morarJoão Barassal Neto

Tecnologia e ecologia andam juntas na casa das ‘invencionices’

por Edison Veiga
vídeo.Barassal: o 'João Louco' que criou uma casa sustentável

Foi ideia do Joãozinho, que na época, em 2010, tinha só 4 anos. “Compramos a casa e o plano era reformá-la completamente. Aí meu filho falou: ‘vamos fazer uma casa ecológica, pai?’”, conta o engenheiro eletrônico João Barassal Neto, de 57 anos. O menino tinha contato com o tema em um projeto na escolinha.

O comentário acendeu a “lâmpada” na cabeça do engenheiro que, de tanto insistir em invencionices, era chamado de “João Louco” na vizinhança – ele morava no Pari, no centro, antes de se mudar para a casa atual, no Jardim São Paulo, zona norte da capital.

Começou a projetar a tal “casa ecológica”. Pesquisou fornecedores, bolou adaptações e chegou a um modelo ideal. Inscreveu no Prêmio de Mérito Ambiental da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e levou menção honrosa. “Isso abriu portas, pois a casa, ainda no papel, ganhou visibilidade. E aí os fornecedores viraram patrocinadores.”

Não é pouco. Se fosse comprar todas as engenhocas hi-tech com as quais equipou o imóvel, Barassal teria desembolsado mais de R$ 350 mil. “Mas todos foram doados pelos 55 patrocinadores da casa”, explica. “Aqui eles são avaliados e testados em reais condições de uso. A casa está em constante evolução, muitos equipamentos são desenvolvidos e aprimorados. Quero provar que ser sustentável e ecologicamente correto vale a pena.” Para Barassal, a máxima é: “tecnologia e ecologia andam juntas”.

Ele estima que construir e equipar uma casa com alta tecnologia sustentável signifique um investimento 40% maior, para quem está erguendo um imóvel do zero. Mas garante: o gasto volta para o bolso.

Para começar, a energia elétrica. Equipada com placas fotovoltaicas e um gerador eólico, a casa produz 470 quilowatts-hora por mês – e consome apenas 220. De acordo com a resolução normativa 482 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), ele “vende” esse excedente para a AES Eletropaulo. Vende entre aspas, porque a resolução prevê crédito em energia. “Como tenho autonomia total, espero um dia poder receber em dinheiro”, afirma.

foto.João Barassal Neto entre equipamentos instalados em sua casa

Também tem a água. Com 1 hora de chuva a família vive por uma semana sem depender da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). Isso porque a água da chuva é transportada, por um sistema de calhas, para uma cisterna de 8 mil litros. E, em um quarto dos fundos, o engenheiro tem uma miniestação de tratamento. “Nós tornamos a água da chuva potável, tratando e adicionando sais minerais.”

A churrasqueira está equipada com uma serpentina para água. “Quando faço churrasco, a água da torneira ao lado já sai quente, facilitando a lavagem da louça”, diz. Está calor ali? O telhado tem um sistema de irrigação que garante um refresco. Tubos equipados com lentes convergentes até as telhas também criam luminárias naturais, aproveitando a luz solar.

O ar condicionado que resfria o cômodo onde estão os servidores que fazem o gerenciamento online dos equipamentos também esquenta a água para o banho. É que esses aparelhos abaixam a temperatura do ambiente interno, mas geram calor – que, em geral, é jogado fora nos imóveis “convencionais”.

E, mostrando que ele não quer deixar dentro de casa suas práticas ecológicas, a última novidade é um sistema de abastecimento de carro a gás. Graças a uma parceria com a Companhia de Gás de São Paulo (Comgás), desde setembro sua garagem tem o primeiro ponto de abastecimento a gás natural veicular (GNV) domiciliar do País. O gás é considerado um “combustível limpo”, pois emite, em média 15% menos dióxido de carbono do que o etanol e 20% menos do que a gasolina. Nas próximas semanas, o engenheiro deve começar a usar as tomadas para carregar o carro elétrico que já tem na garagem. Mais do que morar verde, a família Barassal também quer andar verde.

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TIJOLOS REAPROVEITADOS DATACENTER MÓVEIS DE MADEIRA DEDEMOLIÇÃO Aquecimento de água A água do reservatório pode ser aquecida por meio de uma serpentina instalada no fundo da churrasqueira A água fria passa pela serpentina, é aquecida pelo calor e vai direto para a torneira da pia TIJOLOREFRATÁRIO SERPENTINA ÁGUA FRIA ÁGUA QUENTE Abastecimento GNVEsta casa tem o primeiro ponto de abastecimento GNV domiciliar do Brasil Calefação Uma lareira com recuperador de calor para controlar a entrada do ar de combustão e outro para a saída de fumaça, evitando desperdícios na obtenção do ar quente FUMA ENTRADA DE AR FRIO DUTOS DE AR QUENTE SDA DEAR QUENTEDO RECUPERADOR Sistema de captação e tratamento de água de chuvaToda a água que cai nos telhados e coberturas é canalizada para uma filtração primária, com a finalidade de retirar partículas macroscópicas, sendo então encaminhada para uma cisternade armazenamento CAIXA DAGUA RESERVATÓRIO FILTRO DE CARVÃO CLORO A água não tratada éusada nos sanitários, lavagem de quintais, lavagem de carros e irrigação das plantas Após o filtro de carvão ativado, é feita uma cloração, garantindo assim que seja limpa a água enviada para a caixa CHUVA FILTRAÇÃOPRIMÁRIA Energia elétrica16 placas fotovoltaicas geram 470 KW/h por mês de energia elétrica para suprir as necessidades da residência Para evitar oscilações na produção de energia durante o ano, essa energia é armazenada em um banco de baterias PAINÉIS SOLARES CONTROLADORINTELIGENTE BANCO DE BATERIAS ILUMINAÇÃO LED EQUIPAMENTOS ÁGUA QUENTE SolatubeSistema de iluminação natural (luz do sol encanada). Por meio de lentes côncavas e convexas, usa a refração da luz do sol para iluminar ambientes durante o dia TELHADO TUBO DE ALUMÍNIO LUZ SOLAR LENTES LUZ DIFUNDIDA Energia eólicaAproveitando a boa ventilação do local, foi instalada ali uma torre eólica. Com peso de 1 tonelada e 6 metros de altura acima do telhado, produz cerca de 650 KW/h por mês Telhado Com telhas de barro de pigmentação clara, reflete mais a luz solar e absorve menos calor e, assim, emite menos gás carbônico na atmosfera – com os ambientes mais frescos, as pessoas podem reduzir o uso do ar-condicionado e do ventilador LUZ SOLAR
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Ficha técnica

Obra: Casa Modelo

Localização: Rua Pero Leme, 23, Jardim São Paulo-SP

Área do Terreno: 250 m²

Área Construída: 290 m²

Numero de Habitantes: 4

Contrução: Smart Eco House do Brasil

Lições começam em casa

por Giovana Girardi

Instalar painéis solares em busca de eficiência energética e construir empreendimentos verdes desde a concepção são algumas das iniciativas espalhadas pela cidade

Ter uma casa 100% ecológica como a de João Barassal Neto pode não ser algo acessível para todo mundo, mas algumas ações que poupam não só os recursos naturais como o bolso têm recebido cada vez mais incentivos.

É o caso, por exemplo, da instalação de painéis solares no telhado. Em tempos de energia elétrica mais cara, isso pode trazer autonomia energética durante o dia e, se houver uma produção maior que o consumo, esse excedente pode ser devolvido para a rede elétrica e render desconto na conta de luz. Desde 2012, uma resolução da Aneel prevê que o consumidor pode instalar seu próprio sistema de geração de energia e obter descontos na conta de luz. No ano passado, uma revisão da resolução deixou essa possibilidade ainda mais atrativa. Até então, se um prédio ou um condomínio instalasse um painel, o desconto iria para a conta do prédio, que poderia então dar algum desconto na taxa de condomínio.

A partir de 1º de março, quando as mudanças entram em vigor, o desconto terá de ser rateado entre todos os moradores. “Isso vai fazer todo o sentido para grandes cidades, que têm muitos condomínios, como São Paulo. Vai mudar o panorama energético”, aposta Larissa Rodrigues, da campanha de Clima e Energia do Greenpeace.

Ela explica que, dependendo do tamanho do painel e do consumo do cliente, é possível ter algo entre 40% e 70% de desconto. A resolução revisada também permite que um grupo de pessoas se junte para comprar um sistema de placas solares para instalar em um só lugar e todas receberem o desconto na conta. Isso pode ser interessante, por exemplo, para alguém que more de aluguel, mas queira investir nisso. Ele pode se associar a outros amigos e instalar na casa de algum deles. Quando o excedente gerar descontos, todos os “sócios” serão recompensados. “Isso tem potencial de aumentar muito as instalações na cidade, porque vai diminuir o custo de investimento. E também vai abrir oportunidades de negócios: quem tem espaço pode oferecer para outros que queiram investir em solar”, afirma Larissa.

IPTU verde. Nesse espírito, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), propôs em outubro passado a criação do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) verde, que daria desconto de até 12% para construções sustentáveis certificadas. O projeto ainda tramita na Câmara, mas a expectativa da Secretaria de Finanças é de que beneficiaria entre 500 e 1 mil empreendimentos por ano.

Em todo o País, São Paulo é a cidade que lidera a quantidade de empreendimentos com esse tipo de certificação. Só o selo Leed certifica ou está em processo de certificar 155 empreendimentos na capital e o AQUA-HQE, 127. A arquiteta Vanessa Rocha Siqueira, do escritório Norte Arquitetura e Urbanismo, que trabalha com Leed, explica que para ser certificado um empreendimento precisa atender de seis a sete categorias. É preciso, por exemplo, prevenir poluição, ter um consumo reduzido de água e de energia e fazer coleta seletiva. Segundo ela, um prédio certificado chega a consumir 40% menos energia e de 20% a 40% menos água.

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