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Como hackear casas com um arduíno

Por diversão, makers hackeiam eletrônicos e aliam economia e praticidade; casa que aprende com hábitos do morador é tendência para o futuro

Mariana Diegas e Raphael Hernandes

Uma plaquinha azul do tamanho de um cartão de crédito, que não chega a custar R$ 100, faz a luz acender sozinha na casa do estudante Jonatas França e garante água na medida certa para as plantas da analista de desenvolvimento Tatiane Fernandes. Os makers dizem que hackearam suas casas com o microcontrolador por diversão, tudo pelo prazer de aprender, criar e compartilhar. Mas os benefícios são claros: economia e praticidade.

Tatiane, de 35 anos, fez o seu regador inteligente usando arduíno, uma bomba d’água e um sensor, montado com dois pregos ligados por um fio metálico. Quando a corrente elétrica está baixa, é sinal de que há pouca água no vaso. O arduíno, então, aciona a bomba que rega a planta. Tatiane teve a ideia e partiu para a internet em busca de projetos parecidos. “O movimento maker é isso: colocar a mão na massa e testar.”

O último objeto hackeado pela analista foi um abajur que acende quando alguém bate palmas, feito com um arduíno acoplado a um microfone. O interesse por esse tipo de projeto despertou em Tatiane, que se considera uma “fuçadora”, o desejo de ensinar. Hoje, ela trabalha com a placa na Experimentoria, um centro de aprendizado maker em Pinheiros, zona oeste de São Paulo.

Embora ainda seja um ilustre desconhecido para muitos, o arduíno é considerado item ideal para quem quer começar a fazer projetos maker de automação. Segundo o professor de Engenharia Eletrônica da Universidade de Brasília Marcelino Monteiro, a vantagem do microcontrolador é o sistema aberto, que permite a personalização do código programado. “É uma solução mais doméstica, mais pessoal. Mais maker.”

O baixo custo do arduíno também facilita as experimentações. Por R$ 450, Jonatas França, de 21, automatizou várias partes de sua casa, em Jaboatão dos Guararapes, região metropolitana do Recife. “Sempre gostei de trabalhar com microcontroladores. Comecei brincando de acionar LEDs pelo celular e fui aprendendo aos poucos”, diz o estudante de Engenharia Elétrica. Ele conectou todas as lâmpadas ao wi-fi - e agora controla a iluminação por meio de um aplicativo de celular, desenvolvido por ele mesmo. O mesmo ocorreu com o som e a TV, transformando o smartphone em um controle remoto.

O ar-condicionado do quarto recebeu um sensor de temperatura: o aparelho só refrigera quando o ambiente ultrapassa os 24 graus, garantindo economia de R$ 150 por mês na conta de luz. No terraço, o maker instalou sensores de luminosidade e movimento, que fazem as luzes se acenderem quando anoitece ou alguém passa por lá. Tudo isso pensando na segurança da casa.

Mesmo motivo que fez o técnico de telecomunicações Leandro Lopes, de 32, montar com o arduíno um sistema para comandar o portão de sua casa, em Goiânia, pelo smartphone. Parte do conhecimento para isso veio de tutoriais do YouTube. "Foi muito útil no dia em que parentes vieram me visitar e eu não estava em casa”, conta. “Abri o portão pelo celular e eles me esperaram em segurança.”

Essa possibilidade de controlar a casa pelo celular é uma das grandes vantagens do arduíno, segundo a professora de Engenharia Eletrônica da Universidade Federal de Minas Gerais Carmela Polito Braga. Ela ressalta, porém, que o microcontrolador não tem potência para alimentar cargas muito grandes. “Tem de tomar cuidado para não pôr as pessoas ou o equipamento em risco.”

Futuro

O doutor em Engenharia Elétrica e especialista em automação residencial inteligente Flavio Tonidandel diz que a tendência é as casas aprenderem com os hábitos dos moradores. “Quem não gosta de acender a luz quando está chovendo terá problemas com o sensor de presença, que liga a lâmpada quer o usuário queira ou não”, diz. Um aluno de Tonidandel criou um protótipo que resolve o problema: se o morador apagar a luz quando ela ligar com o sensor, com o tempo, o sistema perceberá o novo padrão e deixará de acendê-la em dias de chuva.

O professor acredita que, em longo prazo, esse será um padrão mundial. “Há estudos avançados sobre a moradia aprender com o usuário, em vez de ser programada por ele. As casas serão integradas aos carros e às próprias cidades, que serão inteligentes.”