DIPLOMACIA DE FRANCISCO

PAPA

EM CUBA

 

 

4

Cuba e o Vaticano

 

No dia 19 de setembro de 2015, o papa Francisco fará sua primeira visita à Cuba e a viagem ganha destaque porque o pontífice foi o responsável por mediar a retomada das relações diplomáticas entre a ilha e os EUA.

Em Havana, uma equipe de construção ergueu um altar na Praça da Revolução, coração do poder político na cidade, onde o papa celebrará uma missa campal como fizeram seus antecessores João Paulo II, em 1998, e Bento XVI, em 2012. Do alto do altar, Francisco poderá ver à sua esquerda a icônica imagem de seu compatriota Ernesto Che Guevara e à sua direita o memorial José Martí, herói nacional na independência da ilha perante os espanhóis.

Mas a relação entre Cuba e a Igreja Católica já teve outros episódios históricos:

 

 

Presidentes cubanos

no Vaticano



Novembro de 1996:

Fidel e João Paulo II.

Encontro. O presidente cubano, Fidel Castro, visita o papa João Paulo II no Vaticano e os dois dão um histórico aperto de mãos.   VATICANO

 

Maio de 2015

O presidente de Cuba, Raúl Castro, é recebido no Vaticano pelo papa Francisco. O encontro privado durou quase uma hora, o que é bastante para os padrões diplomáticos do Vaticano. Ao sair, Raúl diz ter agradecido Francisco "pelo que ele fez", referindo-se à intermediação com os EUA. O papa deu a Raúl uma medalha de São Martinho de Tours. "Com seu manto ele cobre os pobres", disse o pontífice ao líder cubano.

 

 

 

Vaticano. Francisco recebe Raúl Castro após anúncio sobre retomada das relações EUA-Cuba.  GREGÓRIO BORGIA / EFE

 

 

 

Papas visitam Cuba

 

 

 

1998

A primeira visita de um papa à Cuba

 

Que Cuba se abra ao mundo e o mundo se abra à Cuba

João Paulo II – a mensagem se tornou famosa

 

 

 

Encontro. João Paulo II em visita a Ilha de Cuba.ALESSANDRO BIANCHI/ REUTERS

 

2012

Bento XVI em Havana

 

Vou saudar com prazer a Sua Excelência, o papa Bento XVI,

como o fiz com João Paulo II

Fidel Castro

 

Saudação. O papa Bento XVI é recebido por Fidel em Havana.OBSERVATORE ROMANO / REUTERS 

 

 

Análise

 

Aproximação de Cuba com Vaticano

marca história de 3 papados


Francisco foi o grande interlocutor, mas não se pode

esquecer do papel de seus predecessores João Paulo II e Bento XVI

 

José Maria Mayrink

 

O papa Francisco foi o grande interlocutor que, por empenho pessoal e capacidade de diálogo, ajudou Cuba e Estados Unidos a reatar relações diplomáticas, mas não se pode esquecer o papel que seus predecessores João Paulo II e Bento XVI desempenharam para se chegar a esse "milagre", após mais de meio século de rompimento. O argentino Jorge Mário Bergoglio, que ganhou esse presente de aniversário no dia 17, quando completou 78 anos, atribuiu à habilidade e à paciência dos diplomatas - incluindo os negociadores da Santa Sé - o mérito da reaproximação entre Havana e Washington.

Essa modéstia não lhe tira o mérito dos telefonemas entre ele e os presidentes Raúl Castro e Barack Obama, para costurar o acordo anunciado na quarta-feira.

Quem abriu caminho para o entendimento foi o polonês João Paulo II. Ele chegou ao pontificado com uma demonstração de simpatia do então presidente Fidel Castro, que, apesar das divergências ideológicas, lhe sugeriu uma escala em Cuba, em sua viagem ao México, para a assembleia dos bispos latino-americanos e do Caribe, em Puebla, em fevereiro de 1979.

O Vaticano descartou o roteiro, com o argumento de que uma visita a Havana teria de ser preparada com mais tempo, sobretudo porque a Igreja não tinha total liberdade para exercer sua ação religiosa em Cuba. A situação melhorou nos anos seguintes, permitindo a João Paulo II realizar uma visita a Havana e mais três cidades cubanas em janeiro de 1998.

Era uma peregrinação pastoral para levar força e solidariedade aos católicos, mas também uma visita de Estado. Fidel Castro recebeu João Paulo II com cortesia e emoção. O papa defendeu os direitos humanos e liberdade de culto religioso, mas também condenou o embargo econômico imposto à ilha pelos Estados Unidos - e o governo cubano lhe ficou grato por essa postura política e humanitária. Na missa celebrada na Praça da Revolução, em Havana, o papa condenou os "sistemas ateístas" e o "neoliberalismo capitalista".

Bento XVI retomou os mesmos temas, ao visitar Santiago de Cuba e Havana, em março de 2012, um ano antes de renunciar ao pontificado. Não usou a palavra embargo, mas reiterou o que o governo de Cuba, já, na época, conduzido por Raúl Castro, esperava (e receava) ouvir. Suas palavras: "Que ninguém se veja impedido de tomar parte nessa tarefa apaixonante (a busca de uma sociedade de largos horizontes, renovada e reconciliada) pela limitação das suas liberdades fundamentais, nem eximido dela por negligência ou carência de recursos materiais; situação esta, que fica agravada quando medidas econômicas restritivas impostas de fora ao País pesam negativamente sobre a população."

João Paulo II e Bento XVI atuaram nos bastidores, em encontros e troca de correspondência, com os governantes de Cuba e dos Estados Unidos, mas foi Francisco quem marcou o tento final. Ele enviou uma carta aos dois presidentes, americano e cubano, "convidando-os a superar os obstáculos existentes entre os seus países e chegar a um acordo", conforme revelou o secretário de Estado da Santa Sé, cardeal Pietro Parolin, em entrevista à Rádio Vaticano. "Tudo isso, certamente, é devido ao fato de o papa Francisco vir daquela região", observou o cardeal.

(Texto publicado originalmente na edição de 21 de dezembro de 2014)

 

 

Capítulo 5

PAPA NOS EUA