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Em guerra contra o mosquito, grávidas usam telas para “blindar” casas

Paula Felix

As telas mosquiteiras viraram um artigo do enxoval de gestantes que, assustadas com os casos de vírus zika que podem estar ligados à microcefalia, travam uma batalha contra o Aedes aegypti. Parentes também entraram na briga para proteger as gestantes e empresas registram aumento de até 120% na procura pelo produto.

Ao saber que a filha que mora na França passaria o Natal com a família em Guarulhos, na Grande São Paulo, o engenheiro aposentado Marcos Antonio Rodrigues, de 58 anos, decidiu que colocaria telas nas 15 janelas que tem em casa. Ele começou uma pesquisa e logo descobriu que os preços não estavam acessíveis. Então, Rodrigues decidiu fazer as telas.

“Comecei a pesquisar e fui em uma loja que vende as telas. O proprietário estava montando para a casa dele e indicou onde comprar o alumínio, os encaixes para montar, a borracha para vedar. Fiz orçamentos em uma empresa e em serralheria. Saiu por um terço do valor. Gastei R$ 30 por janela.”

Era começo de dezembro. A contagem regressiva para a chegada da filha, grávida na época de quatro meses, já tinha se iniciado. Mas cada dia que passava trazia mais notícias sobre a possível relação entre a doença transmitida pelo Aedes e os casos de microcefalia. A ceia em família foi cancelada.

“Ela tinha comprado a passagem e tudo estava pronto. Mas, faltando 15 dias para ela chegar, o noticiário estava enfatizando os casos de microcefalia e isso nos deixou malucos. Ligamos e falamos que era melhor ela se informar. Quando tem qualquer risco, é melhor evitar”, diz a dona de casa Kathia do Amaral Velloso Rodrigues, de 57 anos.

A proteção não foi em vão. “De qualquer maneira, a gente já estava pensando em colocar telas nas janelas. Ninguém na nossa família nunca teve dengue, mas temos medo de ter (Síndrome de) Guillain-Barré. Ainda não sabemos as consequências disso”, afirma Kathia.

Por enquanto, a secretária Taíse Tavares Soares, de 30 anos, vai instalar uma tela mosquiteira apenas no quarto da filha, que vai nascer em dois meses. “Não passa nenhum tipo de inseto pela tela. Como estou gestante, quero proteger a mim, minha filha que vai nascer e meu marido. O preço é um pouco salgado, mas estou pensando em segurança.”

Ela, que pagou R$ 320 no produto, conta que pretende colocar em todas as janelas. “Quis colocar uma tela boa. Para me proteger, estou usando manga comprida, calça e tênis. E repelente.”

Crescimento. Gerente de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Sasazaki, Leonardo Arantes disse que houve um “boom do ano passado para cá” nas vendas do produto. “A gente percebe um aumento significativo nos últimos meses. Entre dezembro de 2015 e fevereiro desde ano, tivemos um aumento de 120%. Sempre teve procura, mas, como ocorreu agora, não tínhamos esses números.”

Arantes diz que a marca lançou um modelo com foco em dengue no começo do ano passado e que a empresa tem capacidade de suprir a demanda, mas já mira o futuro. “Tivemos explosão em todos os tipos de telas e queremos lançar outros modelos.”

Na Telhanorte, a lista de produtos oferecidos deve aumentar neste ano. “Percebemos um aumento na procura de várias soluções que previnem e que impeçam a proliferação de mosquitos. Por isso, temos trabalhado para ampliar nosso portfólio de produtos, inclusive das telas mosquiteiras, que dobrou a procura nos últimos anos”, diz Valéria Graton, coordenadora de mercado de esquadrias da empresa. A meta é ter produtos que facilitem a vida dos clientes. “Ofereceremos, a partir de março, telas de fácil instalação em poliéster e velcro, que podem ser utilizadas em qualquer modelo de janela, seguindo apenas a metragem. A ideia é fornecer para os nossos clientes uma solução rápida e eficaz na prevenção dos mosquitos.”

Ricardo Barrieu, diretor de Marketing da Assa Abloy - grupo que controla a Papaiz, diz que o período de dezembro de 2015 e janeiro de 2016 registrou um aumento de 10% nas vendas em relação a dezembro de 2014 e janeiro de 2015. “As buscas por informações, solicitações e material impresso também aumentaram, no mesmo patamar de vendas, em torno de 10%.” O preço varia, em opções para janelas e portas, entre R$ 230 e R$ 850.

O preço ainda impede que a administradora de empresas Gabriela Sette Fashola, de 35 anos, instale as telas em casa. Grávida de sete meses, ela ainda está fazendo orçamentos. “Estão cobrando os olhos da cara por causa da crescente busca. Está R$ 600 na Vila Formosa (bairro na zona leste da capital), R$ 1.200 no Tatuapé (também na zona leste). Queríamos colocar na sala e em dois quartos.”

Gabriela diz que pretende, ao menos, colocar a tela mosquiteira no quarto da primeira filha. “Demorei a realizar o sonho de ter um filho e veio essa pressão de todos os lados. Fico com medo, porque a pressão psicológica é muito forte. Antes, eu me preocupava com óleo para não ter estrias, agora, é com usar repelente.”

Cuidados. Neonatologista e membro da Sociedade Brasileira de Pediatria, Nelson Douglas Ejzenbaum diz que a tela pode ajudar a evitar as picadas, mas que outros cuidados devem ser tomados pelas gestantes. “A tela ajuda a não entrar o mosquito em casa, mas as pessoas devem manter a casa limpa, sem água parada nem lixo.”

O produto também não pode causar um isolamento da grávida, fazendo com que ela deixe de sair para se sentir mais protegida. “Ela não pode viver trancada, principalmente porque deve fazer um bom pré-natal para não ter problemas.”

Sérgio Floriano de Toledo, diretor da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo (Sogesp) alerta que as grávidas devem se informar nesse momento e evitar o pânico. “É fundamental que a gestante receba orientação tranquila e não temerária. A mulher não deve pecar pelo excesso nem pela falta”, diz o especialista, que também é professor de obstetrícia da Faculdade de Ciências Médicas de Santos.

como se proteger

Mulheres que estão grávidas ou planejam engravidar devem tomar cuidado extra para se proteger das picadas do mosquito transmissor do zika da seguinte forma
  • Usando repelentes contra insetos: eles podem ser aplicados à pele exposta ou à roupa e devem conter o DEET (composto químico à base de dietiltoluamida). Os repelentes devem ser utilizados em estrita conformidade com as instruções do rótulo. Eles são seguros para uso de mulheres grávidas
  • Vestindo roupas, de preferência com cores claras, que cubram o corpo quanto possível
  • Usando barreiras físicas, como telas de proteção, e mantendo portas e janelas fechadas
  • Dormindo sob mosquiteiros, especialmente durante o dia, quando os mosquitos Aedes são mais ativos
  • Identificando e eliminando potenciais locais de reprodução do mosquito. Esvaziando, limpando e cobrindo os recipientes que podem conter até mesmo pequenas quantidades de água, como baldes, vasos de flores e pneus
infográfico/estadão

Perguntas e Respostas

Fontes: Marcos Boulos, infectologista e coordenador de controle de doenças da Secretaria de Estado da Saúde; Ministério da Saúde