YouTube: o Fab Lab dos mais velhos

Fora do perfil tradicional dos makers, pessoas com mais de 30 anos também compartilham conhecimento

Guilherme Mendes

Ivair Puerta ensinou mais de 300 mil pessoas a trocar a resistência do chuveiro em um tutorial no YouTube. Gina Pafiadache virou fenômeno ao mostrar no site técnicas para pintar livros de colorir - seus vídeos já foram vistos quase 2 milhões de vezes. Mesmo longe do perfil tradicional dos makers, o técnico em eletrônica de 47 anos e a artista plástica de 61 dividem suas habilidades pela internet, trocando o faça você mesmo pelas inúmeras possibilidades do “faça com os outros”.

O próprio Puerta conta que seus primeiros vídeos, ainda no fim de 2010, não eram lá muito profissionais - as gravações sequer tinham som. “Comecei com poucos recursos técnicos, apenas uma câmera VHS e nenhum conhecimento em cinematografia.” Mas mesmo os vídeos mais simples - como o que ensina a montar um arco de balões para festas infantis - somam mais de 5 milhões de visualizações, 14 vezes a população de Piracicaba, onde o técnico mora.

Em seu ateliê de Santa Maria, a gaúcha Gina passou pelo mesmo processo. A diferença de qualidade entre seus vídeos de 2008, quando começou a gravar, e os atuais é tanta que ela decidiu criar outro canal em 2014. A temática também mudou, até por pedidos dos seus seguidores. Se no início Gina postava dicas para pintar usando a técnica alemã do bauernmalerei, agora o que mais chama a atenção são os vídeos sobre livros de colorir. “A ideia sempre foi a de ajudar as pessoas que não têm acesso a cursos de pintura, seja por questões financeiras, geográficas ou qualquer outro motivo”, explica.

Com a habilidade de artista plástica, ela cria efeitos de luz e volume nas imagens, levando a pintura a outro patamar. “Lápis claros servem para dar a sensação de luminosidade”, diz Gina em um dos tutoriais. “Podemos harmonizar com lápis branco para dar efeito de luz.”

Essa conexão entre os autores dos vídeos e seus espectadores é ressaltada pela professora da Fapcom, Nadia Lebedev. “Independente do tipo de informação, do tipo de dados e de vídeo, existe a possibilidade de estar em compasso com os seus seguidores.” Outra vantagem o fato de o YouTube facilitar o acesso a informações que já existiam. “Os tutoriais explicam melhor que o livro ou o manual. É um conhecimento que vai se apresentando de forma mais simples.”

Quer uma prova? Imagine ter de aprender do zero as sutilezas da culinária francesa contando apenas com livros de receitas. As chances de a Tarte Tatin desandar - e você perder as maçãs - seriam bem razoáveis. Com os tutoriais de Uiara Araújo, 32, fazer a torta criada pelas irmãs Tatin talvez tenha ficado um pouco mais fácil. Morando em Paris desde 2011, a jornalista começou com um site, no qual contava suas experiências gastronômicas e turísticas.

O formato evoluiu para um blog em vídeo, o Le Plat du Jour. “Criei para suprir uma necessidade pessoal”, diz Uiara. “Como não estudei gastronomia, queria saber o que era cada coisa, cada corte, cada técnica, qual era a história de tal prato, quem inventou, porque leva tal nome.” As gravações já foram vistas quase 900 mil vezes desde 2012 e incluem da Tarte Tatin aos tuiles, biscoitos finos com amêndoas.

Embora tenham surgido da vontade de ensinar, e não para fins comerciais, esses tutoriais acabam virando fonte de renda. Nada que mude o espírito maker em nenhum deles. “O lado econômico sempre ficou em segundo plano”, explica Ivair. “Considero mais importante o meu prazer pessoal em fazer aquilo que gosto.”