Brasil: bola da vez


Alex Atala


A cozinha na boca do povo

texto: Cíntia Bertolino, especial para o estado
foto: Filipe Araújo/Estadão
Alex Atala nunca pareceu tão à vontade para falar sobre o que o toca profundamente: a cozinha do Brasil e a criatividade. Foi a criatividade, aliás, musa de artistas e cozinheiros que pontuou a abertura desta 7ª edição do Paladar Cozinha do Brasil.

Em uma inspirada apresentação, o chef do D.O.M. (6º melhor restaurante do mundo no ranking da revista Restaurant, divulgado esta semana) propôs uma reflexão sobre inventividade. "Para mim, criatividade é fazer o que todo mundo faz, mas de forma surpreendente", disse.

Enquanto instigava o público a pensar sobre o tema, Atala pontuou a aula "Brasil - Bola da Vez", com apontamentos sobre seu processo de trabalho: erros, acertos e inúmeras tentativas. "O que difere o bom do excepcionalmente bom é a prática". Continuou destacando a importância do repertório para um chef e a necessidade de esquecer amarras culturais, além de estar aberto a outras interpretações para que a criação flua livremente.

O chef falou ainda sobre a elaboração de alguns de seus pratos mais emblemáticos, enquanto um vídeo se encarregava de deixar a plateia com água na boca e beleza nos olhos. Sobre o bacalhau confitado, preparado durante a aula, contou que a maionese de ostras preparada por René Redzepi, do Noma, o fez pensar. Mas o que o inspirou de fato foi uma receita da cozinheira Ofélia. Uma das primeiras a ter programa culinário na TV, nos anos 80. A partir daí, criou a maionese de leite, um dos ingredientes de destaque da receita.

Sobre a gastronomia brasileira, Atala lembrou a experiência do Peru em promover a gastronomia mundo afora: "O Peru faz um barulho genial, mas nós temos muito, muito, muito mais". Defendeu a popularização da cozinha. Uma cozinha que caia no gosto e na boca, literalmente, do povo. Uma cozinha que volte os olhos para a natureza. "O ingrediente precisa do homem. O homem precisa do ingrediente". O óleo de carvão, usado no vinagrete do chibé, usado em um dos pratos preparados no D.O.M. e exibidos no vídeo, por exemplo, é justamente um lembrete de que a Amazônia está queimando. "E este é um sabor amargo".

Globetrotter
Quem assistiu à aula também ganhou um aperitivo de como será a apresentação do chef no Mad Food Camp, simpósio organizado por René Redzepi, dono do restaurante Noma, em Copenhague, em agosto. Atala levará à mesa uma galinha, um pato e peixes vivos. A galinha, será degolada ao vivo e a cores, "Tarantino style". O pato nadando em um pequeno aquário junto com peixes, pobre coitado terá a mesma sina. Vai morrer afogado. Matar um animal, ainda que necessário, é uma das coisas mais chocantes que um cozinheiro pode fazer, disse ele.

Em sua primeira aparição pública após o anúncio da lista da Restaurant, na segunda-feira passada, Atala contou que voltou para o Brasil decepcionado. "Fiquei em 6º lugar, mas voltei com gosto de derrota. Depois, pensei: p... sou o 6º melhor do mundo! Acorda!", disse bem-humorado.

O chef contou que, por alguns dias, pensou que seria o primeiro do mundo e disse não ter vergonha de assumir que queria estar no topo. Aplaudido de pé, longamente, disse ter convicção de que o Brasil ainda terá um chef nº 1 do mundo. "Talvez não seja eu, mas ainda teremos o melhor", sentenciou.



Bacalhau confitado

Ceviche de Flores



Pó de algas desidratadas
Alho desidratado
Crocantes de bacalhau