Após dois anos de retração nos gastos com turismo, os brasileiros estão voltando a sonhar em fazer as malas e viajar. Entre todas as faixas de idade, quem mais deseja fugir um pouco da rotina são homens e mulheres com mais de 60 anos. Segundo pesquisa de sondagem ao consumidor do Ministério do Turismo, realizada em maio, a intenção deste segmento de viajar em até seis meses subiu de 21,7% para 27,5% em um ano. O Nordeste e a Serra Gaúcha são os destinos nacionais mais procurados, de acordo com a Associação Brasileira de Agências de Viagens (ABAV). Os países que mais devem atrair o grupo são Portugal e Argentina.
O coordenador-geral de Produtos Turísticos do Ministério, Cristiano Borges, confirma o fascínio do brasileiro pelas duas localidades nacionais. Se na cidade da Serra Gaúcha os viajantes procuram visitas a vinícolas e atrações românticas como o passeio no Lago Negro, no Nordeste a intenção é aproveitar o clima quente nas praias. “Gramado é uma cidade que está no imaginário do brasileiro, principalmente do turista nordestino, que deseja ter o oposto daquilo que ele tem. No Sul, vemos uma procura por praias do Nordeste”, explica.
Dentre os possíveis viajantes nos próximos meses, 77% pretendem se deslocar em território brasileiro. A região mais cobiçada é a Nordeste, preferida por 51% dos que querem fazer um passeio nacional. Tania Barreto, de 62 anos, escolheu Maceió, em Alagoas, para uma semana de lazer no fim de junho. Acompanhada do marido e de um casal que sempre viaja com os dois, a agente administrativa conta que também visitaram outras duas cidades do estado, Coruripe e Piaçabuçu, indo até a Foz do Rio São Francisco. “Gosto de passear no Nordeste por causa da beleza natural e do clima muito agradável.”
Segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), a demanda por voos domésticos cresceu 2,2% em maio na comparação com igual período do ano passado. Foi a terceira alta seguida após 19 meses consecutivos em queda. Ao todo, 7,1 milhões de passageiros voaram pelo Brasil no mês.
Moradora de São Paulo, Ivone Davico, de 72, já comprou passagem para Gramado, onde vai acompanhar, entre novembro e dezembro, as atrações do Natal Luz, evento que ocorre nos últimos meses do ano na cidade. A aposentada é também agente de viagem e organiza os passeios com um grupo de amigos todos os anos. “Fomos ano passado e adoramos. Recomendo para todo mundo agora”, conta Ivone.
A Serra Gaúcha atrai todos os públicos e em diversas épocas do ano. O casal carioca Ricardo Pereira, de 59, e Ângela Capone, de 56, foi pela segunda vez para a cidade entre março e abril deste ano. O bancário aposentado participou do torneio nacional da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), que ocorreu em Gramado, mas conta que os dois aproveitaram o passeio para visitar os pontos turísticos novamente. “Não é uma cidade barata, mas vale muito a pena conhecer. Planejando com antecedência é um destino imperdível no Brasil.”
Francieli Fábris e Renan Vendramin, de 22 e 24 anos, respectivamente, escolheram a cidade para comemorar os sete anos de namoro e o próprio Dia dos Namorados em junho do ano passado. Contagiado pelo clima romântico, Renan resolveu pedir Fran em casamento. “Foi muito emocionante, eu não esperava. Até chorei. Era algo que já vínhamos conversando, mas ele sempre dizia que seria mais pra frente e me surpreendeu na viagem.”
Outro mapeamento do Ministério do Turismo, realizado em março deste ano, mostra que o Nordeste e cidades da região estão entre os destinos mais citados por brasileiros de todas as idades. Os mais lembrados são Fortaleza, Salvador, Natal e Fernando de Noronha. A paulista Rosi Mendes, de 47, por exemplo, passou mais um mês viajando pelo litoral nordestino em janeiro do ano passado, com um grupo de 13 pessoas. Visitou cidades de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e terminou o passeio em Fortaleza, no Ceará. “As pessoas têm de conhecer primeiro o Brasil antes de ir para o exterior. Temos uma riqueza muito grande por aqui”, aconselha a funcionária pública.
Já a carioca Aline de Andrade, formada em Estatística, escolheu Fernando de Noronha para uma semana de descanso. Ou melhor, de muita diversão. Ela conta que percorreu a ilha de bugre, foi a show de forró e viu golfinhos ao passear de barco. “A Baía do Sancho (praia famosa da região) é um dos locais mais bonitos que já vi. Não há nada em Noronha que não te deixe encantado.”
Viagens internacionais. As despesas de brasileiros no exterior devem voltar a subir depois de dois anos seguidos de quedas, de acordo com dados do Banco Central. De 2014 a 2016, os gastos internacionais caíram 43%, de US$ 25,6 bilhões para US$ 14,5 bilhões. Nos primeiros cinco meses de 2017, porém, já registraram alta de 41% em relação a igual período no ano anterior.
Inês Strano, de 88, foi para Portugal entre janeiro e fevereiro. Nascida nos Açores, na Ilha de São Miguel, ela veio ainda criança para São Paulo. Em sua viagem, aproveitou para passear por sua terra natal, mas ficou hospedada na casa da neta Carolina, de 39, que mora em Lisboa, onde trabalha em um laboratório de pesquisa. “Está muito linda minha terra. Lá tem um vulcão que está sempre soltando fumaça. Isso chama a atenção dos turistas.”
Já a carioca Wilma da Rocha, de 76, viajou para Buenos Aires com a filha Natalia Salles, de 53, em janeiro. A professora aposentada afirma que duas atrações imperdíveis do local são os shows de tango e o passeio pelo Caminito, rua famosa por suas casas coloridas e um dos principais pontos turísticos do país. “Estou sempre juntando dinheiro para viajar. É a coisa que mais gosto de fazer”, conta Wilma, que também já esteve em Portugal, na França, no México e no Panamá.
Segundo estimativa da Organização Mundial do Turismo (OMT) e Ministério do Turismo, os países que mais atraíram brasileiros em 2015 foram os Estados Unidos (2,2 milhões de pessoas) e Argentina (mais de 1 milhão), seguidos por França e Portugal (mais de 500 mil cada um) e Chile (455 mil).
A mineira Rosely Madureira, de 57, passou o Réveillon de 2016 em Nova York com a filha Maria Clara, na época com 13. “Escolhemos por ser um sonho passar o ano novo na Times Square. Visitamos museus, parques e a Quinta Avenida. Só não compramos muito por causa do dólar alto”, conta a secretária-executiva, que foi acompanhada de uma amiga que também levou o filho.
Já a dentista Renata Augone, de 52, realizou o sonho de visitar a Europa em setembro do ano passado. “Fomos de carro de Portugal para Espanha. Depois voltamos e pegamos um avião e para Londres. Leticia Gonzaga, de 22, por sua vez, preferiu a América do Sul em janeiro deste ano. Durante quase um mês, a estudante de administração fez um “mochilão” com mais cinco amigas por Chile, Bolívia, Peru e Colômbia. “Além de ter uma experiência diferente, nossa motivação foi conhecer lugares próximos do Brasil.”
Embora as passagens para fora do Brasil sejam mais caras, o professor de Finanças do Insper Ricardo Humberto Rocha, argumenta que o gasto em passeios regionais e interestaduais em feriados muitas vezes correspondem a uma viagem internacional. “Viajar para a Europa, Estados Unidos e Japão, por exemplo, traz um aprendizado para a família, uma experiência nova. E viajar pela América Latina é mais fácil com planejamento”, afirma.
O professor acredita que é possível se organizar para viagens de longa distância, mesmo em momentos de turbulência econômica no País. “Sem contar com a situação extrema, daqueles que perderam o emprego, o segredo é planejamento. A organização de uma viagem (para o exterior) deve começar um ano antes.”