Para os minimalistas, o lema é ter menos e ser mais. Para que tanta roupa no armário? E será que o presente precisa mesmo vir na embalagem? Ao repensar o consumo, o trio Cristal, Naiara e Gabriel conta suas experiências e aprendizados ao adotar este lifestyle. Gabriel Melani, de 24 anos, prefere não ganhar presente de aniversário e seleciona bem os amigos. Cristal Muniz, de 25, tem uma composteira no apartamento. Já Naiara Azevedo, da mesma idade, frequenta brechós e depois organiza um próprio para se desfazer do que não usa mais. São os Minimalistas, que selecionamos em diferentes cidades para essa entrevista, ao som dos Tribalistas.
Velha infância
Quais hábitos vocês deixaram de lado?
Cristal Muniz: Deixei de pintar as unhas com esmalte. Além da embalagem não ser reciclável, sua composição é tóxica. Abri mão de tomar sucos prontos, cujas caixas não são muito recicladas. Isopor é algo que evito ao máximo, mas em uma dieta quase vegana compro muitos cogumelos, que são quase impossíveis de encontrar fora de embalagens. Quanto aos bens duráveis, tento sempre comprar coisas usadas.
Naiara Azevedo: Eu comprava tanto em brechós que depois fazia um brechó com coisas que não ia mais usar. Hoje tenho uma visão mais holística da relação entre o humano com a natureza. Passo até um ano sem novas peças no meu guarda-roupa e sempre dou preferência a produtos que possam durar mais.
Gabriel Melani: Comprava livros direto, mas sempre tive muitos que nunca abria a capa e lia. Agora tenho meu tempo melhor direcionado e procuro ler coisas em PDF ou online para não ter de comprar. Quando me mudei para Uberlândia, deixei vários livros com mensagens espalhados em plataformas do metrô de São Paulo. Também não compro roupas há anos e estou sempre doando peças. Tenho só umas quatro ou cinco camisetas e não me preocupo em repetir. Com isso você ganha mais energia, tempo e espaço.
Aliança
Em que a visão de mundo de vocês mudou?
Cristal: Com a noção do lixo que produzo, ao carregar a própria sacola, ou mesmo guardanapo de pano, você começa a ver como existem possibilidades para viver com menos coisas e menos lixo. E coloquei uma composteira no meu apartamento, que fez com que eu conseguisse reciclar quase 50% dos resíduos que produzo.
Naiara: Comecei a meditar, o que faz minha mente se sentir disposta a mudanças. A prática me fortalece e auxilia para ter confiança naquilo que faço.
Gabriel: Sair de casa, tentar viver de forma mais independente, procurar ao máximo não precisar dos meus pais. Já estou administrando minhas despesas e valorizo isso. O minimalismo é um processo gradual, você não vira minimalista da noite para o dia.
Já Sei Namorar
Seus relacionamentos foram afetados?
Cristal: Namoro há um tempo e ele acompanhou todo o processo. Com a família, tento evitar conflitos. Minha mãe me dá presentes sem embalagem e meu pai sempre faz algo para mim. Já com pessoas mais velhas, aceito o presente e tento dar uma utilidade para ele. Caso não use, dou para outras pessoas. Às vezes, recebo presentes de marcas e empresas com diversas embalagens, que recuso por não fazerem sentido com o estilo de vida que levo.
Naiara: Passei a me conhecer melhor. Estou disposta a fazer só o que faz sentido para minha filosofia. Naturalmente, você vai ficando mais seletivo, pensa se vale a pena sair para tal lugar ou comer tal coisa porque tal pessoa ofereceu. Comecei a dizer mais ‘não’ para coisas que não iam me satisfazer por inteiro.
Gabriel: Minha mãe e irmã também estão aderindo ao minimalismo. Meu pai é artista plástico e, por minha influência, foi ao quartinho dos fundos que servia de ateliê para se desfazer de tudo o que não precisava mais. No meu aniversário deste ano, pedi para ninguém trazer presente. Disse que preferia a presença dos amigos. Comecei a valorizar as amizades próximas. Estou até pensando em excluir as contas das redes sociais para estreitar os laços com os amigos que já tenho.
Feliz e Saudável
Como se sentem fisicamente?
Cristal: Hoje fico muito menos doente que antes. Já era vegetariana, mas comecei a adotar uma dieta vegana em casa porque produtos de origem animal geram muitos resíduos. Também comecei a usar produtos de limpeza naturais. Desta maneira, deixei de entrar em contato com diversas substâncias químicas nocivas à saúde.
Naiara: A parte mais importante de adotar o minimalismo é estar mais contente comigo. É um movimento de dentro para fora, que mexe com toda sua vida e engloba aspectos muito mais profundos. No início causa estranhamento, mas depois reverbera em todos que estão a sua volta.
Gabriel: Ainda tenho muita coisa para aprender no minimalismo, mas me sinto bem mais saudável. Estou começando a buscar mais sobre o vegetarianismo e veganismo. Estou me policiando para comprar coisas que não sejam testadas em animais.
Passe Em Casa
O que começaram a fazer em casa?
Cristal: Tenho meu “kit viagem”, que montei com copo, talheres, guardanapo de pano e hashi. Comecei a recusar produtos descartáveis de restaurantes para usar os meus.
Naiara: Comecei a cozinhar mais em casa, dando prioridade aos alimentos mais frescos e de maior qualidade nutricional. Além disso, comecei a enxergar restaurantes como lugares mais para encontrar amigos do que necessariamente para me alimentar.
Gabriel: Eu ia muito ao cinema, e o minimalismo mostrou que era muito gasto de dinheiro. Já pago Netflix, que tem muitos filmes, e não concordo em baixar ilegalmente. Em vez de sair e gastar, vejo em casa. Também estou procurando me alimentar mais em casa, fazer minha comida.
Os nossos minimalistas e os Tribalistas
- Cristal Muniz, de 25 anos, é designer. Nascida em Curitiba, é fundadora do blog Um Ano Sem Lixo e autora do livro Uma Vida Sem Lixo (Ed. Alaude). Mudou os hábitos após estudar como viver sem resíduos. Hoje, além de ter uma vida mais saudável e com menos desperdício, entende que ainda é preciso se desfazer de coisas que tem e faz em excesso.
- Naiara Azevedo, de 25, é jornalista. Antes viciada em brechós, mudou de cabeça depois que entrou em contato com questões ambientais e críticas sobre o consumo. Atualmente, tem uma relação muito mais saudável com as roupas – e com sua vida.
- Gabriel Melani, de 24, é psicólogo. Nascido em Franca, no interior de São Paulo, estudou na capital paulista e atualmente mora em Uberlândia, município mineiro. Músico de hobby, começou a ter contato com o minimalismo por meio do viés artístico, e depois passou a se interessar pelo estilo de vida.
- Tribalistas
Arnaldo Antunes, Marisa Monte e Carlinhos Brown formaram em 2002 um grupo de sucesso meteórico, que vendeu mais de 2 milhões de cópias do álbum pelo mundo. Falava-se da “suavidade” do som da banda em contrapartida às tradicionais batucadas brasileiras, mas a verdade é que o trio apenas definiu suas prioridades. No ano passado, voltaram à tona com novo álbum.