Maioria dos deputados federais se elegeu com 50% do teto para gastos de campanha
Mediana das despesas de 390 parlamentares eleitos em 2014 foi de R$ 1,3 milhão, distante do limite atual de R$ 2,5 milhões
Os gastos de campanha da maioria dos deputados federais eleitos em 2014 somaram pouco mais de 50% do teto recém-aprovado pelo Congresso no projeto de reforma política. Segundo levantamento feito pelo Estado com base nas despesas declaradas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), atualizadas pelo IPCA, a mediana dos valores gastos pelos candidatos eleitos foi de R$ 1,3 milhão. O novo teto, de R$ 2,5 milhões, não afetaria 390 dos 513 deputados da atual legislatura.
+ Veja a relação de gastos declarados de todos os deputados eleitos em 2014
Para o relator do projeto, deputado Vicente Cândido (PT-SP), o valor máximo permitido deveria ser mais alto. “No caso das eleições proporcionais (deputados estaduais, federais e vereadores), o teto não é tão significativo porque adotamos o gasto médio dos eleitos no Brasil afora”, disse o parlamentar. O levantamento eliminou os valores extremos – o mais alto e o mais baixo, que podem distorcer a média – declarados ao TSE para obter um dado mais próximo do equilíbrio.
Especialista em direito eleitoral, Gabriela Rollemberg afirma que, na prática, esse teto não terá grande efeito. “Acabaram defendendo que o limite ficasse mais alto mesmo, sem muita preocupação com o critério proporcional”, diz a advogada, que também é Vice-Presidente da Comissão Especial de Direito Eleitoral do Conselho Federal da OAB. Com base em 2014, 123 deputados teriam ultrapassado o teto. O grande campeão de gastos de campanha, Arlindo Chinaglia (PT-SP), gastou R$ 10,3 milhões – R$ 2 milhões a mais do que o segundo colocado, Marco Antônio Cabral (PMDB-RJ).
O teto de gastos se tornou uniforme em todo o Brasil após um acordo ser costurado na Câmara para que o relatório da reforma política fosse aprovado mais rapidamente. “Minha primeira proposta de relatório era por região, mas os gastos seriam muito parecidos. Iríamos estabelecer que no Norte do País (o teto) seria R$ 2 milhões e, no Sudeste, R$ 2,5 milhões. Tudo muito parecido, não ia ter muita discrepância”, diz o relator.
De acordo com os valores gastos em 2014, os números revelam uma realidade diferente: a mediana entre as regiões variou até 61%. O levantamento do Estado mostra que enquanto os eleitos da região Norte gastaram cerca de R$ 768 mil, no Centro-Oeste as despesas alcançaram quase R$ 2 milhões. Segundo Cândido, o que impulsiona os gastos dos políticos no Centro-Oeste, região com as campanhas mais caras, é a renda proporcionada pelo agronegócio.
Para Alberto Carlos Almeida, diretor do InteliGov e do Instituto Análise, o que torna a corrida eleitoral cara é remunerar toda a pirâmide de apoio, que vai de prefeitos e vereadores a líderes de bairro. “Você tem de ter uma máquina política que te sustente e essa máquina significa necessariamente pessoal e recurso financeiro. Não é o marketing que torna a campanha cara, e sim remunerar toda essa pirâmide gigantesca.”
E agora?
Em 2018, Gabriela Rollemberg acredita que apenas os candidatos com maior poder de autofinanciamento, como celebridades e empresários, vão se aproximar do limite. Para os demais, a situação não deve mudar muito. “Não faz diferença porque eles nem conseguem chegar perto disso, eles não têm esse dinheiro. E os partidos também não vão disponibilizar esse dinheiro.”
O Estado procurou todos as siglas com parlamentares na Câmara para saber o que muda nos gastos após a reforma política recém-aprovada. A maioria acha difícil prever quanto vai custar uma campanha em 2018. Para o PSB, “não há parâmetro” para prever quanto vai ser usado, uma vez que as eleições anteriores ocorreram sob regras diferentes. Mas os valores de 2014 podem ser uma referência para o ano que vem, na avaliação do PTB e do Democratas (DEM). “A alteração do cenário deve baratear as campanhas, e o equilíbrio na utilização de recursos será maior. Por isso, os números de 2018 poderão ser próximos com os da eleição anterior”, avalia o PTB.
Para PSB, PRP, Rede e PSOL, a mudança nas regras indica que 2018 será diferente dos pleitos anteriores. A partir de 15 de maio do ano que vem, os candidatos poderão fazer uma arrecadação prévia pela internet. Isso fará com que os eles “percam menos tempo durante a campanha correndo atrás de doadores e ganhem mais tempo para conversar com os eleitores”, prevê a Rede. A sigla também destaca a possibilidade de arrecadação por meio de financiamento coletivo pela internet, recurso já permitido em eleições anteriores que pode ganhar força na próxima campanha.
Diante das novidades, alguns partidos vão orientar seus candidatos sobre os gastos de campanha. O Democratas, por exemplo, disse que fará um manual de uso de recursos. “Existe uma normatização de aplicação de recursos, só que nós vamos passar um pente-fino nisso, uma visão mais acurada do ponto de vista jurídico porque os recursos agora vão ser exclusivamente públicos”, disse o senador Agripino Maia (DEM-RN), que preside a sigla.
O PSOL não pretende mudar seu comportamento para 2018. “Nós não compramos votos de nenhuma forma, não fazemos gastos fora da lei e priorizamos a participação da militância nas campanhas”, diz o partido. No PSB, a orientação aos candidatos é simples: “Só o que é legal. Não crie problemas para sua vida agora e no futuro”, recomenda o presidente do partido em São Paulo e vice-governador Márcio França.
Contrário ao autofinanciamento ilimitado, o PSB ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando esse tipo de custeio. Segundo a legenda, “o fundo é pouco para todos os candidatos do Brasil”, e só funcionará se a pessoa for “rica”, já que pode financiar a si própria.
Os demais partidos não responderam, ou informaram que aguardam regulamentação do TSE ou convenção nacional.
Colaboraram Rubens Anater, Igor Truz e Ricardo Magatti