Grandes ou pequenos, todos os partidos devem pedir sua contribuição em 2018
Siglas já testam vaquinhas online para financiar despesas de candidatos na próxima eleição
Com a restrição legal às doações de empresas para campanhas políticas, as chamadas vaquinhas que arrecadam recursos online podem ganhar espaço em 2018. Restritas ao universo de alguns poucos partidos pequenos em eleições anteriores, as campanhas de crowdfunding na internet já estão sendo testadas por siglas maiores. Para a caravana do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Minas Gerais, em outubro deste ano, o PT arrecadou R$ 100 mil por meio de um site controlado pelo diretório da legenda no Rio. Foi uma forma de testar métodos e plataformas para o ano que vem, quando a estratégia será ampliada.
A ideia de apostar nos microdoadores via internet já é uma bandeira dos partidos menores, que dependem dos próprios eleitores para se financiar. PSOL e Rede, que votaram contra o fundo público de R$ 1,7 bilhão aprovado pela Câmara neste ano, pretendem garantir receitas dessa forma. O mesmo vale para o Partido Novo, que ainda não tem representantes no Congresso. O desafio no próximo ano é aumentar a quantidade de doadores de volumes pequenos, na tentativa de inverter a lógica adotada pelas campanhas maiores — que arrecadam muito dinheiro de poucos doadores.
O modelo segue a lógica adotada por alguns políticos mundo afora, especialmente aqueles que veem nos microdoadores a única possibilidade de competir com os preferidos do poder econômico. No Brasil, porém, a ideia ainda parece utópica. Mesmo no caso considerado o mais bem-sucedido até hoje — o do candidato do PSOL à Prefeitura do Rio em 2016, Marcelo Freixo —, o montante arrecadado via internet foi baixo perto do que os adversários conseguiram com grandes doações.
Marcelo Crivella (PRB-RJ), que venceu a disputa com Freixo e é o atual prefeito do Rio, arrecadou mais de R$ 9 milhões oriundos de verbas partidárias. O candidato do PSOL fez a campanha com R$ 2,3 milhões, dos quais 62% vieram diretamente dos eleitores via internet. Depois da experiência com Freixo, o PSOL já se prepara para repetir o modelo em 2018 com o vereador Tarcísio Motta, pré-candidato da legenda ao governo do Rio. “Seria ótimo se cerca de 70% da arrecadação viesse de microdoadores”, diz Motta.
Preparativos
A doação para candidaturas começa a valer em 15 de maio. Mas antes mesmo das eleições, o modelo de microfinanciamento está sendo usado para bancar a manutenção dos próprios partidos. “Estamos olhando para novas formas de financiamento partidário”, diz o secretário de comunicação do PT-RJ, Ricardo Pinheiro. “No PT, que é um partido militante, pode dar muito certo.” Segundo ele, a mesma plataforma das campanhas partidárias servirá para as eleitorais.
O Partido Novo, que estreou nas eleições municipais do ano passado com discurso voltado para o liberalismo econômico, trabalha na construção de uma plataforma de captação em que o eleitor poderá direcionar dinheiro para os CNPJs das candidaturas. A sigla, que não recebe dinheiro do Fundo Partidário, já trabalha com o modelo de financiamento recorrente em seu site. Cerca de 10 mil doadores doam ao partido uma média de R$ 30 mensais cada, segundo o diretor André Strauss.
Sócio da consultoria Bando, Felipe Caruso foi um dos nomes por trás da experiência bem-sucedida de arrecadação via internet para a campanha de Freixo em 2016. Com a criação da plataforma de crowdfunding Catarse no currículo, Caruso afirma que é comum esperar arrecadação total para um projeto em vaquinhas online em geral, mas em campanhas políticas é preciso ir convertendo as receitas rapidamente em despesas. Daí a importância de criar minicampanhas e dar transparência aos projetos. “Tem de criar uma boa narrativa, que precisa dialogar com quem visita a página. Por que doar? Qual é a causa?”, explica.
A Rede, criada em 2015, já nasceu com a bandeira da contribuição coletiva. Em 2010, a ex-senadora Marina Silva tentou mobilizar a doação de eleitores via internet pela primeira vez, quando concorreu à Presidência pelo PV. Apenas uma pequena parte da campanha foi financiada dessa forma naquele ano, mas o partido de Marina — pré-candidata em 2018 pela Rede — defende a cultura de microdoadores como modelo de financiamento.
Porta-voz da sigla, José Gustavo Fávero vê barreiras culturais e de conjuntura para montar um financiamento de sucesso — sem falar nas jurídicas. Com a política em descrédito, afirma, é difícil fazer o brasileiro, que já não tem o hábito de contribuir com vaquinha para esses fins, gastar dinheiro com um candidato. Na visão do historiador Boris Fausto, cético do crescimento do modelo de microdoadores, o brasileiro não gosta de dar dinheiro para campanhas políticas. Mas seria bom que o fizesse, porque criaria um elo entre o eleitor e o candidato. “O bolso pesa. (Cria-se a ideia de que) esse cara eleito tem que me representar”, diz.
O cientista político Paulo Baía, da UFRJ, afirma que o caso de Marcelo Freixo tem muito a ver com o tipo de militância do deputado do PSOL. “Não sei se os outros têm o mesmo recurso”, diz. Ele lembra, porém, que a esquerda brasileira já vem tentando angariar recursos dos eleitores há bastante tempo. Não foi algo que surgiu com a internet. “Ainda nos anos de 1970, o PCB (hoje PPS) fazia muito isso. O próprio PT organizava festas, vendia produtos.”
Fávero, da Rede, olha para exemplos mais recentes para lembrar que nem todos os ativos de uma campanha envolvem recursos financeiros. Nos Estados Unidos, o pré-candidato democrata Bernie Sanders engajou uma legião de jovens na disputa com Hillary Clinton para concorrer à sucessão de Barack Obama. Além disso, arrecadou US$ 134 milhões com pequenas contribuições individuais de até US$ 200 e virou um fenômeno político na eleição americana. No Reino Unido, o trabalhista Jeremy Corbyn deu um susto na atual premiê britânica Theresa May na disputa de junho de 2017. Com a mobilização da militância nas ruas e nas redes, Corbyn quase venceu a eleição e enfraqueceu o poder de May no Parlamento.