A Evolução


Entre a cruz e a espada, a popularidade e a relevância



O Rock in Rio chega ao 30º aniversário cheio de ambições, mas encurralado por duras escolhas
Entre a cruz e a espada, entre a popularidade e a relevância O Rock in Rio chega ao 30º aniversário cheio de ambições, mas encurralado por duras escolhas

"Eu fui". A estampa que confirmava a presença no Rock in Rio era comum de se encontrar. Fosse em adesivos, camisetas. Não importa. A onipresença do festival, que comemora o trigésimo aniversário, sempre o posicionou de forma diferente dos outros. Rock in Rio não é sobre uma ou outra banda. É, diz Roberto Medina e sua trupe afortunada, sobre a experiência. A equipe de marketing não teria como saber, na época, mas algo como o "Eu fui" é um símbolo precursor de aplicativos atuais como Foursquare, Instagram, etc., etc., nos quais podemos registrar todos os nossos passos. Antes de smartphones deixarem de ser coisa de ficção científica para estar nos nossos bolsos, "Eu Fui" era o máximo que poderia existir para esbanjar diante daqueles que não puderam estar lá.

Em 1985, veja bem, não havia a possibilidade de escolha entre tantas opções de shows internacionais. O Brasil não era rota das turnês, com algumas exceções, e um evento do porte do Rock in Rio chamava a atenção por si só. A primeira edição, há 30 anos, trouxe artistas como Queen, Iron Maiden, Whitesnake, George Benson, James Taylor, Rod Stewart, AC/DC, Scorpions , Ozzy Osbourne e Yes – isso sem citar os artistas brasileiros. Pronto! O Rock in Rio estava criado como um dos mais bacanas eventos culturais de proporções gigantescas a passar pelo Brasil. Virou marca, expandiu e, convenhamos, implode aos poucos.

Implode, ou assim dizendo, sufoca-se, diante da necessidade gritante de atingir as massas. Repete fórmulas (Metallica, Justin Timberlake, Bruce Springsteen, Katy Perry, que o digam), porque confunde o que é importante. Troca-se uma curadoria ousada por nomes mais citados em pesquisas de opinião. E são sempre os mesmos. Uma questão: se uma banda não tem a chance de se apresentar para um público novo, como vai crescer? A massificação das maiores bandas da história está diretamente ligada às formas como elas atingiram públicos que não pertenciam ao nicho próprio delas. O Rock in Rio leva, atualmente, cerca de 100 mil pessoas todos os dias à Cidade do Rock, mas entrega a elas as mesmas bandas nacionais, como Skank, Capital Inicial, e atrações internacionais que já possuem passagens aéreas anuais para o Brasil , compradas até 2025.

Se a curadoria do festival perdeu completamente o controle da situação, o Rock in Rio cresceu como um gigante. Bate de frente com megafestivais como Coachella, Lollapalooza, com boa média de público, noites lotadas e uma internacionalização impensável há 30 ano???s. Atualmente, o Rock in Rio não se contenta com o Rio – assim como nunca vestiu o cabresto de se concentrar apenas no rock and roll. Tornou-se Rock in Rio Lisboa, Rock in Rio Madri e, a mais nova manobra arrojada de Medina e companhia, Rock in Rio Las Vegas. Chega, ainda em 2015, à sexta edição no Rio de Janeiro. E, acredite,provavelmente, todos os ingressos disponíveis vendidos com meses de antecedência – e antes de todas as atrações serem anunciadas. É como um cabo de guerra. De um lado, a popularidade, do outro, a relevância artística. O Rock in Rio se tornou uma visita ao supermercado: busca-se quase sempre os mesmos produtos, mas, ao fim da noite, podemos sair surpreendidos. E exibir, com orgulho, o próprio “Eu Fui”. Feliz da vida. * Repórter do Caderno 2

Repórter do Caderno 2: Pedro Antunes