Emaranhado de correntes em um fundo azul. As pontas das correntes vão aos limites da ilustração, e nelas é possível ver personagens como Homem de Ferro, Tio Patinhas, Senhor Monopoly, Senhor Sirigueijo e Senhor Burns.
É difícil imaginar um mundo sem bancos, mas esse cenário está se tornando cada vez mais possível | Arte: Nuno Franco

Os bancos podem sumir?

Os bancos estão hoje entre as maiores empresas do mundo e dificilmente desaparecerão de uma hora para outra. Por outro lado, novas tecnologias indicam que um caminho alternativo está cada vez mais perto

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Sim: Através das tecnologias blockchain e ponto a ponto (peer-to-peer), é possível um sistema sem bancos, em que todas as trocas acontecem diretamente entre agentes, de forma descentralizada

Por que sim?

Os bancos foram parte importante de um dos eventos mais relevantes da história econômica: a Revolução Industrial. O economista John Hicks, vencedor do Prêmio Nobel de 1972, foi um dos pioneiros dessa tese. Ele afirma que os produtos feitos durante as primeiras décadas da revolução já tinham sido inventados havia algum tempo. Portanto, não foi a inovação tecnológica que acelerou o crescimento das indústrias e sim o aumento da liquidez do mercado financeiro, que permitiu empréstimos maiores e com prazo mais longo.

Só que hoje não são só os bancos que detêm grandes somas de dinheiro. Outras empresas gigantes com enorme acúmulo de capital já começaram a enxergar em atividades financeiras uma nova maneira de fazer negócios. Desde 2012, a Amazon tem um serviço chamado Amazon Lending, que oferece microcrédito para pequenos estabelecimentos que aceitam usar o site para vender seus produtos. Além disso, Google e Apple já desenvolveram serviços de pagamento via sistemas operacionais e o Facebook criou uma forma de transação de dinheiro através de seu chat. São empresas cujo valor de mercado passam de meio trilhão de dólares cada uma.

Mas para além das grandes empresas, o advento de tecnologias de compartilhamento de dados financeiros, como o blockchain e o peer-to-peer (P2P), abrem novas possibilidades para lidar com o dinheiro, de forma descentralizada.

Arte: Nuno FrancoIlustração de fundo azul onde é possível ver um homem de cartola, bigode monóculo sentado em cima de um banco.

No livro O Fim do Bancos (2018, Companhia das Letras), o mundo é delineado sem essas instituições bancárias. O cenário criado por Jonathan McMillan – pseudônimo para dois autores, um economista e um veterano de um banco de investimentos global – defende que por meio da conexão em nuvem e da integração de sistemas de controle os bancos se tornam desnecessários, eliminando burocracia e taxas operacionais em operações financeiras.

Pelo sistema elaborado por McMillan, uma pessoa com dinheiro sobrando colocaria esse recurso à disposição no sistema financeiro para que alguém precisando de crédito pudesse pegar emprestado. É o empréstimo ponto a ponto (peer-to-peer). A grande questão, neste caso, seria como conseguir altos valores. A resposta, para o autor, é simples: tomando empréstimo de várias pessoas. É aí que entra uma figura central para o sistema proposto por McMillan, o operador designado. Essa pessoa seria contratada individualmente, como um contador, e ficaria responsável por analisar oportunidades no mercado, seja de empréstimo ou para emprestar.

No sistema integrado, com uma espécie de cadastro positivo – proposta de banco de dados de pessoas físicas com bons pagadores, cujo texto base do projeto de lei já foi aprovado no Congresso Nacional – seria possível gerar uma nota quase automática para o risco de crédito de alguém ou de alguma empresa. O operador designado também seria avaliado no sistema. Caso ele viesse a sugerir um mau negócio, sua nota cairia.

Não: Os bancos são hoje instituições muito grandes para sumirem de uma hora para outra, ou seja, seria necessária uma transição. E ainda existirá a necessidade de ter bancos centrais

Por que não?

Antes dos bancos, figuras chamadas de custodiantes guardavam o dinheiro de seus clientes. “Foram eles que descobriram que muitas pessoas não resgatavam todo o dinheiro que estava lá e que poderiam emprestar esses valores”, explica o doutor em história econômica Vinícius Müller, professor do Insper. “Foi um movimento que se iniciou no final do século 17, começo do 18.”

Daquela época até agora, a importância dos bancos só aumentou. E é por suas ramificações e por sua presença em diversas áreas da sociedade que o economista e palestrante de educação financeira Gerson Caner não crê que essas instituições financeiras possam desaparecer tão cedo. “Um mundo sem bancos é possível no longo prazo, mas eles vão participar do processo de transição de alguma maneira”, diz Caner. “É um setor muito forte, com muito poder. Não considero possível os bancos saírem perdedores deste processo.”

Outro ponto crítico de um mundo sem bancos seria a extinção dos bancos centrais, algo que não seria possível, segundo o mestre em economia Rubens Sawaya. “É quase impossível imaginar um mundo sem pelo menos um banco central regulando o sistema financeiro para garantir a parte mais importante, a liquidez e a confiança. “O mundo sem bancos seria um lugar onde os ativos poderiam sofrer com problemas de liquidez, reduzindo a confiança no sistema”, afirma Sawaya.