Casa Rosada, em Buenos Aires (Crédito: Felipe Mortara / Arquivo / Estadão)

O ano eleitoral:

O kirchnerismo começou o ano que define sua continuidade com vento contrário. Como é usual em governos com viés personalista, após oito anos de governo Cristina Kirchner não tinha um sucessor natural dentro do movimento. A oposição já apresentava dois nomes claros, o conservador Mauricio Macri, que chegou a liderar pesquisas em fevereiro, e o ex-kirchnerista Sergio Massa, que aparecia como favorito até o ano passado.

Pano de Fundo:Entenda O kirchnerismo é uma corrente que mantém os traços históricos peronistas de proteção estatal (que às vezes deriva em assistencialismo) e presença política territorial em cada bairro (que eventualmente termina em coação aos eleitores). A isso, o modelo K agregou como estratégia o combate aberto a um inimigo de turno: meios de comunicação, grandes produtores rurais, a Igreja, fundos especulativos, os EUA, entre outros. Cristina foi porta-voz em todos esses choques. No último ano, o Judiciário foi o antagonista principal.


Ajustes econômicos

Economistas avaliam que o governo está segurando ajustes inevitáveis para não prejudicar o desempenho eleitoral de seu candidato. A perspectiva de uma mudança inevitável, paradoxalmente, dá um certo clima de tranquilidade aos eleitores, o que favorece Daniel Scioli. Alguns temas deverão ser resolvidos pelo próximo presidente:

  1. CÂMBIO
    O kirchnerismo mantém o controle sobre o câmbio desde 2011, consequência entre outros fatores o baixo volume de reservas (US$ 30 bilhões). Há consenso de que o peso está sobrevalorizado - no mercado paralelo, a moeda americana é vendida a 15,60 pesos, enquanto no oficial é seu valor é de 9,40 pesos. Uma desvalorização repentina é descartada por Daniel Scioli, que fala em "correções graduais". Mauricio Macri pretende liberar o câmbio tão logo assuma. Sergio Massa colocou um prazo de 100 dias para acabar com a restrição.

  2. DÉFICIT E SUBSÍDIOS
    Um passo inevitável para o próximo presidente é corrigir o déficit fiscal. Só isso permitiria retomar o controle da política monetária. Os planos sociais de auxílio serão preservados, já que tornaram-se direitos por lei e os três candidatos prometeram mantê-los mesmo que não fossem norma. Segundo a Universidade Católica Argentina (UCA), 28% dos lares argentinos têm algum benefício. Os primeiros subsídios cortados tendem a ser os do setor de transporte e energia, que consomem respectivamente 1,2% e 3,3% do PIB, segundo o Centro de Implementação de Políticas Públicas para Equidade e Crescimento (Cippec). Este mesmo organismo independente estima em 4,8% do PIB o gasto anual com subsídios - em 2006, antes de Cristina assumir, era de 1,4%. No total, as ajudas do governo representam 36% do gasto público. Esse corte de subsídios tende a atingir as classes média e alta.

  3. ESTATÍSTICAS E INFLAÇÃO
    Outro passo inevitável para o ganhador será tornar confiáveis números oficiais, que passaram a ser maquiados pelo Instituto Nacional de Estatísticas e Censo (Indec). O porcentual de pobreza, por exemplo, deixou de ser divulgado sob argumento de que estigmatiza os pobres. De acordo com o governo, a inflação anual é de 15%, mas consultorias privadas a colocam em cerca de 25%.

  4. FUNDOS ABUTRE
    Os credores que não aceitaram a renegociação da dívida Argentina (7% do total) e exigiram o valor integral de seus bônus conseguiram uma decisão na Justiça americana favorável em julho de 2014, o que colocou o país em calote parcial, com a cobrança de US$ 1,6 bilhão. Os termos da negociação com esses fundos, chamados pelo governo de "abutres" por se especializarem em comprar títulos abaixo de seu valor nominal para logo exigir o valor total, permearam a campanha. O kirchnerismo mais duro se recusa a pagar até que se chegue a um número justo. O conservador Mauricio Macri chegou a defender o pagamento imediato para a Argentina voltar a obter crédito externo. As últimas decisões judiciais têm sido favoráveis à Argentina, que alega que o caso afeta sua soberania.


Como funciona o sistema eleitoral

  1. Voto obrigatório
    Quem não vai às urnas dia 25 de outubro deve apresentar uma justificativa ou pagar uma multa de pequeno valor, como no Brasil. É obrigatório entre os 18 anos e os 70 anos. Maiores de 16 podem votar também. Estão habilitados a participar 32 milhões de eleitores. Serão escolhidos 130 deputados, 24 senadores e 43 parlamentares do Parlasul, além de governadores de algumas províncias.

  2. Voto em papel
    O voto eletrônico foi testado em algumas eleições regionais, mas não será usado dia 25. A oposição exigia pelo menos o uso de uma cédula única, com todas as coalizões no mesmo papel, mas não foi atendida.

  3. A cédula

    Cédula do candidato Macri (Crédito: Rodrigo Cavalheiro / Estadão)

    Chamada de "boleta", a cédula argentina pertence a uma coalizão e contém todos os candidatos daquela agrupação. O resultado é uma espécie de santinho em que estão lado a lado as fotos e os cargos em disputa naquela região, começando pelo presidente. O eleitor não assinala um nome, apenas escolhe o santinho, o coloca em um envelope e deposita na urna. Na eleição primária, onde havia disputa interna em cada grupo político, uma cédula podia ter mais de um metro.

  4. O voto cruzado
    Se o eleitor deseja escolher o presidente de um partido e o governador de outro, por exemplo, deve pegar as cédulas das duas coalizões e recortar, de preferência com uma tesoura, as figuras que prefere (há uma linha pontilhada para isso). Esse esforço é historicamente minoritário, o que influencia o resultado da eleição. Um candidato a governador que não seja o mais popular pode ser eleito graças à força do presidenciável do seu partido naquela região, por estar na mesma cédula. Um candidato a governador muito popular pode catapultar um presidenciável desconhecido em determinada província graças à preguiça de "cortar a boleta".

  5. Parlamentares
    O eleitor não vota em um nome, mas em uma lista de candidatos. Para que seu preferido seja eleito, é preciso que o número de votos da coalizão seja proporcionalmente suficiente. Máximo Kirchner, filho da presidente, por exemplo, concorre a deputado pela Província de Santa Cruz e será eleito porque é o primeiro nome da lista kirchnerista. Como está na mesma cédula do candidato à presidente e o hábito de cortar a cédula é minoritário, será favorecido.

  6. O escrutínio
    Os votos são contados individualmente diante dos fiscais de mesa e das coalizões que estiverem presentes, na chamada apuração provisória. Uma reclamação da oposição e dos partidos menores é não ter condição de checar todas as mesas eleitorais. O sistema envolve a transmissão de dados pelos correios até a Justiça. No dia 25, serão contados e transmitidos antes os votos para presidente, já que em várias províncias há também eleição para governador. Espera-se que a apuração definitiva, que envolve recontagem, anulações e já mudou o resultado de algumas eleições, demore dias.

  7. Tipos de fraudes:

    Roubo de cédulas dos rivais:
    As cédulas de cada coalizão ficam em uma sala isolada, em pilhas uma ao lado da outra. Um eleitor pode separa a de sua preferência e roubar as dos demais. Se a sala fica sem cédulas de determinado grupo, é responsabilidade dessa coalizão repor o material. Partidos menores ou sem estrutura em cidade pequenas se dizem prejudicados.

    Voto por comida:
    A irregularidade mais comum é a troca de votos por alimento. A eleição para governador em Tucumán, em agosto, que chegou a ser anulada por fraudes e logo foi validada, com vitória kirchnerista. Naquele caso, houve distribuição de comida em comitês kirchnerista, queima de urnas e agressões.

    Ameaça de corte de planos sociais:
    os chamados "punteros" são líderes políticos de bairro que controlam o acesso de desempregados aos benefícios sociais. Eles permitem que o eleitores sob seu domínio descumpram as contrapartidas que deveriam dar pel assistência, em troca de apoio em comícios ou divisão de seus benefícios. Ele propagam a ideia de que se outro grupo político vencer, os planos sociais acabarão.

    Eleitores fantasma:
    O transporte de eleitores de uma região à outra em eleições provinciais foi flagrado. Também há registro de paraguaios com RG argentino que cruzam a fronteira para votar em troca de dinheiro.

  8. A campanha eleitoral de 2015:

    mbora 700 mil televisores sejam apagados cada vez que Cristina Kirchner entra em cadeia nacional (estimativa de 2012), a popularidade da presidente se mantém alta após oito anos de governo. Sua imagem positiva segundo a consultoria Poliarquía é de 40%. Outros institutos colocam sua popularidade em até 50%, alta para um presidente em segundo mandato. A explicação encontrada por especialistas são os planos sociais, a ampliação de direitos como aposentados e a estabilização dos indicadores econômicos que mais afetam o eleitor, emprego e câmbio. A presidente usou 44 cadeias nacionais este ano para inaugurar obras públicas e privadas (depois que a lei impediu as primeiras, em função da proximidade da eleição), criticar a oposição e nos últimos tempos, aparecer ao lado de seu candidato, Daniel Scioli. A proximidade foi interpretada como um empréstimo de popularidade ao candidato ou como uma forma de condicioná-lo.

    Prévias:
    Em 9 de agosto, o kirchnerismo, com o candidato governista Daniel Scioli, obteve 38,6% dos votos na primária obrigatória, que serve como termômetro da votação nacional. Ele chegou como candidato único após formar, em junho, chapa com um ideólogo do kirchnerismo, Carlos Zannini. A dobradinha abençoada por Cristina acabou com as pretensões do ministro dos Transporte, Florencio Randazzo, de disputar a primária. Isso permitiu ao kirchnerismo chegar unificado formalmente, ainda que com fissuras internas. A oposição chegou dividida com dois opositores, Mauricio Macri e Sergio Massa. Nas semanas anteriores ao prazo para apresentação de candidaturas, houve negociação para que ambos disputassem a prévia na mesma coalizão. A união foi rejeitada pela campanha de Macri, que considerava a associação com um ex-integrante da cúpula kirchnerista um mal negócio entre os que queriam mudança (60% segundo as pesquisas). O grupo de Macri obteve 30% dos votos e o de Massa, 20,5%. O desempenho afastou a tese de uma polarização ou da concentração dos votos opositores em um nome.

    Corrida à Casa Rosada

    FONTE: Management & Fit

    A campanha eleitoral de 2015:

    Scioli, o canditato possível

    Scioli ao lado da presidente Cristina Kirchner (Crédito: Natacha Pisarenko / AP)

    Daniel Scioli entrou na política por indicação do ex-presidente Carlos Menem (1989-1999), com quem nenhum político quer ser relacionado na Argentina. Sua política de privatizações é considerada culpada pela crise de 2001-2002, da qual o kirchnerismo garante de ter tirado o país. Scioli, um ex-piloto de lancha que perdeu o braço direito em uma corrida em 1989, foge da pergunta sobre ser de direita, centro ou esquerda (a resposta óbvia para qualquer kirchnerista). Foi vice de Néstor Kirchner (2003-2007), morto em 2010, e ministro do Turismo. Seu perfil conciliador, para a ala mais radical do kirchnerismo, o grupo La Cámpora, é a garantia de que o projeto de Cristina e Néstor, cuja base é o confronto, acabará. Governador da Província de Buenos Aires, tornou-se candidato único antes da prévia de agosto porque não havia entre os militantes mais próximos a Cristina alguém com tantos votos. Quando está em atos com a presidente, defende todo o legado kirchnerista. A eleitores independentes ou empresários, costuma a falar em coisas a corrigir. Sofreu inúmeros ataques de Cristina, aos quais nunca respondeu. Em 2012, ano em que mostrou intenção de se candidatar a presidente em 2015, teve as verbas de sua província bloqueadas pelo governo. Em uma sessão no Congresso em 2005, a senadora Cristina o acusou diretamente de ser menemista.

    Macri, o inimigo clássico

    Candidato Mauricio Macri (Crédito: Enrique Marcaria / Reuters)

    O empresário e engenheiro Mauricio Macri é o opositor com mais chances de derrotar o kirchnerismo. Ele governa há oito anos a cidade de Buenos Aires, administração na qual ganhou a fama de bom administrador. Investiu em corredores de ônibus expressos que aliviaram as ligações com a região metropolitana, manteve a cidade limpa e multiplicou as ciclovias. O resultado é uma aprovação superior a 60%, que lhe permitiu fazer seu sucessor, mesmo com críticas nas áreas de saúde e educação. Tornou-se conhecido no país como presidente do Boca Juniors (1995-2008), atividade que ele diz ter dado confiança para saltar à política. Prega um ajuste econômico imediato, com fim do controle sobre o dólar e abertura para buscar investimentos externos. Macri é um liberal que, para evitar uma vitória do kirchnerismo no primeiro turno, buscou na reta final da campanha votos entre peronistas. Quer também tirar votos de outros opositores apresentando-se como o "voto útil" capaz de frear a continuidade do grupo de Cristina no poder.

    Os que querem ajustar nunca passaram fome
    Não se governa um país com enrolação e balõezinhos

    Cristina Kirchner, em cadeias nacionais em 2015, referindo-se a origem de Macri, filho de um milionário, e às bexigas infantis que são símbolo de sua campanha.

    Massa, o traidor

    Candidato Sergio Massa (Crédito: Enrique Marcaria / Reuters)

    Sergio Massa foi chefe de gabinete de Cristina Kirchner entre 2008 e 2009. O cargo equivale ao de porta-voz não só dos atos como dos pensamentos do governo. Em 2013, ele desertou e formou a Frente Renovadora, um bloco que tirou do kirchnerismo vários políticos. O grupo derrotou o governo na eleição parlamentar que permitiria mudança da Constituição e um terceiro mandado para a presidente no projeto chamado "Cristina Eterna". Massa ganhou protagonismo e até o fim de 2014 era o favorito à presidência segundo as pesquisas de opinião. Sua campanha entrou em crise este ano, com a traição dos políticos que tinham aderido a seu movimento e às vesperas da eleição ainda voltam ao kirchnerismo. Sua baixa coincidiu com a ascensão do conservador Mauricio Macri como o principal opositor. Em abril, reverteu o quadro ou pelo menos estancou a queda com um forte discurso conservador, que prega prisão perpétua para narcotraficantes, punição penal a partir dos 14 anos e uso do Exército no combate ao tráfico, não só nas fronteiras, mas também em favelas dominadas pelo Estado paralelo. Ex-prefeito de Tigre, cidade turística na Grande Buenos Aires, fez das câmeras de segurança seu principal legado.

    Um prefeito inaugurou modernas câmeras de TV, mas justamente quando torcedores trocaram tiros em Tigre e um morreu, elas estavam estragas e não houve gravação. É preciso falar de segurança seriamente, não usar isso como instrumento político.

    Cristina em 2013, após a ruptura de Massa, em discurso no Congresso.

Futuro papel de Cristina ainda é incerto

Os argentinos, governistas ou opositores, se questionam sobre o rumo do kirchnerismo depois que sua líder deixar o poder, me 10 de dezembro. Em 12 anos, o movimento político lançado por Néstor (2003-2007), morto em 2010, e continuado por Cristina Kirchner adicionou sua vocação para o confronto a características do peronismo clássico - a ampliação da proteção/intervenção estatal e da militância a cada bairro. A divisão ideológica se refletiu diretamente nas relações sociais. Tornaram-se mais comuns churrascos com apenas um dos bandos. Espera-se que sem o estilo trombador de Cristina a tensão social diminua.

Caso o kirchnerismo passe à oposição, o papel da ex-presidente será mais claro, o de voz principal contra o governo e um forte nome para a disputa presidencial de 2019. Cristina escolheu não ser candidata em 2018, frustrando as previsões de críticos que a colocavam em busca de algum cargo que garantisse imunidade ou pelo menos proteção em investigações que envolvem lavagem de dinheiro em negócios da família.

O maior debate entre analistas políticos é sobre sua participação num futuro governo de Daniel Scioli. Essa é provavelmente a pergunta que o governador da Província de Buenos Aires mais ouviu durante a campanha. Suas respostas variavam entre "governarei com as atribuições que me dá a Constituição" e "não me subestimem".

Cristina aceitou Scioli como candidato único de seu movimento depois que Carlos Zannini entrou como vice na chapa. Ideólogo do kirchnerismo e homem de confiança de Cristina, Zannini motivou as dúvidas sobre a influência que ela exerceria se os opositores estariam certos ao ligar Scioli a uma marionete.

"Essa é uma pergunta política central. Acredito que Cristina manterá sua liderança, mas não governará. Scioli deverá construir seu próprio espaço. Terá que fazer as duas coisas ao mesmo tempo, governar e construir política. Navegar e consertar o barco", avalia o consultor e sociólogo Ricardo Rouvier.

Scioli nunca usou uma frase atribuída a ele: "Não serei um presidente de transição". Dizê-la possivelmente o colocaria em confronto com a ala mais dura do kirchnerismo, mas ele não reclamou quando a atribuíram a ele. Um sinal de que não pretende abrir mão da possibilidade de um segundo mandato.

Vocação para o confronto é um traço que Scioli não demonstrou como político até agora. Sua capacidade de "engolir sapos" - Cristina foi de suas maiores críticas - é citada como virtude e defeito, e esse não é um dado menor. Significa que o kirchnerismo em sua essência, atacar quando possível e não recuar, deixará o poder em 10 de dezembro. Mesmo que o candidato que apoia vença.

Por isso, é um consenso que essa eleição marca um "fim de ciclo", ou pelo menos uma interrupção. Em abril, Cristina afirmou em um ato na Casa Rosada: "Espero não ter que volver em 2019, porque isso significa que depois de mim virá alguém que será melhor que eu". Também disse que pretendia plantar rosas na Província de Santa Cruz, no sul, berço político da família. Ninguém levou a sério a possibilidade de ela abandonar a política. Resta saber como defenderá o que seus militantes chamam de "legado" e seu críticos consideram um retrocesso populista. Se voltará como conselheira, opositora ou candidata.

Pano de fundo

Entenda

1 - JUDICIÁRIO, O ÚLTIMO INIMIGO
A crise entre o kirchnerismo e a Justiça nasceu com decisões adversas (liminares permitiram ao Grupo Clarín, por exemplo, resistir à tentativa de desmembramento pela Lei de Mídia). O choque de poderes se acentuou com a morte do promotor Alberto Nisman, quatro dias depois de denunciar Cristina e parte da cúpula kirchnerista por encobrir a autoria de um atentado. Embora parte da opinião pública apostasse que o caso seria um golpe definitivo para o kirchnerismo, estudos já apontavam que ela mantinha a capacidade de fazer o sucessor. Saiba mais

2 - O CASO NISMAN
Quando apareceu morto com um tiro na cabeça em 18 de janeiro, Alberto Nisman chefiava a equipe que investigava a autoria do atentado de 1994 contra a Associação Mutual Isrealita-Argentina (Amia), associação judaica que presta serviço social em Buenos Aires. Parte do Judiciário mobilizou a sociedade para homenageá-lo em uma marcha com 400 mil manifestantes em 18 de fevereiro. O governo interpretou o ato como uma mobilização de opositores e marcou juízes e promotores que a lideraram como inimigos. Depois de ser denunciada por Nisman e indiciada pelo promotor Gerardo Pollicita, Cristina livrou-se da acusação em maio, quando a denúncia foi arquivada por um tribunal superior, depois de recusada pelo juiz Rafael Rafecas. Não seria o único alívio para Cristina na Justiça.
Assista ao vídeo

3- A CAUSA HOTESUR
O juiz Claudio Bonadio comandou até julho a investigação de lavagem de dinheiro em um hotel da família Kirchner na Província de Santa Cruz, berço político do clã. A decisão de afastá-lo foi tomada dias depois de ele usar a polícia metropolitana de Buenos Aires, subordinada ao opositor Mauricio Macri, para uma operação que recolheu provas na imobiliária de Máximo Kirchner, em Río Gallegos. Acusado de parcialidade, foi afastado pelo Conselho da Magistratura, órgão de composição política dominado pelo kirchnerismo. Em seu lugar, assumiu Rafael Rafecas, que validou as provas mas é visto com desconfiança por seu histórico de decisões pró-governo. Na chamada causa Hotesur, há indícios de que de que o empresário Lázaro Baez pagou durante dois anos a ocupação de um dos hotéis dos Kirchners em El Calafate, cidade turística no sul do país, em troca de benefícios em licitações.

4- PAPA, O EX-INIMIGO
O arcebispo Jorge Bergoglio figurou entre os inimigos do kirchnerismo. Primeiro, por criticar a corrupção em 2004, em uma missa anual em que costuma estar o presidente. Néstor Kirchner não gostou e passou a assistir à celebração no interior nos anos seguintes. Bergoglio entrou em choque com o kirchnerismo em 2010, quando o país aprovava o matrimônio homossexual e ele se posicionou contra - em uma carta enviada a carmelitas e vazada por ele para dar satisfações ao Vaticano, usou a expressão "jogada do Diabo" para se referir ao tema. Cristina o acusou de ter posições de "tempos medievais e da inquisição". Quando Bergoglio transformou-se em Francisco, o tratamento mudou. Na primeira semana, ainda foi acusado por um jornalista alinhado ao governo de ter colaborado com a ditadura (1976-1983) e tratado com frieza por Cristina, que em sua primeira saudação deu as boas-vindas a "um papa latino-americano". Desde então, ela não perde oportunidade de aparecer com Franciso - foram sete encontros, alguns de rápidas saudações, como o último, na passagem dele por Cuba. O kirchnerismo aproveitou a reaproximação e vários políticos foram ao Vaticano para voltar com uma foto, usada em campanha. Em março, Francisco disse que às vezes se sentia usado pela política.

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