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OAB-SP ameaça recorrer à Justiça contra redução de velocidade nas pistas das Marginais do Tietê e do Pinheiros

Por Pablo Pereira

A partir desta segunda-feira, dia 20, os motoristas que já trafegam pelas Marginais do Tietê e do Pinheiros quase parando terão de tirar o pé do acelerador e colocá-lo no freio. As vias ganharão novos limites de velocidade, mais baixos do que os atuais. Na pista local, por exemplo, a velocidade máxima permitida será de 50 km/h. Para barrar a medida da gestão Fernando Haddad (PT), a Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP) já ameaça recorrer à Justiça.

“Lamento muito quando o poder público faz alterações no cotidiano das pessoas sem que haja debate”, disse o presidente da entidade, Marcos da Costa. Em reunião, também nesta segunda-feira, o conselho da OAB-SP decidirá se a entidade vai recorrer à Justiça contra a ação da Prefeitura. De acordo com Costa, não há segurança nos dados apresentados pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) como justificativa para a medida e também falta debate com a sociedade.

Defendida como um avanço na luta pela redução no número de vítimas no trânsito, principal argumento da Prefeitura para a nova regra, o rebaixamento da velocidade das Marginais é saudada pela Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet). Na pista central, o limite será de 60 km/h, ante os atuais 70 km/h, e na expressa será de 70 km/h, contra os atuais 90 km/h.

De acordo com Dirceu Rodrigues Júnior, chefe do Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da Abramet, a redução de velocidade “é uma medida cautelar, que protege pedestres, ciclistas, a sociedade”. Rodrigues Júnior considera “excelente” a decisão de Haddad, que usa o risco de acidentes - 1.180 acidentes com vítimas, 1.399 feridos e 73 mortes, em 2014, nas duas Marginais - como alegação principal da decisão, conforme estudo apresentado pelo secretário Jilmar Tatto, dos Transportes.

“A gente sabe que em um acidente com um veículo a 32 km/h o risco de óbito é de 5%”, diz Rodrigues Júnior, explicando que esse porcentual sobe para “48% quando o veículo está a 45 km/h e vai a 85% quando o carro está entre 45 km/h e 68 km/h”. O estudo, segundo ele, foi realizado em Londres.

Mapa dos acidentes em são paulo

Fonte: Companhia de Engenharia de Tráfego (CET)/Relatório Anual de Acidentes de Trânsito 2014

Mas a pressão contra a medida vai além. Para o presidente da Comissão Nacional de Direito Ambiental da OAB, Carlos Sanseverino, a simples redução de velocidade nas vias urbanas não comprova uma diminuição dos acidentes. Adversário da medida, o advogado diz ainda que a entidade também não tem conhecimento de nenhum estudo de impacto ambiental feito pela Prefeitura para o embasamento da decisão. “Não conhecemos esse estudo”, afirma. “Foi feito?”

Desastre. Para Sanseverino, decisões sobre a vida do cidadão, tomadas sem consultar a sociedade, como a da redução da velocidade nas Marginais, “são um desastre”. Também presidente da Comissão de Infraestrutura, Logística e Desenvolvimento da OAB-SP, Sanseverino afirma que é preciso que se comprove a eficácia e a eficiência da redução da velocidade em relação aos acidentes.

Para ele, esses estudos são necessários também “para que não se traduza a medida em uma indústria de multas”. Segundo ele, “São Paulo é uma das cinco cidades com maiores congestionamentos no mundo”. “Disputamos com México e Istambul, cidades que têm trânsito caótico.”

O advogado afirma ainda que, nas Marginais, entre 18 e 20 horas, a velocidade média é de 12 km/h. “O Borba Gato fazia mais do que isso no tempo dele, quando andava a 18 km/h, a 20 km/h”, ironiza.

Já Antonio Carlos Pela, vice-presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e coordenador do Conselho de Política Urbana da entidade, é mais incisivo. “Nós, incautos cidadãos, pagamos e não opinamos”, afirma ele, criticando a medida, que considera uma iniciativa para arrecadar mais com multas de trânsito.

O comércio paulistano, segundo Pela, ainda não tem estimativas de eventuais prejuízos das novas velocidades adotadas na capital, que já tem diversos bairros com ruas no limite máximo de 40 km/h. Mas ataca a decisão da Prefeitura.

“É preciso usar o bom senso”, argumenta o empresário. “Em locais de maior concentração de pedestres, como o centro, é evidente que a velocidade tem de ser menor.” Para Pela, porém, não há argumento que justifique a redução para até 50 km/h nas Marginais. “Essa variação de placas de velocidade que existe na cidade, ora 30 km/h, ora 40 km/h, 50 km/h, 60 km/h, leva a uma perda de confiança no sistema”, afirma. “O motorista hoje não confia nas placas”, diz.

Para Pela, é uma contradição a velocidade de uma avenida dentro de um bairro, com semáforos de trânsito local, chegar a 60 km/h enquanto as Marginais recebem limite de 50 km/h. “Você vai encontrar dezenas desses exemplos pela cidade”, afirma.

Novos limites nas marginais

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Estudos. Como os representantes da OAB, o vice-presidente da ACSP também questiona os dados de acidentes usados pela gestão Haddad. “Qual é o período do dia? Como foram esses casos de acidentes com pedestres em uma via como a Marginal?”

De acordo com ele, a redução da velocidade pune toda a população por causa do comportamento de maus motoristas, “de gente imprudente no trânsito”. Segundo Pela, afinal das contas, não há novidade no que acontece com as regras de trânsito em São Paulo. “É o modo deles de governar. Jogam ricos contra pobres, ciclistas contra comerciantes, pedestres contra motoristas.”

CET quer reduzir letalidade no trânsito com novas velocidades

A Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) informa que a redução do limite de velocidade nas Marginais integra o Programa de Proteção ao Pedestre, da Secretaria Municipal de Transportes, “cujo objetivo é o de criar a cultura de respeito ao pedestre, resgatando os valores de proteção ao pedestre, de maneira a ampliar a segurança e reduzir os índices de acidentalidade por atropelamentos”. Cerca de 50% das mortes em acidentes de trânsito na capital, segundo a CET, são de pedestres.

A justifica para a redução da velocidade está baseada em números do Relatório Anual de Acidentes Fatais de 2014 e em estudos internacionais. “Números preliminares apontam que, em 2014, houve redução de 7% no número de acidentes, em linhas gerais, comparado com o ano anterior. Porém, dados já consolidados indicam que o volume de acidentes fatais teve uma elevação de 7,2%.” No ano passado, foram 1.180 acidentes com vítimas nas duas Marginais. Ao todo, foram 1.399 feridos e 73 mortos.

De acordo com a companhia, “como todo programa, o de redução de velocidade será avaliado para verificação do atingimento de seus objetivos e ajustado conforme as necessidades de adequação para que alcance plenamente os resultados esperados de redução do número de acidentes e de severidade das ocorrências”. Até o fim deste ano serão 100 quilômetros de vias com o limite de velocidade reduzido. No ano passado, segundo a CET, a medida foi implementada em 61 km.


Viagem aumenta até 10 minutos com novas regras nas Marginais

Por Bruno Ribeiro e Mônica Reolom

Os novos limites de velocidade das Marginais do Tietê e do Pinheiros passam a valer a partir desta segunda-feira, dia 20, e duas equipes de reportagem do Estado trafegaram, na quarta-feira, dia 15, dentro das novas regras impostas pela gestão Fernando Haddad (PT) e também na velocidade máxima permitida ainda em vigor. A diferença entre as viagens chegou a 10 minutos de um carro para o outro.

Terminado o horário de pico da tarde, que vai das 17 às 20 horas, as equipes de reportagem percorreram a Marginal do Tietê, entre a Ponte Anhanguera (a de número 3) e a do Imigrante Nordestino (a de número 23), pelas pistas locais e expressas, nos dois sentidos (Rodovia Castelo Branco e Via Dutra). Cada trecho tem, no total, 20 quilômetros. Até este domingo, dia 19, a velocidade máxima nas pistas locais é de 70 km/h e será reduzida para 50 km/h; nas pistas expressas, o limite cairá de 90 km/h para 70 km/h.

Importante destacar que o teste realizado sem rigor científico foi capaz de constatar que, enquanto uma equipe trafegou dentro dos 50 km/h na pista local e a outra a 70 km/h, o tempo de viagem é acrescido em 50%. Da Ponte Anhanguera, a oeste da Marginal, até a Ponte do Imigrante Nordestino, a leste, o primeiro veículo percorreu o trecho em 28 minutos; o outro fez o mesmo trajeto em 20.

No sentido contrário, o automóvel a 50 km/h manteve a média de 28 minutos. Já o outro, que percorreu a via no limite de 70 km/h, levou 18 minutos.

A “prova” exigiu paciência. À noite, foi preciso atenção para não deixar o pé escorregar no pedal além do que determina o novo limite de velocidade (50 km/h), o que fez com que o motorista da equipe se queixasse de dor na perna direita.

O quadro, porém, foi um pouco diferente quando o teste foi refeito, desta vez na pista expressa, onde os limites vão mudar de 90 km/h para 70 km/h. Na expressa, a diferença de um carro para outro foi de apenas 60 segundos, com o mais veloz obviamente à frente, encerrando o percurso em 17 minutos. Com a pista cheia de caminhões à noite, não foi possível chegar à velocidade máxima permitida em toda a extensão da via. Mesmo o carro na velocidade menor teve de reduzir a marcha em diversos pontos do local, preso no tráfego de carretas.

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