Uma mão segura um celular com uma foto com o ícone de uma rede para representar o blockchain. A imagem foi distorcida para gerar um efeito futurístico.
O Blockchain é uma nova tecnologia que promete revolucionar muitos dos serviços financeiros que conhecemos hoje | Foto: Carla Bridi/Estadão

Esse tal de blockchain

A tecnologia que está por trás das criptomoedas promete ser uma nova forma de se pensar serviços e produtos financeiros

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O papel do banco como intermediário entre você e seu dinheiro está prestes a mudar. Assim como a forma de relacionamento entre as instituições financeiras. Por trás de boa parte desta alteração está uma palavrinha ainda pouco conhecida do público, o blockchain. Mas o que é esse tal de blockchain? De forma simplificada, trata-se de um de banco de dados descentralizado, que usa criptografia. Ele chama a atenção porque permite transações diretas entre os usuários da rede, sem a necessidade de um intermediário ou um órgão regulador.

No mercado financeiro, a tecnologia pode ser aplicada para as atividades de validação, como no caso da compensação bancária, por exemplo, numa transferência via DOC ou TED, e ainda para a área de clearing da bolsa, que faz registro, compensação, liquidação e gerenciamento de riscos de operações. “O blockchain é como um livro contábil auditável a qualquer momento. As informações que eu lanço ficam disponíveis com segurança para quem eu determinar”, diz Rodrigo Borges, advogado e especialista no tema.

“Um grande gargalo que a gente tem hoje nos bancos e na bolsas de valores é a questão da validação das transações”, explica Borges. O uso do blockchain, diz ele, permitiria que as bolsas e os bancos efetuassem a validação das transações em tempo real, sem a necessidade de uma dupla validação. Isso permitiria, por exemplo, que o mercado de ações ficasse aberto 24 horas, assim como acontece hoje com a negociação das criptomoedas.

Quando um banco A faz uma transação com o banco B, ambos têm de digitar a operação dos dois lados e, se houver alguma divergência, haverá problema na certa. Essa dupla validação sumiria do mapa. Além disso, as instituições financeiras têm processos rigorosos de conciliação, já que toda informação é extremamente regulada e deve estar correta, e isso tem custos elevados.

“Na adoção de blockchain, os bancos poderão ter uma redução desses custos”, afirma Keiji Sakai, CEO da R3, um consórcio global de instituições financeiras para blockchain. A tecnologia pode reduzir, em média, 30% dos custos de infraestrutura de oito dos dez maiores bancos de investimento do mundo, segundo um estudo da Accenture. A aplicação do blockchain pode trazer uma economia de até US$ 12 bilhões anuais para as instituições financeiras.

A R3 reúne mais de 200 instituições financeiras no mundo. Entre as brasileiras, já participam Bradesco, Itaú e B3, a bolsa de valores. “O blockchain é um novo modelo de se pensar o negócio. É pensar mais na distribuição da informação”, diz Sakai. Ele explica que a aplicação do blockchain no mundo financeiro está sendo feita em cima de soluções que já existem e, por isso, estamos passando por um momento de transformação dos serviços atuais.

O grupo de estudos em blockchain da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) apresentou no Ciab, congresso de tecnologia bancária realizado em junho, um protótipo com informações de segurança em dispositivos móveis que venham a ser usados pelos clientes na relação com o banco. Em nota, a Febraban diz que “o protótipo está sendo validado e refinado pelos bancos, para evoluir para um projeto-piloto, onde poderá ser testado de forma controlada”.

Nessa questão de segurança, o blockchain pode facilitar o processo de identificação dos clientes, como explica o especialista Borges. “Um dos grandes problemas que temos hoje é o uso de operações financeiras para atos ilícitos, como lavagem de dinheiro, mas a “identidade blockchain” das pessoas, com todo seu histórico, ajudaria o banco a identificar algum problema.”

As aplicações são várias, mas não há regras oficiais no Brasil. O Banco Central diz que, no momento, não há estudo para regulamentação, mas concorda que o blockchain é uma “tecnologia promissora, com potenciais impactos em diversas áreas, principalmente na concepção de infraestrutura para registros, cadastro e transações”, declarou o regulador por meio de nota.

O Banco das Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês), instituição que reúne todos os bancos centrais, divulgou um estudo em junho, no qual afirma que as criptomoedas prometem substituir a confiança de instituições tradicionais, como bancos centrais, por um novo sistema descentralizado baseado no blockchain e na tecnologia de contabilidade distribuída relacionada (DLT, na sigla em inglês). Porém, seu modelo descentralizado limita o potencial de substituir a moeda convencional e é considerado um desastre ambiental, devido ao alto consumo de energia elétrica necessário para manter essa tecnologia, alerta o BIS. “Olhando além do ‘hype’, é difícil identificar um único problema econômico que as criptomoedas possam atualmente solucionar”, afirma o líder de pesquisas do BIS, Hyun Song Shin. O estudo reforça que a essência do padrão monetário sempre foi a confiança na estabilidade de seu valor. E a confiança ainda é um “elo perdido” desse novo padrão monetário, na visão do órgão internacional que reúne os bancos centrais.