Um dos eventos mais aguardados dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, a prova dos 100 metros rasos – a mais nobre do atletismo – dura pouco menos de 10 segundos. Pode parecer pouco, mas seria suficiente para um torcedor publicar no Instagram um vídeo com a prova completa a partir do estádio do Engenhão, por meio da conexão 4G das operadoras Oi, Claro e Vivo. A poucos dias dos Jogos Olímpicos, o ‘Estado’ percorreu pontos importantes do Rio de Janeiro e em São Paulo para medir a qualidade da banda larga móvel oferecida pelas quatro principais operadoras do País.

Em menos de duas semanas, as empresas encaram um novo teste de fogo de sua infraestrutura – o terceiro em três anos, depois da Copa das Confederações e da Copa do Mundo. Se nas outras oportunidades a principal meta era a de estabelecer uma conexão 4G satisfatória, agora o desafio é mais complexo.

Segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o número de acessos 4G cresceu mais de dez vezes entre a junho de 2014 e maio de 2016, indo de 3,3 milhões para 37,3 milhões de conexões. “Um telefone que tem 4G custava mais caro na Copa do que hoje”, diz João Paulo Bruder, analista da consultoria IDC Brasil.

Além disso, o comportamento do usuário mudou: se em 2014 tivemos a “Copa das selfies”, com 48,5 milhões de fotos publicadas na internet brasileira ao longo das 64 partidas do torneio, segundo dados do Sinditelebrasil, entidade que representa as operadoras, a expectativa agora é de ter os “Jogos Olímpicos do vídeo”, com usuários de olho na tela dos celulares para ver e publicar vídeos nas redes sociais.

Como se não bastasse, os Jogos são um evento que dura três semanas, com competições o dia todo, concentradas em uma única cidade. “Nenhum lugar do mundo poderia lidar com tal demanda de rede sem impacto em seus serviços de conexão móvel”, diz Kevin Fitchard, analista da empresa de monitoramento de infraestrutura de telecomunicações OpenSignal.

A alta concentração de pessoas sobrecarrega as estações rádio base (ERBs), que aguentam um determinado número de aparelhos conectados ao mesmo tempo. A consequência é uma rede mais lenta, mas em situações mais extremas a sobrecarga pode levar a um “apagão” na rede. “Quando muitos usuários estão na mesma antena, a rede pode perder velocidade e até mesmo ficar congestionada”, explica Bruder, da IDC.

Testes no Rio de Janeiro

Parque Olímpico da Barra Wilton Junior / Estadão

Para prever o cenário que os torcedores olímpicos vão encontrar no Rio em agosto, a equipe do ‘Estado’ percorreu 12 pontos da cidade, entre sedes olímpicas, aeroportos e pontos turísticos.

Um dos 12 estádios-sede da Copa do Mundo, o Maracanã foi o melhor local do Rio, reflexo da infraestrutura já usada em 2014. No Engenhão, que receberá jogos de futebol e o atletismo, Claro e Oi tiveram boa conexão, muito perto da faixa esperada para o 4G – já a TIM conseguiu completar o teste do SIMET com grande lentidão.

Medições foram realizadas com chips das 4 maiores operadoras com planos pré-pagos em celulares Samsung Galaxy Note 2

Nas duas principais sedes olímpicas – os complexos da Barra da Tijuca e de Deodoro, na zona oeste da cidade –, a rede parecia passar por ajustes. “Passamos por um período de mudanças na rede, como uma casa que se prepara para abrir um restaurante”, explica Leonardo Capdeville, diretor técnico da TIM.

Em pontos turísticos do Rio de Janeiro, a qualidade das conexões foi sensivelmente melhor – com destaque para os testes na Praia de Copacabana, na Lapa e na Cinelândia. A exceção coube ao Cristo Redentor, no qual Oi e Claro estavam fora do ar – o sinal só foi reestabelecido ao voltar à parte “baixa” da capital carioca.

Para especialistas, a situação registrada pela reportagem do ‘Estado’ tende a piorar durante a competição. “Haverá mais pessoas conectadas e mais demanda durante os jogos”, crê João Paulo Bruder, da IDC Brasil.

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Esforço

Para tentar evitar “apagões” de sinal, as operadoras estão investindo em infraestrutura na cidade desde o início do ano. Ao contrário da Copa, quando houve instalações temporárias, os esforços devem ficar como legado para a crescente demanda no Rio. “As únicas antenas temporárias que faremos estarão nas arenas também temporárias”, diz André Sarcinelli, diretor executivo de engenharia da América Móvil – responsável por Claro, Net e Embratel.

No total, a Claro realizou cerca de 600 ações – entre instalação de antenas, melhorias na rede já existente e implementação de “antenas móveis”, enquanto a Oi afirma ter feito 500 iniciativas de melhoria. A TIM, por sua vez, instalou cerca de 500 ERBs (140 temporárias) de 3G e 4G no Rio de Janeiro este ano para atender a demanda durante os Jogos – já a Vivo diz ter ativado 130 novas antenas.

Testes em São Paulo

Itaquerão Daniel Teixeira / Estadão

Em São Paulo, a única sede olímpica é o Itaquerão, que receberá partidas de futebol. Por lá, o Estado viu a qualidade do sinal ficar abaixo das expectativas – só a Claro atingiu velocidade 4G, no download. Na capital paulista, os testes incluíram 13 pontos – além do estádio do Corinthians e dos dois aeroportos (Congonhas e Guarulhos), foram incluídos pontos de interesse turístico e locais com grande afluxo de pessoas, como as estações de metrô de Santana e do Tatuapé.

A percepção geral é que de o serviço de banda larga móvel é melhor que no Rio, com menos picos de velocidade, mas maior estabilidade e menor “buracos” na rede.Em lugares como a Vila Madalena, Metrô Santana e nos dois aeroportos, usar redes sociais, postar fotos e conversar via aplicativos de mensagem foi simples.

Já no Shopping Metrô Tatuapé e no Parque da Independência, no Ipiranga, – além do já citado Itaquerão –, a qualidade da rede deixou a desejar. No Tatuapé, por exemplo, Vivo e Oi não conseguiram executar o teste do SIMET Mobile. “A rede móvel é dinâmica e eventualmente questões assim podem aparecer”, diz André Ituassu, diretor de planejamento móvel da Oi.

A Vivo também não completou os testes na Rodoviária do Tietê, apesar de ter boa qualidade de navegação em ambos os pontos. “Pode ser um problema no sistema de interconexão entre nossa rede fixa e a rede móvel”, declarou Rodrigo Dienstmann, diretor de operações da empresa.

Daqui para a frente

Depois do fim dos Jogos Olímpicos, – e dos Paralímpicos, que serão realizados em setembro – as operadoras têm outro objetivo importante para cumprir: segundo determinação da Anatel, elas precisam estender a cobertura do 4G para cidades acima de 100 mil habitantes até o final do ano.

Líder de cobertura no País, a TIM hoje atende cerca de 530 cidades, e espera levar o 4G até mil municípios em dezembro, atendendo 73% da população brasileira. A Oi, por sua vez, está hoje em 133 cidades, e deve chegar a 284 até o fim do ano – enquanto isso, a Vivo está com 198 cidades e pretende chegar a cerca de 350 em dezembro, cobrindo 57% dos brasileiros. Já a Claro está hoje em 191 cidades, com a meta de ir até 293 municípios até o fim do ano.

Espectro. Além da simples expansão da cobertura, o 4G no Brasil tem outra fronteira que pode ajudar nos próximos anos: o espectro de frequência.

Hoje, as operadoras brasileiras utilizam a faixa dos 2,5 GHz para transmitir 4G – espectro considerado alto pelos analistas. “Quanto maior for a frequência, menor será a área de cobertura”, explica Eduardo Tude, presidente da consultoria Teleco. “Hoje, a faixa dos 2,5 GHz tem buracos, além de não conseguir garantir uma boa cobertura em ambientes internos, como prédios e shoppings.”

Durante os Jogos Olímpicos, as operadoras brasileiras devem utilizar outra frequência – a dos 1,8 GHz, hoje usada pela rede 2G – para transmitir sinal 4G. Claro, Vivo e TIM terão a operação em funcionamento durante os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, enquanto a Oi fará testes no Rio de Janeiro com essa faixa, tentando agregá-la à sua rede nos 2,5 GHz.

Para os próximos anos, Claro, TIM e Vivo devem começar a utilizar a frequência dos 700 MHz, hoje ocupada pelo sinal de TV aberta – a Oi não participou do leilão de frequência, realizado há dois anos.

No entanto, antes disso acontecer é preciso ocorrer o desligamento da TV analógica em todo o País – por enquanto, apenas a cidade de Rio Verde (GO) passou por esse processo, já tendo 4G sendo oferecido nessa frequência pela Claro e pela TIM.

Em Brasília, o desligamento acontece ainda este ano, mas nas principais capitais do País, como São Paulo e Rio, só no ano que vem – o que deve fazer a migração para o 4G demorar um pouco.

“Com os 700 MHz, é possível ter melhor penetração em prédios”, diz Tude, da Teleco. “Além disso, as baixas frequências dão maior cobertura a áreas rurais, e adicionam capacidade às redes das operadoras, podendo atender mais clientes com menor investimento”, avalia Kevin Fitchard, analista da OpenSignal. É uma inovação que deve ficar só para o próximo ciclo olímpico, mas que pode fazer o 4G brasileiro bater novos recordes de velocidade, indo além de 100 metros rasos.

Método

Em cada um dos pontos visitados no Rio e em São Paulo, a reportagem mediu a qualidade da rede com a ajuda do aplicativo SIMET Mobile, desenvolvido pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), ligado ao Comitê Gestor da Internet do Brasil (CGI.br). A ferramenta mede taxas de download e upload, além de latência. Para isso, a reportagem adquiriu chips de Claro, Oi, TIM e Vivo, com planos pré-pagos de dados habilitados com conexão 4G, e adicionou créditos quando necessário.

O esforço tentou reproduzir a experiência comum dos brasileiros com internet móvel – além dos testes feitos com o SIMET Mobile, foram realizadas tarefas corriqueiras de navegação, como uso de redes sociais, publicação de fotos e chamadas de vídeo e de voz por meio de aplicativos.

Nos gráficos, para comparar os dados gerados pelo Link e a média da região, foi estabelecido um raio entre 800 m e 2,8 km a partir de cada local testado, de acordo com a disponibilidade de dados na região. Obtivemos as taxas médias de download e upload para esta área através do OpenSignal, que coleta de informações sobre a rede 4G através dos usuários de sua plataforma.