Menina em mesa, em sala de aula, prestando vestibular, com os cotovelos em cima da mesa e as mãos no rosto, com outros alunos dentro da mesma sala.
Estudantes acabam prestando o bacharelado depois, pois dizem que há preconceito com tecnólogo | Foto: Sergio Castro/Estadão-06/1/2015

O que você precisa saber sobre o curso de tecnólogo

Programas são voltados para o mercado e valem como graduação, mas reconhecimento nem sempre é o mesmo na hora de buscar emprego

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Basta falar em curso tecnólogo para que as dúvidas comecem a surgir. A questão sobre ser uma graduação ou um programa de nível técnico é apenas a primeira delas –  e também a mais fácil de responder: é graduação. Mas de fato os tecnólogos têm mais chance no mercado de trabalho? O curso é mais barato, ali, no mês a mês? Dá para fazer mestrado depois? Fomos checar todas essas indagações e outras certezas que, na verdade, nem estão tão certas assim.

Tecnólogo é graduação?

VERDADEIRO: Sim, é uma graduação, só que mais curta e mais especializada do que um bacharelado normal. Um curso tecnólogo dura entre dois e três anos, dependendo da área escolhida. As graduações convencionais costumam levar pelo menos quatro anos. O conteúdo mais voltado à prática é uma das vantagens apontadas por quem prefere a modalidade de tecnólogo, como Natasha Caminha, de 21 anos. “Tudo o que vejo na faculdade aproveito muito bem no estágio. O curso tecnólogo é dinâmico e prepara você para ir ao mercado mais rápido, sem perder a qualidade”, diz a estudante, que faz curso em Marketing. “Acredito que o que se ensina vai ser mais útil na prática.” Feliz com a escolha, Natasha afirma que não faria uma graduação tradicional.

Os programas são reconhecidos oficialmente?

VERDADEIRO: No Brasil, os cursos começaram a ser oferecidos em 1970 e são reconhecidos pelo Ministério da Educação. Mas a regulamentação definitiva da profissão de tecnólogo ainda aguarda votação no plenário da Câmara, por meio de um projeto de lei de 2007. Para o supervisor de auditoria do Sesi/Senai, Ariovaldo Dias da Silva, se a regulamentação for aprovada, o principal benefício será criar reserva de mercado para tecnólogos, o que não acontece hoje. “Áreas que poderiam ser ocupadas por tecnólogos estão com outros profissionais. Com a regulamentação, as vagas de tecnólogos serão ocupadas (somente) por eles (não por bacharéis)”, diz.

O curso vai ter o mesmo ‘peso’ no currículo que o bacharelado?

DEPENDE: Por aqui, esse tipo de graduação ainda não tem o mesmo peso do que no exterior. Ao contrário de países como Alemanha, Estados Unidos e Coreia do Sul, que têm cerca de 50% das matrículas de ensino superior nesta modalidade. “Nesses países, os cursos tecnólogos são bastante divulgados e ocupam um papel vital na política econômica”, afirma Ricardo Terra, coordenador dos cursos tecnólogos do Sesi-Senai São Paulo.  Especialista em ensino superior e fundador da CM Consultoria, Carlos Monteiro diz que os cursos de tecnólogo ainda enfrentam um desafio cultural. “Existe um mito de que os cursos de carga horária grande são os de qualidade e que os de curta duração são de segunda categoria”, explica. “Isso cria uma imagem negativa sobre os cursos tecnólogos.” De acordo com a última pesquisa do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior (Semesp), divulgada no ano passado com base em 2015, 69% das matrículas de ensino superior foram feitas em cursos de bacharelado, 18% em cursos de licenciatura e apenas 13% nos tecnólogos.

Vou ter mais espaço no mercado de trabalho?

DEPENDE: Isso vai variar conforme o curso escolhido e também de acordo com o recrutador. Ainda existem os que não conhecem exatamente as características de um programa de tecnólogo. Uma das confusões é a de pensarem que se trata de um curso técnico, de ensino médio. Foi o que aconteceu com a assistente de Marketing Dunia Majzoub, de 25. Ela terminou o tecnólogo em Produção Multimídia, focado em design, e, assim que foi procurar emprego na área, sentiu dificuldades. “Quando conversava com os recrutadores, eles não entendiam o que eu havia cursado, perguntavam se eu ia fazer faculdade depois. É como se eu tivesse feito um curso de extensão”, conta ela, que afirma ter sofrido preconceito em relação ao curso. Para resolver esse problema, Dunia se inscreveu em uma faculdade de Publicidade, para sair como bacharel. De acordo com o gerente de Marketing da Catho Educação, Fernando Gaiofatto, situações como a de Dunia são fruto de falta de informação. “Se o recrutador não tem conhecimento de que o curso tecnólogo é mais voltado ao prático, pede para o profissional buscar outra graduação.” A coordenadora de Recursos Humanos da Luandre, Renata Motone, concorda. “Os gestores que fazem esta solicitação entendem que os profissionais são mais bem preparados quando seguem cursos regulares de graduação e não os de curta duração.”

É mais barato fazer o curso de tecnólogo?

NEM SEMPRE: Alguns bacharelados convencionais têm mensalidade bastante em conta, como é o caso de Pedagogia, com média de R$ 621, por exemplo, segundo dados do último Mapa do Ensino Superior no Brasil, divulgado pelo Semesp no ano passado. Em contrapartida, o curso de Medicina custa, em média, R$ 6.200 por mês, cerca de dez vezes mais do que a média de um tecnológico – entre esses programas, o mais caro é o de gastronomia, com média de R$ 1.054,23. “No Brasil, o alto custo desse curso (gastronomia) está vinculado às próprias instituições, além da glamourização da profissão. A procura é alta, puxando os valores”, afirma Terra, do Sesi-Senai. Entre os tecnólogos, o curso mais buscado é o de Gestão de RH. “Se a empresa vai contratar para a área de RH, é melhor que seja alguém que tenha feito o curso tecnólogo, é mais específico”, diz o diretor executivo do Semesp, Rodrigo Capelato.

Dá para usar Fies e Prouni?

VERDADEIRO: Muitas dúvidas surgem quando se trata de financiamento, bolsas e demais recursos que podem ser utilizados para custear as mensalidades de um curso superior tecnólogo. Na visão do MEC, cursos de graduação em nível tecnológico só diferem dos de bacharelado e de licenciatura na duração. As três opções – bacharel, licenciatura e tecnólogo – são consideradas com igual peso, ou seja, são graduações de nível superior passíveis de financiamento e de bolsas oferecidas pelo governo. Vale lembrar que também é possível usar os dois benefícios para cursos tecnólogos. Exemplo: um bolsista que utiliza bolsa do Prouni para arcar com 50% do valor da mensalidade pode participar do Fies e financiar os outros 50%.

Todos os tecnólogos são pagos?  

FALSO: Não mesmo. Embora a maior parte das vagas seja na rede privada, há inúmeros cursos de tecnólogos públicos, como os oferecidos pelos Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets) de cada Estado. Para garantir uma dessas vagas gratuitas é preciso participar dos vestibulares que ocorrem no início de cada semestre. Ah… vale prestar atenção para não se confundir com os cursos do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). Embora a entidade tenha programas gratuitos para cursos técnicos e de educação continuada, os tecnólogos são pagos.

Há muita procura pelos cursos?

DEPENDE:  O interesse por cursos tecnólogos públicos tem aumentado. Segundo dados do sindicato, de 2000 até 2016, o número de matrículas em cursos públicos passou de 20 mil para 144 mil. As matrículas nos tecnólogos privados também cresceram no período, de 43 mil para 414 mil estudantes. Com apenas uma diferença: chegou a haver um pico em 2013, com 525 mil matrículas, e o número vem caindo recentemente. Em dados absolutos, a Região Sudeste concentra a maior parte dos alunos matriculados nesse tipo de graduação, segundo o estudo do Semesp.

Posso fazer um mestrado depois do tecnólogo?

VERDADEIRO: Dá, sim, para se inscrever em cursos de mestrado ou MBA após fazer um programa de tecnólogo. Como a graduação vai levar menos tempo, é o caminho mais rápido para chegar à pós-graduação. “Quem faz um tecnólogo pode fazer um mestrado, que não perde nada em termos acadêmicos”, diz Capelato,  do Semesp.

Gráfico com dados de matrículas de tecnólogos no Brasil. São 346.082 no Sudeste, 98831, no Nordeste, 90.705, no Sul, 50.014, no Centro-Oeste, e 31.886, no Norte.