Duas mãos. Uma delas segura seis moedas de diversos valores. A outra abre uma pequena bolsa para guardá-las. Ao fundo, quatro notas de Real ─ três de vinte e uma de dez ─ estão sobre uma superfície branca.
Poupança pode ser uma boa modalidade, desde que se tenha disciplina para depositar todo mês | Foto: Tiago Queiroz/Estadão - 22/8/2014

Economizando de pouco em pouco, o futuro para eles começa agora

Vale poupar a mesada ou o salário do estágio. O importante é romper o ciclo da falta de planejamento e guardar dinheiro desde cedo

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Ana Carolinna Gimenez poupa dinheiro desde que começou a receber mesada. Os dois filhos do administrador Roberto Teperman têm uma renda garantida para realizar sonhos. E os netos de Rosaline Nunes já sabem que podem contar com um tesouro guardado com a vovó. Seja por iniciativa própria, como no caso da universitária, ou com ajuda dos parentes, a história desses brasileiros tem tudo para, desde o início, ser diferente da maioria da população, que não sabe ou não adquiriu o hábito de poupar.

Uma realidade que fica clara em rankings como o do Banco Mundial, no qual o Brasil aparece na 101ª posição, entre 144 países, quando o assunto é guardar ou investir dinheiro. O País está abaixo da média de nações emergentes e também atrás de Bolívia, Mali e Filipinas, entre outros.

Guardar dinheiro é algo ainda mais raro quando se trata dos jovens brasileiros. Segundo a mesma pesquisa internacional, referente a 2017, apenas 6% dos que têm entre 15 e 24 anos no País têm o hábito de economizar. “Nas faixas mais jovens, é muito comum ver que o brasileiro guarda pouco dinheiro”, afirma Aquiles Mosca, presidente do Comitê de Educação de Investidores da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Na contramão deste mau hábito está a estudante de Moda Ana Carolinna, de 22 anos, que desde os 16 mantém suas economias em uma poupança. No início, pelo menos R$ 50 de sua mesada iam religiosamente para a conta todo mês. “Sempre tive essa consciência de que eu precisava guardar o máximo possível”, diz a universitária. “Era a forma de eu conseguir viajar, por exemplo, se meus pais não tinham condição de me dar dinheiro para tudo o que eu desejava consumir.”

Ela foi aumentando o valor das aplicações conforme sua renda crescia. Na época em que estava fazendo estágio, transferia o salário todo para a poupança. “Conseguia me manter com o que meus pais me davam e poupava tudo o que ganhava.”

Victor Irajá/EstadãoA estudante de moda Ana Carolinna Gimenez vestida com um casaco preto, tendo a Avenida Faria Lima ao fundo. É noite. Na avenida, é possível ver bicicletas, uma ciclovia e prédios.
A estudante de Moda Ana Carolinna Gimenez poupa desde os 16 anos: “Sempre tive essa consciência”

No caso do estudante de Direito Antonio Macruz, de 22 anos, a transferência da conta corrente em que recebe o salário de estagiário para a poupança é automática. “Tudo o que ganho, cerca de R$ 1.500, vai para lá”, diz ele, que começou a poupar em 2014.

A opção que Ana e Antonio fizeram pela poupança é compreensível. “É um produto simples de entender e muito seguro”, diz Gilberto Abreu, presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip). Segundo ele, a poupança hoje oferece boa rentabilidade se comparada a outros investimentos mais arriscados. Quem aplica é isento de Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O rendimento é de 0,5% por mês mais a variação da Taxa Referencial (TR) na nova regra – até o ano de 2012, o rendimento era de 6,17% mais a variação de TR.

A poupança é o investimento mais popular do País, em especial entre os jovens. Dados da Caixa mostram que, na faixa etária até 20 anos, 1.766.574 clientes preferem guardar dinheiro na caderneta. Este número sobe para 4.663.048 quando se considera poupadores entre 20 e 30 anos. Já no Banco do Brasil, 2,7 milhões de contas poupança ativas são de jovens na faixa de 14 a 25 anos.

“A escolha da poupança como investimento é uma boa alternativa para o jovem, porque ensina a pensar no dinheiro, a guardar e a pensar no futuro”, diz Miguel de Oliveira, diretor executivo de Estudos e Pesquisas da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). Ele pondera, no entanto, que a falta de obrigatoriedade de investimento mensal pode complicar os retornos futuros. “Num mês, o jovem guarda. No outro, não. A poupança é positiva do ponto de vista de se criar uma renda para o futuro, mas o risco é a falta de obrigação.”

Uma opção sugerida pelo especialista que estimula a disciplina de poupar para o futuro é um fundo de previdência privada. O administrador de empresas Roberto Teperman, de 43 anos, pai de Isabela e Bruno, de 4 e 7, respectivamente, faz uma contribuição em torno de R$ 500 para cada mensalmente. “Eu comecei a investir na previdência de cada um desde o primeiro mês de vida deles. A ideia é que, quando eles completarem 18 ou 21 anos, já tenham uma certa renda para poder definir se querem morar fora, fazer um curso ou dar entrada em um apartamento”, conta Teperman.

A escolha da poupança como investimento é uma boa alternativa para o jovem, porque ensina a pensar no dinheiro, a guardar e a pensar no futuro”, diz Miguel de Oliveira, diretor executivo da Anefac

Mas não precisa esperar ter alta renda ou filhos para investir em previdência privada. O jovem pode escolher um plano logo que entrar no mercado de trabalho, como jovem-aprendiz ou estagiário, baseado no salário recebido. “Se dentro da empresa há planos de previdência complementar, faça o quanto antes. Se não tem, vá para o mercado de seguros e busque uma previdência complementar”, recomenda o vice-presidente da Associação Brasileira de Educadores Financeiros (Abefin), Jusivaldo Almeida. “Para o jovem, falar em aposentadoria parece uma coisa distante, mas não é.”

O economista sugere que o montante investido para a aposentadoria seja de inicialmente 10% do salário ou outros rendimentos e tenha alta progressiva, conforme o aumento de renda. Segundo ele, dizer que jovem não poupa por ter baixos ganhos é “desculpa”. “Começando com a ‘regra’ dos 10%, aos 35 anos você poderia estar investindo cerca de 20%. Acima dos 45 anos, você estaria investindo em torno de 35%. E após os 50 anos, colocaria cerca de 50% dos seus ganhos.”

Há duas principais modalidades de previdência privada. A primeira é o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL), para quem faz a declaração de Imposto de Renda completa, por permitir dedução de até 12% da renda bruta. O segundo é o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), para quem faz a declaração de IR simplificada.

Independente da forma de declaração do imposto, a questão é que é preciso pensar na aposentadoria para além da previdência oficial, o INSS. Levantamento da FenaPrevi-Ipsos, divulgado em junho, revela que 60% dos brasileiros consideram necessário ter um plano de previdência complementar e 38% estão dispostos ou têm recursos para fazer uma reserva para complementar os rendimentos na aposentadoria, enquanto 7% dizem não ter recursos para guardar.

“Para aquele jovem que quer viajar ou trocar de carro no ano que vem, a poupança pode ser um bom investimento. Para projetos mais longos, a previdência é um dos melhores investimentos pelas vantagens fiscais”, diz Sandro Bomfim, superintendente de produtos da BrasilPrev, empresa de previdência complementar ligada ao Banco do Brasil.

O tesouro das crianças

Economista aposentada, Rosaline Nunes, de 66 anos, decidiu investir em uma modalidade diferente pensando no futuro dos netos Luis Felipe e Maria Eduarda, de 8 e 6 anos. Assim que as crianças nasceram, ela comprou títulos do Tesouro Nacional. “Escolhi o Tesouro Direto e, desde então, todo ano eu junto um montante de mais ou menos R$ 2 mil para cada e, no mês de aniversário deles, compro mais um título”, diz. Os papéis são sempre de longo prazo, para daqui a 24 ou 35 anos.

Para estimular o interesse das crianças pela administração do próprio dinheiro, Rosaline fantasia sobre o investimento. “Eles adoram que eu conte que tenho um tesouro e fica aquela brincadeira de ‘cadê meu tesouro?’. Aí eu brinco com eles, perguntando o que irão fazer com o tesouro quando tiverem 18 anos”, conta.

A carteira de investimentos do estudante de Física, Martim Zurita, de 22 anos, é variada. Ele conhece sobre poupança, previdência e Tesouro Direto, mas prefere investir em fundos de ações e Certificados de Depósito Interbancário (CDIs). “Escolhi os CDIs e os fundos de ações como forma de investimento porque estas modalidades são mais eficientes, rendem mais do que a caderneta de poupança”, afirma. Pensando em comprar um apartamento ou um carro no futuro, o jovem aplica integralmente os R$ 400 mensais que recebe de bolsa de iniciação científica.

Esta prática de investir em diferentes produtos é a mais recomendada para os jovens, de acordo com Gilberto Abreu, da Abecip. “O melhor seria ter uma carteira diversificada. Como estamos falando de alguém que está começando a trabalhar, ele pode tomar um pouco mais de risco, porque a perspectiva é poder usar o dinheiro no longo prazo”.