Sob o título Incerteza Viva, nova edição do evento apresenta obras de 81 artistas e coletivos. A exposição acontece no Pavilhão da Bienal e realiza criações no Parque do Ibirapuera
Textos: Camila Molina e Maria Hirszman
Entrada Franca
Av. Pedro Álvares Cabral, s/nº, Parque do Ibirapuera, Portão 3
De 07 de setembro a 11 de dezembro, 2016
l 3ª, 4ª, 6ª, domingo e feriados:
9h às 19h (entrada até 18h)
Projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, o Pavilhão Ciccillo Matarazzo sedia, desde 1957, as edições da Bienal de São Paulo. O edifício, tombado pelo Patrimônio Histórico, é formado por três pavimentos e tem área total de 25 mil m². Fica localizado no Parque do Ibirapuera
Artistas e temas da exposição
Cada obra produzida ou selecionada para a 32.ª Bienal conta uma história, debruça-se sobre uma realidade ou constrói uma utopia particular. Os caminhos adotados, em termos de linguagens e de aspecto da vida e da sociedade enfatizado, são multifacetados. Destruição ambiental, resgate da espiritualidade, construção de narrativas, militância política, dominação colonial, guerra e imigração, encantamento dos sentidos estão entre as investigações.Veja a distribuição geográfica dos trabalhos dos 81 artistas e grupos convidados da 32ª Bienal de São paulo
Em uma seleção que ilumina em vários momentos uma íntima
relação entre sociedade e arte, tenta identificar e trazer à tona experiências ou registros de resistência cultural, não poderiam faltar aqueles que lidam com a ideia de coletivismo, de trabalho comunitário e identidade cultural. É o caso, por exemplo, da trilogia Cantos do Trabalho, do cineasta Leon Hirszman (1937-1987), registro de uma tradição: o canto durante a colheita ou a construção como elemento de união entre os trabalhadores. Ou da obra Dois Pesos, Duas Medidas, em que Lais Myrrha contrapõe duas formas de organização social por meio de seus materiais de construção: a ocidental e a indígena. É importante destacar também na Bienal a presença marcante de grupos, como o Opavivará!, e de duplas, como Till Mycha, formada por duas escritoras.
LAIS MYRRHA
Militância
A Oficina de Imaginação Política, idealizada por Amilcar Packer, é a faceta mais visível da parceria cada vez mais íntima entre criação artística e vontade de mudança política e social. O objetivo do projeto é abrir um intenso espaço de discussão – e ação, reunindo interlocutores durante os três meses da Bienal. Há, ainda, obras que lidam com questões como a violência do Estado; a exploração da mão de obra; dramas vividos na África do Sul do Apartheid ou no Golpe Militar do Chile; a luta dos moradores em regiões atingidas por barragens ou a batalha das populações indígenas por sobrevivência, tema que se destaca no projeto Vídeo nas Aldeias, criado em 1986; as violências contra negros, mulheres e homossexuais. São trabalhos que se revelam ações de resistência, que vão além de mera ilustração dos dramas humanos.
Vídeo nas Aldeias
Espiritualidade
Escutar as árvores, redescobrir a sabedoria milenar contida em plantas ou em livros escritos há milênios, fazer música com o vento ou lidar com substâncias de forte conotação simbólica como o sal são procedimentos que ganharam destaque na 32ª Bienal. Há várias obras que enfatizam esses resgates – e ressignificações – de formas de organização negadas pela lógica dogmática da modernização. Dentre os artistas dessa vertente estão Bené Fonteles – que transportou uma oca indígena para o pavilhão; a finlandesa Pia Lindman, que criou uma casa de bambu e barro que se conecta com o interior e o exterior do prédio, onde se dispõe a realizar tratamentos de cura das articulações e dos ossos nos visitantes; ou a inglesa Ruth Ewan, que critica o cartesianismo do calendário moderno europeu com seu círculo de plantas. Afinal, como diz o curador Jochen Volz, “é preciso perceber que há conhecimentos espirituais complementares aos científicos”.
Pia Lindman
Futuro
FUTURO:O futuro, como esperança ou desilusão, é um eixo de mobilização bastante presente na exposição, com vários artistas explorando esse momento inalcançável, que perseguimos como possibilidade de cura dos nossos males contemporâneos, mas sobretudo como reflexo, instrumento de crítica e identidade para nossas utopias frustradas. Ficções científicas que mesclam realidade e imaginação, como a obra Heaven, do brasileiro Luiz Roque; o assustador paralelo entre os robôs, maltratados em testes, e os humanos – proposto na instalação da alemã Hito Steyerl, ou ainda o sonho de construir um futuro no qual será possível uma relação mais harmoniosa entre o homem e a natureza (em projetos como as casas cultivadas com uma espécie de fundo pelo grupo Nomeda & Gediminas Urbonas).
Hito Steyerl
Narrativas
A busca por novas formas de narrar, capazes de gerar sentidos alternativos à relação entre os homens e o mundo que os cerca, se faz fortemente presente entre os mais de 300 trabalhos desta Bienal. Talvez o mais impactante desses esforços narrativos seja a participação de Samico (1928-2013), presente com dezenas de gravuras, por sua beleza plástica e capacidade de sintetizar numa única imagem elementos tão diversos e tão profundamente humanos, como o sonho, o mito e a cultura popular. No entanto, o esforço de reunir e criar sentido entre elementos – materiais ou simbólicos – para propor novas formas de descrever e organizar a realidade parece quase onipresente na exposição, por meio das mais estranhas estratégias. Há, por exemplo, a mescla entre ficção e realidade, corporificada em O Peixe, vídeo no qual Jonathas de Andrade constrói um estranho ritual em que os pescadores se despedem de suas vítimas. Ou em Everything and More, videoinstalação em que a norte-americana Rachel Rose lida com as memórias visuais de um astronauta em seu retorno à Terra após um ano no espaço.
Gilvan Samico
Ciência
Enquanto a ciência nos apresenta certezas, a arte procura solapá-las, em busca de respostas menos dogmáticas. Há, no entanto, na intersecção dessas duas formas de tentar entender, apreender e mudar o mundo um fértil campo de trabalho, explorado por artistas como Pierre Huygue, ou Eduardo Navarro. No caso de Víctor Grippo (1936-2002), a mostra recria sua instalação Naturalizar o Homem, Humanizar a Natureza, ou Energia Vegetal, exposta pela primeira vez na 14ª Bienal de São Paulo, em 1977, e Analogia I (1970), também apresentada naquela mostra. No primeiro trabalho, fios conectados a batatas fazem menção à física e à energia contida no tubérculo. A obra torna-se plataforma para se falar de transformação e coletividade. Já o francês Huyghe trata do tema da extinção e da evolução das espécies com uma nova projeção do vídeo De-extinction (2014), que mostra, macroscopicamente, o interior de uma pedra de âmbar milenar com insetos em seu interior, e, ao lado do filme, o artista constrói uma sala de vidro com dois tipos de moscas criadas em laboratório.