As cidades brasileiras não têm infraestrutura para operar o transporte coletivo com ônibus de piso baixo, modelo mais acessível do mercado. Além de serem 40% mais caros do que os convencionais, esses veículos não conseguem trafegar em vias com depressões muito grandes ou que ainda não foram asfaltadas. "Não há a menor condição de trocar todos os ônibus do País por veículos de piso baixo. Só numa cidade absolutamente plana isso seria possível", afirma o presidente da Associação Brasileira de Transporte Público (ANTP), Ailton Brasiliense Pires.
Segundo ele, a mudança dos ônibus, de fato, seria um ganho - para os passageiros e o sistema de transporte. Mas, sozinha, substituição da frota não é suficiente, alerta a diretora da Divisão América Latina da Associação Internacional do Transporte Público (UITP), Eleonora Queiruja Pazos. "A acessibilidade precisa ser pensada em escala global, incluindo calçadas e, dependendo do trecho, a inclusão de outros modais de transporte. Mas a geografia das cidades não pode ser desculpa para não trocar os ônibus", diz.
A adaptação dos modais de transporte beneficiaria os mais de 20,5 milhões de idosos e 45,6 milhões de pessoas com alguma deficiência, observados no Brasil pelo Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010. Se considerarmos o rápido envelhecimento da população, a questão se torna ainda mais relevante. Em 2020, a expectativa é que o País tenha 28,3 milhões de idosos. Para 2030 o número sobe para 40,4 milhões. A acessibilidade, porém, não se restringe a apenas esses grupos, afirma Eleonora. Para ela, a adaptação beneficiaria todo mundo, desde grávidas a pessoas usando salto ou carregando mochilas pesadas.
Além de ampliar o público que demanda o uso do transporte coletivo, o presidente da ANTP vê na adaptação dos ônibus um ganho de eficiência para o sistema viário. "Com portas mais largas e um só degrau, embarque e desembarque são mais rápidos. Você conseguiria transportar com 40 ônibus o que se faz hoje com 44. Isso impacta a tarifa, que fica mais barata, e também a remuneração do empresário, que gasta menos com manutenção e compra de veículos", analisa Pires.
Para ele, os empresários têm conhecimento dos ganhos. Mas há grupos que ainda são resistentes à troca. "Em São Paulo, a idade média do ônibus é de 4 ou 4,5 anos. Depois desse período, ele costuma ser revendido para outra empresa que vai usá-lo por mais 5 anos. É essa cadeia que há interesse em manter esse ônibus", explica. "Temos no Brasil cerca de 100 mil ônibus. Então, não dá para fazer a substituição em 4 ou 5 anos, até porque eles costumam ter a vida útil de 10", explica.
Por este motivo, acredita ele, demorará pelo menos 15 anos para que se tenha somente ônibus de piso baixo nos principais corredores do Brasil. “Será um baita avanço.”