Uma investigação fraudada. Jovens desarmados foram perseguidos, metralhados e mortos porque foram confundidos com bandidos perigosos. Ao perceber o erro, os homens das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) plantaram maconha e armas no Fusca dirigido pelas três vítimas. Quarenta anos depois, é a voz do homem que comandava a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, o coronel Antônio Erasmo Dias, morto em 2010, que conta essa história e dá um testemunho inédito sobre um dos mais importantes episódios de violência policial: o caso Rota 66.

O homem que chefiou a Segurança Pública de São Paulo de 1974 a 1977 chegou ao seu gabinete na Câmara Municipal pensando no acidente que envolvera, dias antes, uma de suas filhas. Era julho de 2004. Contou como isso despertara sua lembrança sobre o tempo em que fora o todo-poderoso no Estado e sobre o primeiro "episódio drástico" vivido na secretaria que comandara. Erasmo estava à vontade e disposto a falar.

O Estado de S. Paulo
Nº 30.698 – pág. 39
24 de abril de 1975
https://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19750424-30698-nac-0039-999-39-not/busca/66+Rota

Trinta anos se haviam passado desde que três jovens pararam um Fusca azul na frente da casa 46, da Rua João Clemente, nos Jardins, na zona sul de São Paulo. Queriam furtar o toca-fitas do Puma de um amigo. Era madrugada de 23 de abril de 1975. Em menos de uma hora, aquela ação juvenil se tornaria um marco da história da violência em São Paulo: a morte daqueles jovens, metralhados pela equipe 66 da Rota, ia ocupar por mais de 20 anos as páginas dos jornais.

Em meio à investigação do crime, um decreto presidencial determinou que a Justiça Militar devia julgá-lo. E, apesar das provas dos autos, o Conselho de Sentença, composto por quatro oficiais da Polícia Militar e um juiz auditor, decidiu absolver os policiais. Prevaleceu na Justiça castrense a versão dos PMs: os rapazes eram muito mais do que jovens inconsequentes: eram bandidos armados que portavam maconha no carro e reagiram à bala à ação dos homens que tentaram detê-los. A narrativa do caso parecia encerrada. Até que Erasmo Dias sentou em sua cadeira no gabinete no Palácio Anchieta para dar essa entrevista contando o que sabia. É essa confissão que se vai ouvir e ver aqui.