“No fim dos jogos, todos vinham me pedir desculpas”
Pelé nem sempre foi chamado assim. Houve uma época, no início da carreira, logo que chegou ao Santos, que ele era o Gasolina. Claro, uma referência ao petróleo, que dá origem ao combustível. Depois, na Copa de 1958, passou a ser chamado de Alemão. Uma ironia dos colegas da seleção. Depois veio Crioulo, outra referência à cor da sua pele. Por influência direta da imprensa, prevaleceu o apelido de Pelé, que havia sido dado em Bauru.
Tudo isso está no livro “Pelé: estrela negra em campos verdes”, de Angélica Basthi, biografia que aborda, entre outros temas, a relação do jogador com a questão racial.
Inspiração para milhões de negros no mundo todo, Pelé nunca se engajou diretamente na luta contra o preconceito racial. Em vários momentos, não admitiu que tivesse sofrido discriminação, posição que modificou nos últimos anos.
Em 2014, chegou a criticar o goleiro Aranha, chamado de macaco na Arena Grêmio em 2014. “Aranha se precipitou um pouco em querer brigar com a torcida. Se eu fosse parar o jogo cada vez que me chamassem de macaco ou crioulo, todo jogo teria que parar. O torcedor, dentro de sua animosidade, ele grita. Acho que temos que coibir o racismo, mas não é em um lugar público que vai coibir”, disse o ex-jogador, ídolo do Santos e da seleção brasileira.
Em entrevista exclusiva ao Estado, Pelé reconhece que sofreu casos de injúria racial, mas minimiza o problema. “Durante os meus mais de 20 anos de carreira, aprendi a entender as ofensas pelo fanatismo dos torcedores e jogadores. Na emoção, durante os jogos, o torcedor e o jogador desabafam, ofendendo as mães e também pelo lado do racismo”, afirmou o Atleta do Século.
Pelé sentiu o racismo em vários momentos. No Senegal, durante uma excursão do Santos, a recepcionista branca do hotel onde o time se hospedou chamou de selvagens os negros que tentavam se aproximar dos santistas. Foi advertida por um policial e encaminhada à delegacia. “Senti que representava uma esperança para os africanos, como o negro que conseguiria fazer sucesso no mundo”, escreveu Pelé em sua autobiografia publicada em 2006.
O autor de mais de 1200 gols acredita que a situção é melhor em função da atuação da imprensa, entre outros fatores. “No meu caso, quando terminava o jogo, todos vinham me abraçar e pedir desculpas. Atualmente acho que é bem diferente. Há mais respeito e a imprensa está mais presente.”