Dinamo de Moscou x Spartak 1940 Imagem: Olga Ignatovitch

A URSS quer jogar bola com o resto do mundo (1937-1950)

A partir de 1930, o futebol na União Soviética se transforma em uma ferramenta de diplomacia e de domínio sobre seus vizinhos. Mas a soberania regional já não era suficiente, e conquistar o mundo pela bola virou um plano atrativo aos sovietes

Elcio Padovez, especial para o Estado

Se o futebol da seleção russa de hoje não parece muito animador, nas sete décadas em que a União Soviética existiu, entre 1917 e 1991, ele não era só temido e respeitado, mas um instrumento de paixão popular e uma plataforma poderosa nas relações internacionais. A URSS, que só passou a integrar a Fifa em 1946, após o término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), já respirava a modalidade desde os anos 1910, com a fundação de clubes tradicionais, como o CSKA Moscou (1911), o Spartak e o Lokomotiv (ambos em 1922), o Dínamo de Moscou (1923), e, posteriormente, o Dínamo de Kiev.

Antes da criação do Campeonato Soviético, em 1936, que reuniu as melhores equipes das 15 repúblicas soviéticas até a queda da URSS, o futebol já era visto pelos líderes soviéticos como uma forma de estreitar os laços com os vizinhos, como China e Turquia, além de países que viriam a ser anexados no pós-guerra, como Hungria e Tchecoslováquia. Contra turcos e chineses, os soviéticos pareciam estar num treino de luxo, e mais venciam do que perdiam. Em algumas ocasiões, não eram raros placares acima de dez gols, como um 11 a 0 aplicado na seleção turca, que ainda estava em formação, assim como o novo país.

Até os húngaros, com times lendários do Ferencváros e o Honvéd, e jogadores como Bélla Guttman, um dos responsáveis pelo estilo campeão do Brasil em 1958, dizem, não conseguiram bater de frente com um muro vermelho que se formava a cada jogo, e que não levaria muito tempo para assombrar nações tradicionais no mundo da bola.

Alemanha e Inglaterra ajudam a criar o “futebol científico”

Os soviéticos, que passaram a flexibilizar gradativamente a internacionalização dos esportes e das artes e a fazerem alianças contra a escalada dos nazifascistas na Europa, foram sendo aceitos no COI aos poucos a partir de 1937, e só passaram a integrar a Fifa em 1946, com prestígio em alta por ser um dos vencedores da Segunda Guerra Mundial, junto com a França e os EUA.

O prestígio da União Soviética também deveria ser traduzido em sucesso esportivo, e os líderes comunistas que, entre 1930 e 1950, incentivaram o intercâmbio de ideias futebolísticas com nações como Alemanha e Inglaterra passaram a usar esses conhecimentos para desenvolver um esquema russificado de jogar futebol.

Tais trocas de informações, além de viagens para enfrentar seleções e times fortes da Europa, registraram placares como um 4 a 3 do Dínamo de Moscou sobre o Arsenal, em 1945, e também a formação de um DNA soviético de jogar futebol, que para muitos parecia algo criado em laboratório. Rendeu a eles o apelido de “futebol científico” e, com a medalha de ouro nos Jogos de Helsinki, faria o alto comando da URSS traçar um plano ambicioso: conquistar a Europa e, em seguida, o mundo.

O mundo em 1936 a 1950

1936
Realização da Olimpíada de Berlim, no Estádio Olímpico e com organização do grupo político liderado por Adolf Hitler, que tinha como um dos objetivos demonstrar a soberania dos atletas alemães arianos. Nesses Jogos, o corredor negro norte-americano Jesse Owens conquista quatro medalhas de ouro.

1938
A terceira edição da Copa do Mundo é realizada na França, e não na Argentina, como estava acertado. Os argentinos boicotam a competição, vencida pela segunda vez pela Itália. O torneio sofreria um hiato de 12 anos por conta da Segunda Guerra Mundial.

1939-1945
Segunda Guerra Mundial.

1948
Volta da realização dos megaeventos esportivos, com a Olimpíada de Londres. O Brasil, após recusa de países europeus em sediar a Copa de 1950, se prepara para receber seu primeiro Mundial.