Idealizado na Convenção de Itu, deu prejuízo por dois anos, mas já tinha em 1888 a maior tiragem da cidade
Uma superstição rondava o jornalismo nas últimas décadas do século 19: a de que publicações com problemas na primeira tiragem teriam vida longa. A Província de São Paulo, em 4 de janeiro de 1875, serviu para confirmar a crença.
Programado para circular em 1.º de janeiro, uma sexta-feira, o jornal mais antigo de São Paulo hoje em circulação só conseguiu tirar sua primeira edição três dias depois por problemas na impressora, comprada de segunda mão no Rio de Janeiro e manuseada por negros libertos assalariados.
De oposição ao regime imperial, foi fundado por 21 republicanos convencidos da necessidade de uma voz na imprensa para difundir ideias de emancipação política. Muitos eram também abolicionistas.
D. Pedro II reinava autocraticamente à época, assistido por um parlamento dividido entre conservadores e liberais de mínimas diferenças ideológicas. Mas cresciam as pressões na sociedade por um regime republicano e pela abolição da escravatura, base do poder imperial.
Por essa época também se intensificou em São Paulo o cultivo do café. Introduzido na segunda metade do século 18, inicialmente em quintais para consumo doméstico, começou a ser cultivado em larga escala no Vale do Paraíba paulista, em decorrência da expansão da produção iniciada no Rio.
Estimulado pelo alto preço do escravo a partir de 1850, o aumento de fugas e rebeliões e a maior produtividade do sistema de colonato, difundido pela província com a contratação de imigrantes, sobretudo italianos, aos poucos começou-se a se alastrar o emprego de parcerias e trabalho assalariado.
A abertura de frentes de plantio no Oeste Paulista não poderia mais ser atendida por uma mão de obra cada vez mais escassa, obtida no Nordeste ou por contrabando. Assim, segundo Raymundo Faoro, prosperaria em São Paulo uma fração de cafeicultores que “aceitava inovações, abandonava velhas técnicas e normas, alijava o trabalho escravo, esposava relações capitalistas de produção e ansiava por reformas”.
Antes mesmo da proibição inglesa do tráfico negreiro, organizava-se no interior paulista a primeira experiência de trabalho livre em um grande cafezal. Em 1847, em sua fazenda de Ibicaba, Nicolau de Campos Vergueiro implantou um sistema de parceria com portugueses, suíços e alemães.
Em 1873, na Convenção Republicana de Itu, congresso que deu origem ao Partido Republicano Paulista (PRP), dos 133 participantes, 78 eram fazendeiros. Uma das propostas da convenção foi fundar um jornal de propaganda republicana. Coube a Manoel Ferraz de Campos Salles – que seria presidente da República em 1898 – e Américo Brasiliense de Almeida Mello, advogado de São Paulo, arregimentarem cotistas para viabilizar o projeto. Conseguiram 19 adesões. Na capa da primeira edição de A Província de São Paulo, aparecem os nomes dos 21 fundadores. Deles, dez se declararam fazendeiros, cinco advogados, quatro capitalistas, um negociante e um jornalista. Dois dos cotistas tinham participação maior e eram os “redactores”: Américo de Campos e Francisco Rangel Pestana. O responsável pela administração, José Maria Lisboa, não era cotista.
Os primeiros anos do jornal também seriam acidentados. Os dois primeiros deram prejuízo e no terceiro receitas e despesas empataram. Para piorar, parte de seu dinheiro estava na Casa Bancária Mauá & Cia., que foi a falência. Mesmo assim, o diário prosseguiu. Em 1876, já havia mudado da Rua do Palácio (hoje Rua do Tesouro) para a Rua da Imperatriz (15 de Novembro).
Em 1879, 1882 e 1884, o jornal passou por três alterações no controle societário. Em 1885, enfrentou grave crise. Alberto Salles, irmão de Campos Salles, havia entrado na sociedade no ano anterior, quando saíram Américo de Campos e José Maria Lisboa. Ao deflagrar campanha antilusitana, Salles desagradou profundamente aos influentes comerciantes portugueses de São Paulo, que retiraram seus anúncios. A crise só foi superada com a saída de Salles e a crescente atuação de um talentoso redator vindo de Campinas.
Progresso. Filho de portugueses, Julio Mesquita trouxe a comunidade comercial portuguesa de volta. E passou a se destacar tanto como redator quanto como gestor. Iniciava-se uma das mais brilhantes carreiras do jornalismo brasileiro. Em 1888, Rangel Pestana confiou a ele a gerência. Nesse momento, o jornal já tinha a maior tiragem da capital, com 4 mil exemplares – 3.210 deles de assinantes. Em 1890, já com o nome O Estado de S. Paulo, alcançou 7 mil exemplares. Em 1902, Julio Mesquita tornou-se o único dono.