, cobrado R$ 46 de multa por isso. Nascia a Contro.ly, depois rebatizada de Neon Pagamentos, fintech de contas correntes digitais, com emissão de cartões de débito, crédito e pré-pago.

Alma de empresário ele já tinha desde a adolescência, quando administrava uma loja de biquinis no Guarujá, cidade do litoral paulista onde nasceu. Pedro vendeu o negócio para estudar em São Paulo, onde entrou em contato com o conceito de empresas de digitais e criou uma loja online de compras coletivas, a Reurbano. A iniciativa acabou não dando  muito certo e quebrando oito meses depois. Mas Pedro não desistiu de empreender. Decidiu fundar a Startup House, que intermediava a relação entre investidores e startups digitais.

Essas experiências, segundo ele, ajudaram na hora de conseguir recursos para a fintech, a Neon Pagamentos. “Fiz uma rodada com investidores anjos e captei meu primeiro aporte no início 2015, quando a empresa ainda se chamava Contro.ly.” Ao todo, a fintech esteve em quatro rodadas de investimento, a última foi uma série A, em maio deste ano, quando conseguiu R$ 72 milhões. As rodadas acompanham o desenvolvimento do negócio – em uma série A, a empresa já definiu o modelo de negócios e seus produtos e serviços já estão consolidados.

No mesmo mês, no entanto, Pedro enfrentou um problema de gente grande. Para funcionar, na época, as fintechs de pagamento precisavam de um parceiro bancário. E o parceiro dele era o antigo Pottencial, instituição que mudou de nome para Banco Neon em 2016, assim que passou a operar com a startup de Pedro. Só que o banco foi alvo de um processo de liquidação extrajudicial decretado pelo Banco Central, por “graves violações às normas legais e regulamentares que disciplinam a atividade da instituição financeira, bem como o comprometimento da situação econômica-financeira”.

Com isso, os 600 mil clientes da plataforma de Pedro ficaram com operações bloqueadas. Uma situação difícil que continuou por três dias, até o empresário encontrar um novo parceiro, o banco Votorantim. “Foi um período conturbado.”

Pedro diz que, naquele momento, o banco Pottencial, era a melhor opção para conseguir lançar o Neon. “A gente não tinha relevância no mercado, ninguém conhecia. Então, não tinha muita oferta.” Os sócios do banco também fizeram investimentos anjo para a fundação da fintech.

Ele diz que, para novos empreendedores, é importante procurar parceiros sólidos. “Fomos cuidadosos na hora de fechar a parceria. Mas quando se trata desse tipo de problema, é difícil você ficar sabendo antes”, diz Pedro. “Foi um baita de um azar nosso.”

O economista Mathias Fischer, diretor de Regulação da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), alerta que é preciso avaliar bem os parceiros, para evitar problemas desse tipo. “Existe um potencial risco de contágio tanto das instituições financeiras para a fintech quanto o inverso”, explica.

Fischer lembra que o próprio Banco Central divulga documentos sobre irregularidades nas instituições financeiras. O especialista recomenda, ainda, fazer uma visita para conhecer como o banco funciona, antes de fechar contrato.  “A grande preocupação de qualquer empresa hoje é criar sua reputação, o que leva anos. Mas para destruir é muito rápido.”

De advogado estagiário ao primeiro milhão

Imagine que você ganhe entre R$ 1 mil e R$ 2 mil por mês e não saiba como fazer o dinheiro render. Foi exatamente essa situação que inspirou Bernardo Pascowitch a criar a Yubb, quando tinha 24 anos. Na época, ele fazia estágio na área de fusões e aquisições do escritório Pinheiro Neto, um dos maiores da capital paulista. “Comecei a pensar em investimentos que pudessem servir para mim, como pequeno investidor e estagiário”, conta. “Conversei com diversas pessoas que tinham a minha faixa etária e ninguém sabia como encontrar um investimento adequado.”

Usando algoritmos e robôs, Bernardo montou um buscador que mostra os investimentos disponíveis no mercado. O desenvolvimento inicial da plataforma foi bancado com o dinheiro que o jovem juntou quando ainda trabalhava no escritório. Com o produto lançado e um plano de negócios, ele saiu em busca de investimentos. O primeiro aporte foi feito por seis investidores anjos brasileiros, todos do mercado financeiro.

Hoje, a plataforma monitora 1.800 opções, de 170 instituições financeiras. Quando alguém abre uma conta nas corretoras ou nos bancos indicados na busca, a fintech ganha uma porcentagem da transação.  No ano passado, em dezembro, a Yubb recebeu seu primeiro R$ 1 milhão em rodada de investimentos. Bernardo acredita que a startup deve receber uma nova captação no fim de 2018, já participando de uma série A de rodada de investimentos.

Acesse o YouTube para assistir ao vídeo com audiodescrição sobre Bernardo Pascowitch, do Yubb.

O estudante de economia que deu o troco

Sabe aquele trocado que fica na carteira ou restinho do salário que sobra no fim do mês e você deixa parado? Para fazer essa grana render, o estudante de economia Lucas Borges, de 22, fundou em fevereiro a Trokadus, fintech de microinvestimento digital. “Faz sentido para o perfil do brasileiro e, por isso, considero que a empresa tem impacto social”, afirma o empreendedor, que estuda na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Primeiro, a plataforma identifica seu perfil de investidor e sugere um produto de investimento adequado. Na sequência, você informa quanto quer juntar em determinado tempo – e então descobre o valor que precisa aplicar por dia para alcançar esse objetivo. O débito dessa quantia diária pode ser automático, formando um “cofrinho inteligente”.

Por ser muito nova, a Trokadus está na fase de Mínimo Valor de Produto (MVP), quando se testa o modelo de negócio com poucos clientes e a baixo custo, para ver se vai dar certo. Quando se opera em MVP, o dinheiro necessário geralmente sai do bolso do próprio fundador. No caso, de Lucas e de sua sócia, a também estudante de Economia Amanda Magalhães.

Apesar de já terem recebido propostas de investidores anjos, eles preferiram não aceitar recursos nesta fase, para terem liberdade de consolidar o modelo da plataforma. “Se você recebe dinheiro de um investidor muito cedo, abre mão de uma autonomia do seu negócio.” A empresa está participando da sua segunda rodada de aceleração e Lucas busca parceria com uma instituição financeira para fazer testes em escalas maiores já no início de 2019.  “Quero me dedicar totalmente à Trokadus”, diz o empreendedor, que termina a faculdade neste ano.

Acesse o YouTube para assistir ao vídeo com audiodescrição sobre como Lucas Borges, da Trokadus, fundou sua fintech.

Quer montar uma fintech?

O diretor de Regulação da ABFintechs, Mathias Fischer, dá as principais dicas:

  1.  Defina bem o modelo de negócio
    É importante saber se a empresa está ajudando a resolver um problema real em comparação a outros serviços bancários. Os juros altos e o spread (diferença entre a taxa que o banco capta dinheiro e a que empresta aos clientes) são as principais reclamações dos clientes e, por isso, concentram as oportunidades para os empreendedores interessados nesse mercado.
  2.  Invista do próprio bolso
    A maioria das fintechs e startups no Brasil começa com investimento próprio. O especialista conta que isso é muito bem visto por futuros investidores, já que demonstra comprometimento dos empreendedores com o negócio.
  3. Escolha investidores
    Após colocar dinheiro do próprio bolso na empresa, os fundadores de fintechs vão participar de rodadas com investidor-anjo ou uma empresa aceleradora de startups. O primeiro tipo de parceiro é o que coloca uma grana na fintech. É uma pessoa física com bastante dinheiro, geralmente empresário, que não necessariamente participa da gestão da empresa. Já as aceleradoras auxiliam também no desenvolvimento da equipe e do modelo de negócios das startups.
  4. Atenção para as regras do mercado financeiro
    O mercado financeiro é bastante regulado. O maior risco, que todos os futuros fundadores de fintechs devem evitar, é fazer algo que não seja permitido. Fischer recomenda ficar de olho nas normas e divulgações do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).