Conteúdo eleitoral patrocinado vai marcar as campanhas nas redes

Pela primeira vez, os candidatos vão poder pagar para o Facebook publicar anúncios na sua timeline - querendo você ou não

Por Marina Dayrell

A campanha eleitoral vai invadir seu Facebook no ano que vem. A eleição será a primeira a permitir que candidatos paguem para publicar propaganda na sua timeline. E eles não vão perder essa oportunidade. “Se a pessoa estiver no alvo, ela vai receber esse tipo de conteúdo, mesmo quando não quiser seguir um político ou receber notícias sobre política”, afirma o diretor de Marketing Digital Renan Caixeiro.

Os partidos não informam quanto devem investir nessa modalidade em  2018, mas é certo que a palavra “Patrocinado”, acompanhando mensagens políticas, vai frequentar as redes sociais. Como a nova Lei Eleitoral ainda não foi regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por enquanto não há limite para gastos com posts patrocinados. O total só não pode ultrapassar o teto máximo para cada tipo de cargo.

Foto: Leonardo Foureaux/Divulgação

Para definir o público-alvo de determinado candidato, o Facebook e as equipes de marketing vão utilizar informações que os próprios usuários fornecem a partir de seu comportamento na internet. O grande trunfo dos políticos será saber utilizar essas informações para definir suas estratégias de discursos.As redes sociais acumularam durante muito tempo os dados pessoais (dos usuários), que é o petróleo da economia informacional, é o que sustenta tudo isso”, diz o cientista político Sérgio Amadeu, da Universidade Federal do ABC (UFABC), que é crítico da mudança. “E eles permitem fazer perfis de pessoas e criar amostras dos públicos calculados.”

Foto: Adriana Vichi/Divulgação

Em 2016, 108 milhões de brasileiros acessaram a internet, segundo o Comitê Gestor da Internet (CGI). O crescimento da audiência na rede foi de 26% em comparação com 2013, ano que antecedeu a eleição mais recente para presidente da República, senadores, deputados federais e estaduais e governadores. “É impossível imaginar que não serão usadas informações que vêm da internet, do mobile e do ambiente de rede, tanto para tirar conclusões e fazer pesquisas quanto para o processo de convencimento (do eleitor)”, afirma o fundador da consultoria Ideia Big Data, Mauricio Moura, também pesquisador da Universidade George Washington, nos Estados Unidos.

O eleitor é o principal prejudicado com os anúncios patrocinados na campanha, na opinião do cientista político Amadeu. “Na disputa democrática, você precisa ter o direito de ver as postagens de quem quiser”, afirma. “Mas as plataformas só colocam nas timelines o que foi indicado pelo algoritmo e o que foi patrocinado.”

Já Moura é menos pessimista e vê possíveis benefícios. “Em teoria, vai chegar conteúdo mais específico para o eleitor, se as campanhas trabalharem direito”, defende o pesquisador, que atua no segmento de big data desde 2011.

Foto: Debora de Morais Matheus/Divulgação

O público perfeito

Para Renan Caixeiro, da agência de mídias sociais E-dialog, essa é a grande oportunidade do marketing político: criar conteúdo adequado para cada tipo de eleitor. Ao decidir patrocinar um post no Facebook, é possível escolher especificamente qual público se pretende alcançar. Assim, o perfil de um candidato pode ir além da política e incluir entre a audiência até quem torce para o mesmo time de futebol que ele ou moradores de uma área específica da cidade. “Se o candidato fez alguma obra na região X, é possível segmentar esse post para esse local, até para que ele não seja atacado em outros lugares”, explica o gerente de marketing José Alexandre Abramo, da consultoria Non Stop.

Foto: Vinicius Cruz/Divulgação

O recurso, afirma o cientista político Amadeu, pode ser ainda mais vantajoso para as campanhas proporcionais, que buscam votos em determinados nichos, como no caso de deputados federais e estaduais. “Não é preciso atingir todos os eleitores do Estado. Você vai fazer uma campanha sistemática pelo Facebook em torno de um segmento que lhe interessa, de pessoas que são criadas ali e que estavam sendo analisadas pelos seus comportamentos na plataforma”.

 

Quanto vale?

O patrocínio de posts é um recurso novo nas campanhas eleitorais e ainda não existe padrão para o investimento. Como os políticos poderão disputar a mesma audiência, esse tipo de publicidade pode não sair barato. No mundo das redes sociais, se muitos anunciantes querem atingir o mesmo público, o anúncio tende a subir de preço.  “O Facebook pede que você gaste, no mínimo, R$ 1,00 por dia”, diz o especialista Caixeiro. “Em uma cidade pequena, usar R$ 20 pode representar muita coisa. Mas, dependendo da segmentação, R$ 20 mil não são nada”.

Quando comparado ao investimento em mídias tradicionalmente usadas nas campanhas eleitorais, o custo dos posts patrocinados pode sair mais barato, diz o publicitário Moriael Paiva, vice-presidente de Digital da Ideia Big Data. “Para atingir 200 mil pessoas em Brasília ou em São Paulo, um impulsionamento pode exigir investimento de R$ 1 mil. Se você comparar o mesmo impacto em uma mídia tradicional, você certamente estaria gastando 30 ou 40 vezes mais.”

Foto: Caroline Schüler/Divulgação

Mr. Big Data

O principal combustível para encontrar o público-alvo e patrocinar posts é o Big Data. Famoso depois da eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, o termo é usado para descrever um grande volume de dados que podem ser obtidos a partir de pesquisas, como o censo do IBGE, e de comportamentos na internet, como as informações que o Facebook e o Google coletam.

Ao longo da campanha para a presidência americana, a equipe de Trump gastou cerca de US$ 70 milhões (cerca de R$ 230 milhões) para exibir entre 40 mil e 50 mil posts patrocinados por dia. Durante o terceiro debate, a página chegou à marca de 175 mil anúncios. Segundo  o estrategista e consultor político italiano Lorenzo Pregliasco, um dos modelos de base das campanhas digitais de sucesso é experimentar diferentes mensagens, conteúdos, formatos e vídeos para escolher a variante ideal na qual investir dinheiro nos anúncios.

Além de planejar posts para levar seu público-alvo às urnas, a campanha de Trump criou anúncios para tentar diminuir os votos dos possíveis eleitores de sua oponente, Hillary Clinton. “Eles mandavam mensagens para minorias apelando para os valores que eram mais importantes para elas, mostrando como, segundo esses valores, faria sentido elas não irem votar”, lembra o professor do Departamento de Informática da PUC-Rio, Daniel Schwabe.

Após as denúncias de que perfis e páginas russas compraram posts patrocinados no Facebook para influenciar o resultado da última eleição americana, a empresa de Mark Zuckerberg se comprometeu a buscar mais transparência em seus serviços pagos e já estaria testando novas funcionalidades. Entre elas, ver todos os anúncios que a página publicou, o quanto foi pago, quem pagou por eles e o perfil das pessoas que viram os posts. “Estamos eliminando contas falsas e cooperando com autoridades eleitorais sobre temas relacionados à segurança online. Esperamos tomar medidas também no Brasil antes das eleições de 2018”, afirmou o Facebook ao Estado.

Colaboraram Alessandra Monnerat, Érika Motoda, Luiz Fernando Teixeira, Matheus Riga e Matteo Bianucci