Sair da escola e conseguir o primeiro emprego. Ganhar uma promoção e depois encarar outra temporada de estudos, seja graduação ou pós. E, a partir daí, trocar de profissão, iniciar um novo ciclo ou fazer uma pausa para um ano sabático. O roteiro escolhido até pode variar. Mas algo já virou certeza, na opinião de especialistas: todos terão de se preparar para viver uma ultramaratona de carreiras.

Essa mudança vai afetar de maneira mais significativa os nascidos após 1982, os chamados millennials. São eles que viverão em cheio as variações do mercado de trabalho e a perspectiva de vida cada vez mais longa. “Mudar sempre será uma opção de carreira”, afirma a executiva Márcia Almström, da consultoria em recursos humanos ManPower. A empresa fez no ano passado o estudo Carreiras da Geração Milênio: Visão de 2020, que mostra justamente essa transformação.

Diretor do Instituto República e ex-economista chefe do Bradesco, Octavio de Barros afirma que as implicações dessas mudanças são complexas. “Minha geração, ao longo da vida, teve em média sete empregos no total. A geração atual chega a ter sete atividades simultaneamente” (leia aqui a entrevista completa com o economista).

O jovem deve ter em mente que vai se manter em atividade por aproximadamente 50 anos e trocará de profissão algumas vezes, tanto por desejo próprio quanto por mudanças no mercado de trabalho, lembra a professora de administração Vivianne Narducci, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “As previsões para os próximos 15 a 20 anos são de que 50% das profissões da forma como são hoje vão deixam de existir”, afirma Vivianne.

Esse redirecionamento de carreira vai exigir disposição para a aprendizagem contínua. E isso não quer dizer necessariamente que fazer a trajetória do nível superior deve vir em primeiro lugar. Também será importante frequentar ambientes com profissionais de outras áreas e fazer networking.

O cenário de transformação não vai afetar de maneira igual todas as carreiras, ressalta a professora. “Lógico que há profissões que não mudam, como a medicina, embora hoje seja bem diferente do que já foi.”

Sabáticos

Outro aspecto que chama a atenção no estudo da ManPower envolve o desejo por pausas regulares. As pessoas da geração milênio esperam se esforçar e trabalhar por mais tempo do que as gerações anteriores, mas já antecipam mais períodos de parada. Dos jovens entrevistados, 84% avaliam a possibilidade de dar pausas significativas fora do trabalho.

A decisão de fazer esses intervalos varia de acordo com o gênero. As mulheres planejam ficar mais tempo afastadas de suas carreiras para cuidar dos outros. A pesquisa indica que 62% das entrevistadas interrompem o trabalho por conta do nascimento dos filhos, enquanto apenas 32% dos homens citam o mesmo motivo de pausa.

Do outro lado, cuidar de si mesmo está entre as prioridades dos homens para fazer pausas na carreira: 42% dos entrevistados desejam um intervalo na profissão para viajar e relaxar. O porcentual é maior que o de mulheres, com 39% das respostas.

Mesmo com o cenário de múltiplas carreiras, especialistas acreditam que o jovem não está se preparando para as mudanças. Para Ricardo Haag, diretor da empresa de recrutamento Page Personnel, eles não costumam fazer planejamento e estão com um pensamento de carreira muito menos estruturado, porém mais corajoso. “É um misto de autoconfiança com uma série de oportunidades.”

A faixa de trabalhadores com 40 anos ou mais, por sua vez, entra numa fase de transição, porém de maior responsabilidade e pressão, que pode diminuir a frequência de troca de emprego. “Com o envelhecimento da população, elas passam a cuidar dos pais e dos filhos e isso vira uma pressão forte para que permaneçam no trabalho, ainda que infelizes”, aponta Daniel Wjunisk, sócio-fundador do site de saúde e bem-estar Minha Vida.

Dentro das empresas

Também dentro das empresas as carreiras estão em transformação. No mundo, 70% das empresas estão redesenhando ou já redesenharam sua estratégia de carreira, e 65% implementaram modelos mais abertos, conforme um levantamento recente com 10 mil líderes empresariais e de RH de 140 países, feito pela Deloitte, sobre as tendências globais de capital humano. As empresas correm para substituir hierarquias estruturais por redes de equipes. O estudo conclui ainda que a força de trabalho será ampliada e o papel da agilidade será central nas organizações. Essa preocupação com a “organização do futuro”, conforme o termo usado pela consultoria, é ainda maior na América do Sul e Latina do que no resto do mundo.

No momento de planejar a carreira, além das competências profissionais, os recrutadores também avaliam as habilidades sociais. “O mercado de trabalho hoje está aceitando pessoas mais preparadas, não só na parte técnica, como no caso das pessoas mais velhas, como também a parte de comunicação, resiliência e inteligência emocional”, destaca Marcelo Milani, coach em Desenvolvimento de Inteligência Emocional pela American Management Association (AMA). Milani frisa a autoconfiança, pois, segundo ele, a pessoa que conseguir mostrar o que sabe fazer para o resto da vida é quem tem mais condições de conseguir um novo cargo.

Nesse cenário de transformações, projetos que visam desenvolver as competências dos jovens cada vez mais cedo ganham força entre os empregadores. No Instituto ProA, voltado para estudantes dos 17 a 19 anos, a taxa de empregabilidade beira 70%. O projeto - que tem como empresas parceiras Fundação Lemann, Instituto Credit Suisse Hedging Griffo, Grupo Fleury, KPMG, ViaVarejo, JPMorgan, Instituto Cyrela e RB Capital - existe desde 2007 e atende 480 alunos vindos de escolas públicas da cidade de São Paulo. “O ProA surgiu do desejo de jovens empresários de dar oportunidades a jovens de baixa renda para entrar no mercado de trabalho”, afirma o CEO do Instituto ProA, Rodrigo Dib.