O clube

Ivanildo Francisco da Silva tem 57 anos e trabalha com reciclagem. É um orgulhoso morador de uma casinha de alvenaria na Favela do Moinho, no bairro do Bom Retiro. Há três anos, vivia com a mulher e os dois filhos debaixo do Minhocão.

Silva: recuperado e empregado (Tiago Queiroz/ Estadão)

- Foram dois anos terríveis vivendo na rua. Minha situação era complicada: usuário de drogas, crack e tudo o mais, bebia, estava perdido nos vícios. Aí não tinha condições de trabalhar.

Silva diz que somente duas coisas não perdeu: a esperança e o amor pela família.

Um dia foi bater ali naquele portão ao lado do Castelinho da Rua Apa. Pedia ajuda. Descobriu a ONG Clube de Mães do Brasil.

- Conheci o trabalho da Maria Eulina no pior momento de minha vida. Clube de Mães... É de mães mesmo, porque foi uma mãe para mim.

Ele encontrou comida, acolhida e, principalmente, capacitação. Aos poucos, começou a se envolver nos projetos da ONG. Hoje atua em uma das frentes: o reaproveitamento de resíduos. Diz que é com alegria que consegue “comer com o próprio suor”:

- Isso é muito bom. Horrível é ficar pedindo.

A sensibilidade de Maria Eulina para a situação dos sem-teto tem a ver com a própria história de sua vida: antes de conseguir dar a volta por cima, mendigava, passava frio, passava fome, dependia muitas vezes de uma mão acolhedora. Foi quando tinha 20 anos, 46 anos atrás, que ela, “debaixo de uma ponte”, pensou pela primeira vez que não só sairia daquela situação como, um dia, faria algo por outros marginalizados sociais.

Reciclagem e costura: no cerne da ONG (Tiago Queiroz/ Estadão)

O Clube de Mães do Brasil foi criado em 1993.

- Tem esse nome porque uma mãe, por pior que esteja a situação do filho, jamais deseja que ele se torne um bandido, um traficante, um assassino. Uma mãe sempre deseja o melhor para seu filho.

Quando conseguiu a concessão da União para utilizar o Castelinho da Rua Apa, em 1996, pensou que o espaço deveria ser utilizado por aqueles que não têm teto. Se a histórica construção estava em ruínas, havia ao lado uma garagem. De uma hora para outra, vieram todos – sem-teto, carroceiros e até cachorros de rua.

- Chegamos a ter 164 pessoas alojadas aqui – diz ela, apontando para o chão.

A situação foi melhorando à medida que a própria ONG se organizava. Houve uma parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai): 5 mil moradores de rua capacitados entre 1999 e 2000. Houve o início de projetos de reciclagem e costura, em que resíduos de grandes empresas são transformados em bolsas, sacolas, pastas, aventais. Houve o tombamento do Castelinho – ao mesmo tempo que nunca deixou de haver o sonho de recuperá-lo, retorná-lo à vida.

A história da instituição (Clube de Mães do Brasil/ Divulgação)

Agora, Maria Eulina consegue ver da janela de sua sala o imponente imóvel de sua vida quase pronto. Mas, entre uma conta a pagar e outra – diz que a ONG é mantida basicamente por doações; além do arrecadado com os próprios projetos, é claro –, sabe que o trabalho não estará concluído.

O Castelinho da Rua Apa reaberto representa um recomeço para o próprio Clube de Mães. O espaço vai ter condições de abrigar melhor algumas atividades da instituição. Ao mesmo tempo, espera Maria Eulina, a partir de locações poderá se tornar uma fonte de renda para os futuros projetos.

Maria Eulina: das ruas para o castelo (Tiago Queiroz/ Estadão)

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